Segundo levantamento, em 4 meses, Syngenta e Bayer registram autorização para exportar ao Brasil 2,2 mil toneladas de pesticidas com substâncias com uso banido na União Europeia
O Brasil é o destino de mais da metade dos registros de
exportações da União Europeia de agrotóxicos proibidos na Europa e associados à
morte de abelhas. São inseticidas à base de três neonicotinóides: tiametoxam,
imidacloprido e clotianidina. Entre setembro e dezembro de 2020, mais de 3,8
mil toneladas dessas substâncias foram registradas para serem exportadas
na Agência Europeia das Substâncias Químicas (ECHA) — o Brasil era o
destino de 2,2 mil toneladas, 58% do total.
Os dados inéditos, obtidos com exclusividade pela Agência
Pública e a Repórter Brasil, são resultado de um levantamento da Public Eye, organização suíça,
em parceria com a Unearthed, braço de jornalismo investigativo do
Greenpeace. É a primeira vez que são revelados números sobre a
quantidade dos pesticidas neonicotinoides enviados ao exterior por países
europeus. As substâncias imidacloprido, clotianidina e tiametoxam foram banidas
na União Europeia em 2018. Desde setembro de 2020, empresas de lá são obrigadas
a notificar exportações de produtos com esses princípios ativos. As
notificações são estimativas emitidas antes de o produto ser despachado.
Os produtos registrados para serem enviados ao Brasil foram
produzidos por duas empresas: Syngenta e Bayer. Ao todo, eles continham 318
toneladas das substâncias ativas proibidas.
O principal deles foi o Engeo Pleno S, produzido pela
Syngenta na Bélgica — a empresa registrou mais de 2,2 milhões de litros do
produto para ser enviado para o Brasil. Ele é o mais vendido pela Syngenta no
país e costuma ser utilizado principalmente por produtores de soja. O Engeo
contém uma mistura do neonicotinóide tiametoxam e do inseticida
lambda-cialotrina, também altamente tóxico para as abelhas.
Às organizações, a Syngenta respondeu que “seus produtos são seguros e
efetivos quando usados dentro das recomendações” e que “a empresa atua sempre
de acordo com a legislação e regulamentação local”. A Syngenta ainda afirmou
que “atesta a segurança e a eficácia do tiametoxam” e que, “sem pesticidas, as
perdas [na produção agrícola] seriam catastróficas”.
Já a Bayer respondeu que “apesar de aceitar a decisão da
União Europeia de cessar a aprovação aos neonicotinoides, a empresa destaca que
agências reguladoras por todo o mundo confirmaram o uso seguro desses produtos
após revisões cuidadosas.”. A empresa, contudo, confirmou que “a pulverização
deve ser estritamente evitada em plantações que atraiam abelhas durante a
floração para evitar exposição desses insetos”.
Além do Brasil, outros 59 países estão na lista de destinos
dos produtos proibidos na União Europeia. Os principais são a Rússia, Ucrânia,
Argentina, Irã, África do Sul, Indonésia, Gana, Mali e Cingapura. Já a lista
dos maiores exportadores é encabeçada pela Bélgica, França e Alemanha, seguidos
por Espanha, Grécia, Reino Unido, Dinamarca, Áustria e Hungria.
Os neonicotinóides são quimicamente semelhantes à nicotina e
matam insetos atacando seu sistema nervoso central. Eles foram introduzidos na
década de 1990 e são os inseticidas mais usados no mundo. Altamente solúveis
em água, eles podem ser facilmente transportados para lagos, rios e lençóis
freáticos, além de se acumularem no solo.
No Brasil, MPF tenta barrar pulverização com neonicotinóides
Os dados obtidos pela Unearthed e Public
Eye foram publicados no momento em que a Comissão Europeia avalia pôr
fim à fabricação dos produtos para exportação, um passo adiante após a
proibição do uso das substâncias na Europa.
Em resposta às organizações que realizaram a investigação, a
Hungria e o Reino Unido afirmaram que o sistema atual é baseado no
consentimento prévio dos países importadores. Bélgica, Dinamarca e França
afirmaram apoiar uma proibição local de exportação. Na França, a proibição de
exportação de pesticidas proibidos na União Europeia já foi imposta e entrará
em vigor em 2022. Esta medida “deve ser adotada e implementada” na região, diz
o governo francês, porque “não é aceitável expor o meio ambiente e a saúde em
outros países” a estas substâncias. A Espanha também sinalizou proposta nesta
direção. Já a Alemanha diz estar “ansiosa” por propostas concretas da Comissão
Europeia sobre o tema.
A Comissão Europeia assumiu o compromisso de acabar com esta prática em outubro de
2020, após um primeiro levantamento da Unearthed e Public
Eye revelarem que fabricantes da UE despachavam milhares de toneladas
de pesticidas proibidos para países pobres.
No Brasil, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou, em
agosto deste ano, uma ação civil pública contra o Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para que o órgão
ambiental proíba a pulverização aérea de agrotóxicos com as três substâncias
neonicotinóides exportadas pela Europa (imidacloprido, clotianidina e
tiametoxam), além do pirazol.
O Ibama já havia proibido a pulverização aérea dessas
substâncias em 2012. O órgão, no entanto, liberou provisoriamente a aplicação dos
pesticidas em lavouras de algodão, arroz, cana-de-açúcar, soja e trigo até que
fossem encerrados os processos de reavaliação dos efeitos sobre o meio ambiente
— o que até hoje não ocorreu.
O procurador da República Matheus Baraldi Magnani, autor da
ação civil pública, considera o número de mortes de abelhas um caso
“extremamente grave, subdimensionado e silencioso” e analisa que a omissão do
Ibama consolidou, na prática, a autorização para o uso dos pesticidas. “Tal
problema é diariamente agravado pela inconstitucional escolha do Poder Público
em priorizar fortes setores econômicos em detrimento do meio ambiente”,
argumentou Magnani no documento. “A pulverização aérea de neonicotinóides e
pirazol é, numa analogia, uma assassina silenciosa para as abelhas, assim como
o monóxido de carbono é para os humanos”, disse.
Os pedidos do MPF restringem-se à aplicação dos produtos com
uso de aviões. Caso a Justiça Federal acolha os requerimentos, ainda será
permitida a pulverização terrestre.
Meio bilhão de abelhas mortas em três meses
Em 2019, um levantamento da Pública e Repórter
Brasil mostrou que mais de 500 milhões de abelhas foram encontradas
mortas em quatro estados brasileiros em apenas três meses, entre
dezembro de 2018 e fevereiro de 2019. Foram 400 milhões no Rio Grande do Sul, 7
milhões em São Paulo, 50 milhões em Santa Catarina e 45 milhões em Mato Grosso
do Sul, segundo estimativas de Associações de apicultura, secretarias de
Agricultura e pesquisas realizadas por universidades.
Em Cruz Alta, município de 60 mil habitantes no Rio Grande
do Sul, mais de 20% de todas as colmeias foram perdidas apenas
entre o Natal de 2018 e o começo de fevereiro de 2019. Cerca de 100 milhões de
abelhas apareceram mortas, segundo a Apicultores de Cruz Alta (Apicruz).
O principal causador das mortes das abelhas é o contato com
agrotóxicos à base de neonicotinóides e de pirazol, proibido na Europa há mais
de uma década. Um estudo de 2018 da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)
em parceria com a Universidade Estadual Paulista (Unesp) demonstrou que 67% das
mortes em coletas de abelhas analisadas em São Paulo — estado que representa
10% da produção nacional de mel — ocorreram devido ao uso incorreto dos
inseticidas.
As abelhas são as principais polinizadores da maioria dos
ecossistemas do planeta e promovem a reprodução de diversas espécies de
plantas. No Brasil, das 141 espécies de plantas cultivadas para alimentação
humana e produção animal, cerca de 60% dependem em certo grau da polinização
deste inseto. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a
Agricultura (FAO), 75% dos cultivos destinados à alimentação humana no mundo
dependem das abelhas.
Cada espécie é mais propícia para polinização de
determinadas culturas, explica Carmem Pires, pesquisadora da Embrapa e doutora
em Ecologia de Insetos. O resultado é que, se as abelhas fossem extintas,
deixaríamos de consumir frutas como a mangaba. Ou elas ficariam mais caras, já
que o trabalho de polinização para produzi-la teria que ser feito manualmente
pelo ser humano.
A estudiosa conta que até em lavouras que não são
dependentes da ação direta dos polinizadores, a presença de abelhas aumenta a
safra. “Na de soja, por exemplo, é identificado um aumento em 18% da produção.
É importante destacar também o efeito em cadeia. As plantas precisam das
abelhas para formar suas sementes e frutos, que são alimento de diversas aves,
que por sua vez são a dieta alimentar de outros animais. A morte de abelhas
afeta toda a cadeia alimentar.”
No Brasil, há mais de 300 espécies de abelhas nativas —
entre elas Melipona scutellaris, Melipona quadrifasciata, Melipona fasciculata,
Melipona rufiventris, Nannotrigona testaceicornis, Tetragonisca angustula. Em
todo país, contando com as estrangeiras, há cerca de 1,6 mil espécies do
inseto, segundo relatório do Ibama.
Fonte: Agência Pública
O UOL News repercute a reportagem publicada pelo UOL sobre
fazendeiros que jogam agrotóxicos sobre a Amazônia e outros biomas para
acelerar o desmatamento, segundo um levantamento inédito feito pela Repórter
Brasil e Agência Pública.
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Desde o começo do mandato, o governo Bolsonaro publicou a aprovação de 1458 novos produtos agrotóxicos.
— Robotox (@orobotox) November 19, 2021
Existem hoje 3524 produtos agrotóxicos comercializados em todo o Brasil.
— Robotox (@orobotox) November 18, 2021
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— 🐝 Marine TRÉBAUL, PhD Candidate - #SDGs - #Breton (@MarineGOfficial) November 16, 2021
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