Brasil de Fato - Secundaristas e universitários contam ao Brasil de Fato o
que os levou a participar do movimento estudantil
No dia 15 de maio, mais de um milhão de pessoas tomaram as
ruas de todo Brasil em defesa da educação. O 15M, como ficou conhecido, foi uma
resposta aos cortes anunciados pelo ministro da Educação de Jair Bolsonaro,
Abraham Weintraub. As manifestações aconteceram em 222 municípios do país, e
para muitos, a “aula na rua” foi o primeiro contato com mobilizações sociais.
A adesão e a intensidade dos atos deu mais uma mostra da
força dos estudantes brasileiros, assim como o apoio da população à pautas
relacionadas à educação, como aconteceu em 2015 e 2016, quando a primavera
secundaristas ocupou escolas em todo país em defesa da educação pública e de
qualidade.
Para entender como funciona o processo de mobilização, o
Brasil de Fato conversou com Leticia Pereira e Kaio Olliote, estudantes do
terceiro ano do ensino médio, que começaram a se movimentar neste ano, e com
Rennan Valeriano, ex-secundarista que ocupou sua escola em 2016.
Começo de tudo
Apesar de sempre ter gostado de estudar História, Letícia
passou a se envolver no movimento secundarista quando começou a estudar na
escola Escola Estadual Anhanguera, no centro de São Paulo (SP). Influenciados
pela movimentação política que acontecia na região da escola, seus amigos
começaram a se envolver, o que despertou seu interesse e fez com que começasse
a se engajar no fim do ano passado. Hoje, tem clara a importância da luta pela
educação.
Após atos em 222 municípios no dia 15 de maio,
novas
manifestações estão marcadas para
o dia 30 / Jaque Altomani / Mídia Ninja
|
Kaio sempre teve interesse no movimento secundarista, mas
apenas esse ano, com toda a ebulição política presente no país decidiu começar
a participar e levar informação cada vez mais para a sua escola, a Escola
Municipal Governador Carlos Lacerda, em Belo Horizonte (MG) que nunca teve uma
movimentação estudantil. Se aproximou principalmente por acreditar na
relevância que os secundaristas têm nas discussões políticas do país e pelo
poder de formação que o movimento possui.
Para Letícia, o movimento estudantil é um dos setores
organizados mais importantes da sociedade, já que é composto por jovens que
logo estarão entrando no mercado de trabalho e serão o futuro do país. "Se
o jovem não lutar pelo futuro, é capaz que ele nem tenha um."
A opinião da secundarista é comprovada pela história recente
do país. Em 2015, o Brasil presenciou uma efervescência estudantil
protagonizado pelos secundaristas paulistas, após o anúncio da reorganização do
ensino público proposto pelo então governador, Geraldo Alckmin. A reorganização
pretendia separar as unidades escolares em ciclos (ensino fundamental I, ensino
fundamental I, e ensino médio), o que resultaria na necessidade de 311 mil
alunos mudarem de escola. As ocupações foram bem sucedidas resultaram na queda
de Herman Voorwald como secretário de Educação e a suspensão do plano de
reestruturação.
Já em 2016, as ocupações visavam barrar medidas como o
projeto de lei conhecido como Escola sem Partido, proposto no Senado por Magno
Malta, e a reforma do ensino médio, anunciada pelo governo de Michel Temer. Em
São Paulo, denunciavam um esquema de fraudes nas merendas, liderado pela
Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (Coaf). Na época, diversas Etecs
passaram pela falta de merenda ou fornecimento apenas de bolachas, barras de
cereal e bebidas lácteas.
É aí começa trajetória de Rennan, durante a ocupação da Etec
Professor Brasilides de Godoy, por conta, principalmente, do esquema de fraudes
na merenda escolar.
Rennan levanta um cartaz durante uma manifestação
em defesa
da educação pública.
(Foto: Arquivo pessoal/Reprodução)
|
"Eu estudava das sete da manhã até às 16h20 da tarde e
não tinha almoço. Eu gastava de 250 à 350 reais só em almoço por mês. Tinha muita
gente que não tinha condições", relembra.
Incomodados com a situação, os estudantes ocuparam a escola
e bloquearam a entrada de professore e funcionários para que pudessem realizar
uma assembleia. Antes por fora da movimentação, Rennan diz que aquela assembleia
- com votação unânime pela manutenção da ocupação - foi um momento decisivo
para seu interesse em se engajar politicamente e nunca mais olhou para trás. A
trajetória dele continua na Universidade de São Paulo em 2018, onde cursa
Ciências Sociais.
A importância do movimento estudantil
Rennan avalia que o movimento estudantil é crucial no
contexto de ataques à educação pública e de qualidade, e que o dia 15 de maio
mostrou que esse pode ser um momento de ascensão da luta dos estudantes. Ele
acredita que o movimento se equipara aos sindicatos na importância que assume
como instrumento de mobilização
Sobre o dia 30 de maio, a sua expectativa é de que seja
ainda maior, potencializado pela manutenção dos cortes na educação e pelos atosfavoráveis ao governo do dia 26.
Os estudantes da escola de Kaio não participaram do dia 15,
mas participarão dos atos no dia 30. Para ele, o segundo ato em defesa da
educação será maior. "Esses atos demonstram que os estudantes possuem a
capacidade de dialogar com a população sobre a importância da educação pública
e gratuita."
Já Letícia, atualmente presidente do grêmio de sua escola,
considera importante a promoção de assembleias, debates e saraus para envolver
mais pessoas no movimento secundarista. Para ela, o governo Bolsonaro dá
seguidas mostras de que não se preocupa com o futuro da juventude brasileira, e
a educação - após anos de conquistas - está mais ameaçada que nunca. "Nós
somos a maior parte da população, nós somos a maior voz e nós somos o futuro.
Se o jovem não se levantar para lutar por aquilo que acredita, ninguém
vai."
Orgulhosa da mobilização no dia 15, a estudante torce para
que a manifestação do dia 30 seja maior, e deixa o recado:"As coisas não
estão fáceis e a tendência é piorar. Portanto, não se cale, lute, grite, vá em
busca daquilo que acredita ser o melhor, independente de partidos e escolas.
Uma pessoa que seja pode fazer uma grande diferença no nosso país."
Edição: Pedro Ribeiro Nogueira
***