A colaboração secreta e ilegal entre o Departamento de
Justiça dos EUA e os procuradores de Curitiba gerou críticas, evidenciando uma
possível interferência estrangeira nas investigações da operação Lava Jato.
Revelações de conversas vazadas do Ministério Público
Federal no Paraná, que já são conhecidas pelo público, apontam para uma
subordinação a interesses estrangeiros, especialmente dos Estados Unidos. Dez
anos depois, a Sputnik Brasil conversa com especialistas que
dão visões acerca dos impactos e interesses por trás do envolvimento dos EUA na
operação que sacudiu a Justiça, a política, a economia e a sociedade do Brasil.
Lier Pires Ferreira, pesquisador do Laboratório de Estudos
Políticos de Defesa e Segurança Pública (Lepdesp), da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro (UERJ), e do Núcleo de Estudos dos Países BRICS (NuBRICS), da
Universidade Federal Fluminense (UFF), trouxe à tona questões controversas
sobre a cooperação entre autoridades americanas e brasileiras durante a
operação Lava Jato.
"Conversas vazadas do Ministério Público Federal no
Paraná revelam que um dos aspectos mais controvertidos da Lava Jato foi sua
subordinação a interesses estrangeiros, em particular dos Estados Unidos. Há
que se lembrar que, anos antes, no governo [do presidente americano Barack]
Obama, a presidente Dilma Rousseff e a Petrobras haviam
sido alvos de espionagem ilegal dos americanos",
relembra o especialista.
As discussões se concentram em como essa influência
impactou não apenas as dinâmicas políticas e legais internas no Brasil, mas
também a economia nacional.
A Petrobras, principal alvo da Lava Jato, aceitou pagar uma
multa significativa, parte da qual seria destinada a um fundo de combate à
corrupção. No entanto, a tentativa dos procuradores de Curitiba de gerir esse
fundo foi barrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). A ação teve
consequências devastadoras para grandes empresas brasileiras, como Petrobras,
Odebrecht e JBS, resultando na perda de valor patrimonial e de
fatias de mercado e desemprego em massa.
Arquitetura jurídica montada pelos EUA
À Sputnik Brasil, Fábio de Sá e Silva, autor de
estudos sobre a Lava Jato, pesquisador e doutor em direito, política e
sociedade da Universidade Northeastern (EUA), e professor associado de estudos
internacionais e professor Wick Cary de estudos brasileiros na Universidade de
Oklahoma (EUA), relembra que muitas das opiniões e inferências acerca
da influência dos EUA na operação foram tratadas como teoria da conspiração,
mas que houve de fato uma ingerência por parte do governo norte-americano.
"O que é um fato — e muito bem
documentado — é que os EUA construíram toda uma arquitetura
jurídica de combate à corrupção no mundo alinhada com os interesses nacionais,
e a Lava Jato se deu um pouco a partir dessa arquitetura. […] De certa forma,
os americanos fazem o que é bom para eles. O que me interessa questionar é por
que os brasileiros — procuradores, juízes, veículos de
imprensa — fizeram o que fizeram na Lava Jato, cujas
consequências para a economia, o direito, a política e o próprio combate à
corrupção no país são terríveis", indaga Silva.
Questionado sobre o interesse dos EUA na operação, Lier
Pires destaca que, para além de intenções jurídicas e políticas, era um
interesse de impacto que ajudava financeiramente o governo norte-americano.
"O interesse dos EUA direcionava-se prioritariamente à
Petrobras, cujos desvios de conduta impactavam investidores norte-americanos,
já que as ações da petrolífera brasileira eram negociadas em bolsas americanas.
Não por outro motivo, em 2018 a Petrobras aceitou pagar uma multa superior a
US$ 800 milhões [aproximadamente R$ 4 bilhões de reais]. Como se sabe, cerca
de 80% desse dinheiro retornaria ao Brasil. Os procuradores de Curitiba
pleiteavam a gestão dessa verba, que seria destinada a um fundo de combate à
corrupção. Quase tiveram êxito. Todavia a manobra foi abortada pelo
STF", comenta Ferreira à Sputnik Brasil.
O especialista destaca ainda que a interferência dos EUA na
Lava Jato revela a importância de Washington na política brasileira. Além
disso, ressalta a falta de visão estratégica das autoridades judiciais
brasileiras, criticando a abordagem que prejudicou empresas em vez de
focar mais as pessoas físicas envolvidas.
"O fato que me parece mais relevante é que a influência
dos EUA na Lava Jato revela primeiramente a importância de Washington na vida
política brasileira, como já denunciava estridentemente o ex-governador Leonel
Brizola. […] Ela traz à tona a total falta de visão estratégica das
autoridades judiciais brasileiras, míopes em aspectos básicos do geodireito e
do constitucionalismo estratégico. […] O fato é que as punições devem pesar
mais sobre as pessoas físicas do que sobre as empresas", avalia.
Para Rafael Ioris, professor de história moderna da América
Latina na Universidade de Denver (EUA), existia uma combinação
realizada entre os agentes brasileiros e norte-americanos. Segundo ele,
"ninguém é inocente".
"Os atores do governo dos Estados Unidos, especialmente
o Departamento de Justiça, tinham uma narrativa e perspectiva de que a
corrupção era um grande problema na América Latina e já haviam criado treinamentos,
cartilha de como combater a corrupção na América Latina. […] Havia um interesse
[dos EUA] na operação. […] Ninguém é inocente. Um começou a ajudar o
outro [Brasil e EUA]", crava.
A queda de uma farsa
Rafael Ioris continua destacando que embora a grande mídia
norte-americana legitimasse o que a mídia brasileira veiculava, com o tempo
essa narrativa começou a ser descontruída. Afinal, as coberturas tanto
brasileira quanto norte-americana tinham o objetivo de disseminar que a
corrupção era o problema principal da América Latina.
"Aos poucos, especialmente depois da eleição do [Jair]
Bolsonaro, muita gente começou a perceber que havia uma conexão entre o
discurso antiestablishment, antipolítica que resultou na eleição de Bolsonaro
[…]. Houve uma certa preocupação com o resultado […] e houve uma
percepção de que precisávamos [o Brasil] investigar mais um pouco [a Lava
Jato]. […] foi um processo com grandes danos para a economia brasileira",
arremata.
A 'corrupção sistêmica' e o interesse por trás
À Sputnik Brasil, Larissa Liz Odreski Ramina,
professora de direito internacional público da Universidade Federal do Paraná
(UFPR) e coordenadora de iniciação científica da Pró-Reitoria de Pesquisa e
Pós-Graduação da mesma instituição, ressalta que houve uma sistematização do
que consideraram, à época, corrupção sistêmica, fazendo uso seletivo.
"Utiliza-se desse discurso da corrupção sistêmica de
forma seletiva para atacar apenas governos, forças políticas e líderes do
chamado progressismo latino-americano. Ou seja, aqueles que se opõem aos
ajustes neoliberais ditados pelo Fundo Monetário Internacional. […] A guerra jurídica foi
utilizada contra todos os modelos alternativos às políticas neoliberais, e essa
narrativa da corrupção sistêmica teve o efeito de considerar a corrupção como
um crime transnacional, […] da mesma forma que o tráfico de drogas e o
terrorismo internacional são considerados — em uma perspectiva militar — como
ameaças à segurança nacional dos Estados Unidos", evidencia.
Para o pesquisador Lier Pires Ferreira, há aspectos legais
na cooperação judiciária entre EUA e Brasil que não podem ser ignorados.
"Algo diverso ocorre nas ações interventivas, ainda que
não tenham caráter direto, isto é, político ou militar. Essas ações são ao
mesmo tempo ilegais e ilegítimas, pois ferem a soberania nacional. A submissão
brasileira aos interesses norte-americanos no contexto da Lava Jato não apenas
apequenou o Brasil, mas feriu sua soberania e imagem perante o conjunto das
nações. Além disso, como já dito, teve um imenso custo econômico, muito
superior aos recursos financeiros que conseguiu repatriar. A Lava Jato é um
exemplo de que um país soberano jamais deve prostrar-se aos interesses
estrangeiros, ainda que travestidos de nobres ideais", reforça Pires.
O professor Fábio de Sá pontua que essas tais formas
importadas pela Lava Jato sequer são dominantes no direito americano.
"Por exemplo, [o então juiz Sergio] Moro condenou Lula
utilizando decisões de tribunais federais americanos que diziam que não é
preciso ato de ofício para configurar corrupção. Mas essa não é a 'lei da
terra' nos EUA; a Suprema Corte decidiu, em 2016, que para se punir alguém por
corrupção é preciso identificar com clareza um ato de ofício correspondente
[…]. Então o que vejo em tudo isso é um apelo aos EUA que serve para legitimar
abusos, o recurso aos EUA como fonte de legitimação simbólica — o que
funciona bem em um país com elites e imprensa que padecem do complexo de
vira-latas", afirma o professor.
O drama do presidente mais popular do país com a perda do neto. Preso sem provas, ele é escoltado por policiais armados. No que deveria ser o uniforme, um dos policiais ostenta distintivo com a inscrição “Miami Police - Swat”.#ForçaLula#LulaLivrepic.twitter.com/H5jyNu3uOD
Segundo levantamento, em 4 meses, Syngenta e Bayer registram
autorização para exportar ao Brasil 2,2 mil toneladas de pesticidas com
substâncias com uso banido na União Europeia
O Brasil é o destino de mais da metade dos registros de
exportações da União Europeia de agrotóxicos proibidos na Europa e associados à
morte de abelhas. São inseticidas à base de três neonicotinóides: tiametoxam,
imidacloprido e clotianidina. Entre setembro e dezembro de 2020, mais de 3,8
mil toneladas dessas substâncias foram registradas para serem exportadas
na Agência Europeia das Substâncias Químicas (ECHA) — o Brasil era o
destino de 2,2 mil toneladas, 58% do total.
Os dados inéditos, obtidos com exclusividade pela Agência
Pública e a Repórter Brasil, são resultado de um levantamento da Public Eye, organização suíça,
em parceria com a Unearthed, braço de jornalismo investigativo do
Greenpeace. É a primeira vez que são revelados números sobre a
quantidade dos pesticidas neonicotinoides enviados ao exterior por países
europeus. As substâncias imidacloprido, clotianidina e tiametoxam foram banidas
na União Europeia em 2018. Desde setembro de 2020, empresas de lá são obrigadas
a notificar exportações de produtos com esses princípios ativos. As
notificações são estimativas emitidas antes de o produto ser despachado.
Os produtos registrados para serem enviados ao Brasil foram
produzidos por duas empresas: Syngenta e Bayer. Ao todo, eles continham 318
toneladas das substâncias ativas proibidas.
O principal deles foi o Engeo Pleno S, produzido pela
Syngenta na Bélgica — a empresa registrou mais de 2,2 milhões de litros do
produto para ser enviado para o Brasil. Ele é o mais vendido pela Syngenta no
país e costuma ser utilizado principalmente por produtores de soja. O Engeo
contém uma mistura do neonicotinóide tiametoxam e do inseticida
lambda-cialotrina, também altamente tóxico para as abelhas.
Às organizações, a Syngenta respondeu que “seus produtos são seguros e
efetivos quando usados dentro das recomendações” e que “a empresa atua sempre
de acordo com a legislação e regulamentação local”. A Syngenta ainda afirmou
que “atesta a segurança e a eficácia do tiametoxam” e que, “sem pesticidas, as
perdas [na produção agrícola] seriam catastróficas”.
Já a Bayer respondeu que “apesar de aceitar a decisão da
União Europeia de cessar a aprovação aos neonicotinoides, a empresa destaca que
agências reguladoras por todo o mundo confirmaram o uso seguro desses produtos
após revisões cuidadosas.”. A empresa, contudo, confirmou que “a pulverização
deve ser estritamente evitada em plantações que atraiam abelhas durante a
floração para evitar exposição desses insetos”.
Além do Brasil, outros 59 países estão na lista de destinos
dos produtos proibidos na União Europeia. Os principais são a Rússia, Ucrânia,
Argentina, Irã, África do Sul, Indonésia, Gana, Mali e Cingapura. Já a lista
dos maiores exportadores é encabeçada pela Bélgica, França e Alemanha, seguidos
por Espanha, Grécia, Reino Unido, Dinamarca, Áustria e Hungria.
Morte de meio bilhão de abelhas no Brasil esteve relacionada
à pesticida do grupo dos neonicotinóides
Os neonicotinóides são quimicamente semelhantes à nicotina e
matam insetos atacando seu sistema nervoso central. Eles foram introduzidos na
década de 1990 e são os inseticidas mais usados no mundo. Altamente solúveis
em água, eles podem ser facilmente transportados para lagos, rios e lençóis
freáticos, além de se acumularem no solo.
No Brasil, MPF tenta barrar pulverização com
neonicotinóides
Os dados obtidos pela Unearthed e Public
Eye foram publicados no momento em que a Comissão Europeia avalia pôr
fim à fabricação dos produtos para exportação, um passo adiante após a
proibição do uso das substâncias na Europa.
Em resposta às organizações que realizaram a investigação, a
Hungria e o Reino Unido afirmaram que o sistema atual é baseado no
consentimento prévio dos países importadores. Bélgica, Dinamarca e França
afirmaram apoiar uma proibição local de exportação. Na França, a proibição de
exportação de pesticidas proibidos na União Europeia já foi imposta e entrará
em vigor em 2022. Esta medida “deve ser adotada e implementada” na região, diz
o governo francês, porque “não é aceitável expor o meio ambiente e a saúde em
outros países” a estas substâncias. A Espanha também sinalizou proposta nesta
direção. Já a Alemanha diz estar “ansiosa” por propostas concretas da Comissão
Europeia sobre o tema.
No Brasil, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou, em
agosto deste ano, uma ação civil pública contra o Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para que o órgão
ambiental proíba a pulverização aérea de agrotóxicos com as três substâncias
neonicotinóides exportadas pela Europa (imidacloprido, clotianidina e
tiametoxam), além do pirazol.
O Ibama já havia proibido a pulverização aérea dessas
substâncias em 2012. O órgão, no entanto, liberou provisoriamente a aplicação dos
pesticidas em lavouras de algodão, arroz, cana-de-açúcar, soja e trigo até que
fossem encerrados os processos de reavaliação dos efeitos sobre o meio ambiente
— o que até hoje não ocorreu.
O procurador da República Matheus Baraldi Magnani, autor da
ação civil pública, considera o número de mortes de abelhas um caso
“extremamente grave, subdimensionado e silencioso” e analisa que a omissão do
Ibama consolidou, na prática, a autorização para o uso dos pesticidas. “Tal
problema é diariamente agravado pela inconstitucional escolha do Poder Público
em priorizar fortes setores econômicos em detrimento do meio ambiente”,
argumentou Magnani no documento. “A pulverização aérea de neonicotinóides e
pirazol é, numa analogia, uma assassina silenciosa para as abelhas, assim como
o monóxido de carbono é para os humanos”, disse.
Os pedidos do MPF restringem-se à aplicação dos produtos com
uso de aviões. Caso a Justiça Federal acolha os requerimentos, ainda será
permitida a pulverização terrestre.
Meio bilhão de abelhas mortas em três meses
Em 2019, um levantamento da Pública e Repórter
Brasil mostrou que mais de 500 milhões de abelhas foram encontradas
mortas em quatro estados brasileiros em apenas três meses, entre
dezembro de 2018 e fevereiro de 2019. Foram 400 milhões no Rio Grande do Sul, 7
milhões em São Paulo, 50 milhões em Santa Catarina e 45 milhões em Mato Grosso
do Sul, segundo estimativas de Associações de apicultura, secretarias de
Agricultura e pesquisas realizadas por universidades.
Em Cruz Alta, município de 60 mil habitantes no Rio Grande
do Sul, mais de 20% de todas as colmeias foram perdidas apenas
entre o Natal de 2018 e o começo de fevereiro de 2019. Cerca de 100 milhões de
abelhas apareceram mortas, segundo a Apicultores de Cruz Alta (Apicruz).
O principal causador das mortes das abelhas é o contato com
agrotóxicos à base de neonicotinóides e de pirazol, proibido na Europa há mais
de uma década. Um estudo de 2018 da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar)
em parceria com a Universidade Estadual Paulista (Unesp) demonstrou que 67% das
mortes em coletas de abelhas analisadas em São Paulo — estado que representa
10% da produção nacional de mel — ocorreram devido ao uso incorreto dos
inseticidas.
As abelhas são as principais polinizadores da maioria dos
ecossistemas do planeta e promovem a reprodução de diversas espécies de
plantas. No Brasil, das 141 espécies de plantas cultivadas para alimentação
humana e produção animal, cerca de 60% dependem em certo grau da polinização
deste inseto. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a
Agricultura (FAO), 75% dos cultivos destinados à alimentação humana no mundo
dependem das abelhas.
Sem abelhas, sem alimentos; insetos são responsáveis pela
polinização e reprodução de diversas espécies de plantas
Cada espécie é mais propícia para polinização de
determinadas culturas, explica Carmem Pires, pesquisadora da Embrapa e doutora
em Ecologia de Insetos. O resultado é que, se as abelhas fossem extintas,
deixaríamos de consumir frutas como a mangaba. Ou elas ficariam mais caras, já
que o trabalho de polinização para produzi-la teria que ser feito manualmente
pelo ser humano.
A estudiosa conta que até em lavouras que não são
dependentes da ação direta dos polinizadores, a presença de abelhas aumenta a
safra. “Na de soja, por exemplo, é identificado um aumento em 18% da produção.
É importante destacar também o efeito em cadeia. As plantas precisam das
abelhas para formar suas sementes e frutos, que são alimento de diversas aves,
que por sua vez são a dieta alimentar de outros animais. A morte de abelhas
afeta toda a cadeia alimentar.”
No Brasil, há mais de 300 espécies de abelhas nativas —
entre elas Melipona scutellaris, Melipona quadrifasciata, Melipona fasciculata,
Melipona rufiventris, Nannotrigona testaceicornis, Tetragonisca angustula. Em
todo país, contando com as estrangeiras, há cerca de 1,6 mil espécies do
inseto, segundo relatório do Ibama.
O UOL News repercute a reportagem publicada pelo UOL sobre
fazendeiros que jogam agrotóxicos sobre a Amazônia e outros biomas para
acelerar o desmatamento, segundo um levantamento inédito feito pela Repórter
Brasil e Agência Pública.
A Pública levantou os 16 casos de
absolvições em segunda instância da Lava Jato e acompanhou o impacto da
condenação na vida de três desses réus
Executivo da OAS não conseguiu mais
emprego e não recebeu direitos trabalhistas Dentista aposentada foi usada como
“laranja” pela filha doleira Gerente de posto passou por duas
condenações
“A única coisa que ouvi foi o
cachorro latindo, mas de um jeito diferente. Abri a varanda e vi que ele estava
assustado. Quando eu saí do quarto, ouvi a campainha da cozinha, da porta da sala
e pessoas forçando a maçaneta. Num primeiro momento, achei que fosse assalto,
porque faziam muita força. Fui até a porta e perguntei que estava acontecendo,
e uma voz respondeu: ‘Aqui é a Polícia Federal [PF], abra imediatamente’.
Estava de cueca [era 6h30 da manhã], é constrangedor. Fui me vestir e fizeram
uma busca e apreensão na minha casa, levaram computador, celular, pastas, tudo
que tinha da OAS. Minha esposa estava grávida de cinco meses. Reviraram tudo e
pediram para que eu os acompanhasse”, relembra hoje Fernando Augusto Stremel
Andrade, ex-gerente de gasoduto da OAS.
Acusado de envolvimento no esquema
de corrupção da empresa, como o então presidente da empreiteira Léo Pinheiro e
os diretores Agenor Franklin Medeiros e Matheus Coutinho, o ex-gerente foi
conduzido coercitivamente para a PF na sétima fase da Operação Lava Jato,
denominada Juízo Final, no dia 14 de novembro de 2014. Foi liberado em seguida,
mas em 5 de agosto de 2015 condenado a quatro anos de prisão em regime aberto
por lavagem de dinheiro.
“O [Sergio] Moro achou que eu, com
a função que tinha, deveria saber o que estava acontecendo. A noção para quem
está de fora pode ser essa, mas não é isso que ocorre na obra”, afirma sobre a
condenação. Absolvido em segunda instância por falta de provas em 27 de
novembro de 2016, ele não conseguiu mais se recolocar no mercado de trabalho.
“Estou marcado pela Lava Jato. A maioria das empresas tem o setor compliance.
Não passa, cara, mesmo com a minha absolvição por 3 a 0. Fui condenado, acusado
de corrupção, e as pessoas questionam. Não tem o que fazer”, lamenta.
Stremel Andrade foi um dos 15 réus
condenados pelo ex-juiz Sergio Moro absolvidos pelo Tribunal Regional da 4ª
Região (TRF4), em Porto Alegre (RS), segundo dados obtidos com exclusividade
pela Agência Pública. Como ele, muitos tiveram suas vidas impactadas por
sentenças proferidas na 13ª Vara Federal, de Curitiba, mesmo depois de terem
sido anuladas em segunda instância pelos desembargadores João Pedro Gebran
Neto, Carlos Eduardo Thompson Flores e Leandro Paulsen.
Foi assim com Maria Dirce Penasso,
cirurgiã dentista aposentada, à época com 66 anos, residente em Vinhedo,
interior de São Paulo. A pacata vida da senhora foi revirada do avesso ao ter
seu nome atrelado à Lava Jato, no dia 17 de março de 2014, na primeira fase da
operação, quando sua casa foi alvo de busca e apreensão. Acusada de lavagem de
dinheiro e evasão de divisas, Maria Dirce foi condenada por Moro a dois anos,
um mês e dez dias de prisão (depois comutada para prestação de serviço à
comunidade). O motivo: sua filha, a doleira Nelma Kodama, abriu uma conta em
seu nome em Hong Kong, que teria sido usada para movimentar dinheiro de
corrupção. Maria Dirce, que sempre alegou desconhecimento das transações de
Nelma, foi absolvida pelo TRF4 em dezembro de 2015, pouco mais de um ano depois
da condenação. Além da decepção com a filha, sobraram sequelas da operação,
segundo o seu advogado, Eduardo Pugliesi Lima. “Ela tinha uma conta no mesmo
banco há 30, 40 anos. Quando foi acusada, começaram a dificultar tudo, para
fazer qualquer tipo de movimentação. Já tinha mais de 70 anos, não precisava
passar por isso”, conta Pugliesi Lima.
Saga mais complexa é a do gerente
do Posto da Torre, André Catão de Miranda, preso no dia 17 de março de 2014, na
primeira fase da Lava Jato. Foi essa prisão que inaugurou e batizou a operação
– em referência ao lava-jato do posto. Catão foi preso temporariamente como
suspeito de integrar uma organização criminosa liderada por seu patrão, o
doleiro Carlos Habib Chater. Há 11 anos ele era gerente financeiro do posto e
movimentava as contas de Chater, o que lhe valeu uma condenação por lavagem de
dinheiro da qual foi absolvido pelo TRF4 em setembro de 2015. No ano passado, o
administrador foi novamente condenado por Moro – dessa vez por supostamente
pertencer a uma organização criminosa – em um dos últimos atos do juiz na 13ª
vara antes de assumir o Ministério da Justiça do governo de Jair Bolsonaro. Ele
aguarda o recurso ser julgado no TRF4.
Dados inéditos obtidos pela
Agência Pública revelam que 15 réus condenados pelo ex-juiz Sergio Moro foram
absolvidos pelo TRF4
Abandonado pela OAS
Engenheiro formado pela PUC do
Paraná em 1985, com pós-graduação em engenharia de dutos desde 2007, o
ex-gerente de gasoduto da OAS tem currículo de executivo de primeira linha.
Antes de trabalhar na OAS, foi funcionário na Petrobras, onde permaneceu entre
1998 e 2007, com a responsabilidade de avaliar a viabilidade técnica e
econômica de empreendimentos da empresa no setor de gasoduto. Foi a Petrobras
que o indicou para trabalhar na OAS, na construção de um gasoduto no Amazonas,
o Urucu-Coari-Manaus, inaugurado em novembro de 2009 e recentemente vendido
junto com 90% da Transportadora Associada de Gás S.A. (TAG) para um grupo
empresarial que reúne a francesa Engie e o fundo canadense Caisse de Dépôt et
Placement du Québec (CDPQ), por US$ 8,6 bilhões (cerca de R$ 33 bilhões), em
abril do ano passado.
Em 2010, Stremel Andrade foi
deslocado para Alagoas, dessa vez para trabalhar na concepção do gasoduto Pilar-Ipojuca.
Um ano depois, assinou um contrato representando a OAS com a empreiteira
Rigidez, pertencente a Alberto Youssef, no valor de R$ 1,8 milhão. Os problemas
começaram aí.
“Não vou dizer que fui obrigado,
mas a OAS me orientou a assinar o contrato para uma divisão de dividendos e
participações. É uma divisão interna dos lucros de uma obra, mas eu não
imaginava que isso ia para um agente público ou para a Petrobras. Eu era um
funcionário operacional”, justifica Stremel Andrade. “Você pode me perguntar:
‘Pô, o Léo Pinheiro, Agenor, não participava de reunião com você?’. Sim, todo
mês a gente se reunia, mas nós falávamos do avanço físico de obra, de
rentabilidade”, afirma Fernando, que nem sonhava em ver sua casa invadida pela
PF como aconteceu em novembro de 2014.
Ele lembra que foi conduzido
coercitivamente para prestar depoimento na PF em uma sexta-feira e, na segunda,
já estava de volta ao Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), para
onde havia sido deslocado pela OAS em 2013. Ali supervisionava a construção da
adutora que vai levar o lixo químico tratado de uma das refinarias da Petrobras
até Maricá para ser despejado 3 km adiante no mar. “Minha equipe veio conversar
comigo para saber o que havia acontecido. Ninguém esperava essa situação.
Trabalhei normal, administrando esse problema e a continuidade da obra. Até a
sentença, que foi em meados de 2015, era um sufoco, porque ia para Curitiba,
tinha audiência de acusação, defesa”, relembra.
Questionado sobre por que preferiu
ficar em silêncio no depoimento a Sergio Moro, o ex-executivo da OAS afirma que
“essa era uma estratégia da empresa”. “Antigamente, se condenado na segunda
instância, você não ia preso. O acordo era não falar absolutamente nada, porque
eu poderia ser condenado em segunda instância e, até chegar no STJ, ia demorar
mais 10, 15 anos, todo mundo já ia ter mais de 70 anos. Isso mudou a partir do
momento que a segunda instância começou a prender.”
Entre setembro de 2015 e abril de
2016, Stremel Andrade permaneceu afastado, sem exercer nenhuma função na OAS,
ainda que recebendo salário. Quando retornou ao cotidiano da empresa, ele
relata que permaneceu marginalizado. “Eu não tinha nem mesa para trabalhar”,
conta. O executivo não era mais convocado para reuniões e tampouco sabia de
detalhes operacionais da companhia.
Meses depois, em novembro de 2016,
foi absolvido por unanimidade pelos três desembargadores do TRF4. Nenhum dos
delatores da OAS havia citado seu nome ao falar sobre as irregularidades
encontradas pela força-tarefa. “Foi um alívio e achei que tudo ia voltar a ser
como era antes, mas isso não aconteceu”, lembra o engenheiro, que continuou a
se sentir escanteado no trabalho.
Em março de 2018, foi demitido “de
maneira fria e calculista” pela OAS sem receber FGTS, férias proporcionais nem
rescisão trabalhista, o que teria acontecido também com outros funcionários da
construtora. Segundo ele, a cúpula da empresa “ficou chateada” com o depoimento
de um dos delatores da empresa, o ex-diretor financeiro Mateus Coutinho de Sá
Oliveira, dizendo que a empresa havia prometido indenizar os diretores queconcordassem em fazer a delação premiada. “Os acionistas se sentiram traídos.
Desde 2018 ninguém recebe mais nada”, diz.
Stremel Andrade diz que pediu uma
compensação para se “reerguer”, movendo uma ação trabalhista contra a OAS no
valor de R$ 4,4 milhões. São 50 salários por danos morais, R$ 385 mil por 138
dias de férias não gozadas e mais R$ 600 mil pela rescisão do contrato de
trabalho – o que ainda não recebeu. Sem emprego, ele ainda sente o peso da
condenação. “Não é mais a mesma coisa. Irmãos e os parentes mais próximos, tudo
bem. Mas o restante da família tem um outro conceito de mim.”
Stremel Andrade ainda é réu em
processo por improbidade administrativa em ação protocolada pela
Advocacia-Geral da União (AGU), por mau uso do dinheiro público. “Como fui
absolvido na ação do MPF, espero que isso conte nessa outra acusação. É uma
agonia sem fim.”
A Pública entrou em contato com a
OAS, que, por meio de sua assessoria de imprensa, afirmou que “sobre os temas
rescisórios, a empresa acredita que encaminhará soluções definitivas nas
próximas semanas”. Sobre o depoimento de Sá Oliveira, mencionado por Stremel
Andrade, disse que “jamais efetuou qualquer tipo de pagamento aos ex-executivos
e afirma categoricamente que nunca celebrou tal acordo mencionado”. O advogado
Pedro Ivo Gricoli Iokoi, responsável pela defesa de Sá Oliveira, também não
quis conceder entrevista à Pública, afirmando que “Mateus é colaborador e
possui cláusula de confidencialidade no acordo”.
O Posto da Torre, propriedade do
empresário Carlos Habib Chater, deu origem e nome à Operação Lava Jato
De Vinhedo a Hong Kong
O relógio marcava 0h37 do dia 26
de novembro 2012 quando o visor do celular da doleira Nelma Kodama brilhou. Era
uma ligação vinda de uma operadora do HSBC, na China.
– “Oi, aqui é a Carol, de Hong
Kong DC”.
– “Sim, pode falar, aqui é Maria
Dirce Penasso.”
– “Nós temos algumas perguntas
para você, posso enviar um email para você dar uma olhada?”
– “Sobre qual das 961? Qual
pagamento ?”
– “São perguntas sobre algumas
informações que precisamos, posso lhe enviar um email”
– “Ok, vamos fazer assim, porque
aqui eu estou em outro país e agora é meia noite, ok? Todos os escritórios
estão fechados, pode me fazer um favor, me envie um email, ok? E amanhã eu vejo
o email e você me liga amanhã à noite, pode ser assim? Você entende? Porque
está tudo fechado agora”.
O diálogo, em inglês, foi
traduzido pela PF dois anos depois, ao investigar Maria Dirce Penasso, mãe da
doleira, que era real interlocutora da conversa. “A Maria Dirce não fazia ideia
dessas movimentações, era tudo em inglês. Ela, com a idade que tinha, sem saber
falar outra língua, mal sabendo mexer nas funções básicas de um computador,
jamais conseguiria movimentar o dinheiro de uma conta bancária em Hong Kong”,
contou à Pública o advogado da dentista aposentada, Eduardo Pugliesi Lima.
O uso de seu nome pela filha em
contas que movimentariam dinheiro da corrupção resultou em uma acusação do
Ministério Público Federal (MPF) por evasão de divisas e lavagem de dinheiro. A
mesma denúncia que foi feita contra a filha doleira e seu motorista particular,
Cleverson Coelho de Oliveira, entre outros. Segundo o MPF, Maria Dirce teria
consentido em ceder seu nome para abertura de uma conta em Hong Kong, na China,
intitulada “Il Solo Tuo Limited”, e outra conta da “NGs Prosper Participações
Ltda.”, uma empresa de fachada responsável pela administração de 60
apartamentos no hotel Go Inn, no Jaguaré, zona oeste da capital paulista. As
duas contam serviriam para ocultar o dinheiro do esquema entre empreiteiras e a
Petrobras.
No dia 22 de outubro de 2014,
Maria Dirce Penasso foi condenada a dois anos, um mês e dez dias de prisão,
tendo a pena sido transferida para prestação de serviço à comunidade. Além
disso, Sergio Moro bloqueou os quase R$ 11 mil que estavam em sua conta quando
ela teve a casa alvo de busca e apreensão. Na mesma sentença, sua filha, Nelma
Kodama, foi condenada a 18 anos de prisão por Sergio Moro por lavagem de
dinheiro, evasão de divisas, corrupção ativa e por supostamente liderar uma
organização criminosa. Considerada a primeira delatora da Lava Jato, Nelma teve
sua pena reduzida para 15 anos em 2015. Em junho do ano seguinte ela passou ao
regime semiaberto, com a utilização da tornozeleira eletrônica. Em agosto de
2019, foi autorizada a retirar o aparelho ao ser beneficiada pelo indulto
natalino editado por Michel Temer em 2017, que prevê o cumprimento de um quinto
da pena para não reincidentes. Como Nelma já havia cumprido mais de três anos,
a benesse foi concedida.
Nelma era ligada ao doleiro
Alberto Youssef, um dos nomes mais conhecidos de toda a operação e um dos
primeiros a aderir à delação premiada – ele foi condenado a mais de cem anos de
prisão, em 12 processos, mas ficou apenas três no regime fechado. Além da
relação profissional, os dois mantinham um vínculo sentimental. Por esse
motivo, de acordo com o advogado de Maria Dirce, a mãe de Nelma conhecia
Youssef, que frequentava sua casa. “Ela não sabia dessas transações que eles
faziam. A Nelma visitava ela, mas a Dirce nunca ficou perguntando. A filha já
era adulta, né? A mãe não ficava questionando sobre os afazeres dela”, diz o
advogado.
Em dezembro de 2015, Maria Dirce
foi absolvida pelo TRF4 de todas as acusações que constavam no processo em que
havia sido condenada por Moro. “Quando chega em um tribunal, com outros três
desembargadores, tudo muda, porque eles podem colocar outra visão. A Maria
Dirce provou, através do imposto de renda, que tudo que ela tem foi conquistado
pelos anos de trabalho como celetista. Não houve elevação da renda ou do
patrimônio nos últimos anos”, conta Pugliesi Lima.
Maria Dirce não quis conversar com
a Pública “para não reviver uma história que prefere esquecer”, de acordo com o
advogado.
Nelma Kodama utilizou o nome da
mãe como “laranja” para a abertura de conta em offshore
Duas condenações, uma absolvição
Também o ex-gerente administrativo
André Catão de Miranda diz ter sido pego de surpresa por acusações que
desconhecia. Ele e outras pessoas ligadas ao Posto da Torre foram presos em
março de 2014 em decorrência do mesmo processo que condenou o dono do posto, o
doleiro Carlos Habib Chater, apontado como líder e executor de crimes
financeiros. Por realizar operações de câmbio e pagamentos a mando do patrão,
consideradas irregulares pelo MPF, ele foi detido em Brasília e transferido
para a Casa de Custódia de São José dos Pinhais, no Paraná, onde ficou preso
provisoriamente por sete meses.
“Foi um tremendo desrespeito. Os
dias passavam e ele lá dentro da prisão”, critica o advogado Marcelo de Moura,
defensor de Miranda. “Ele era um funcionário subalterno, que recebia ordens e,
se eventualmente algum ato ilícito foi praticado, aconteceu com o total
desconhecimento [dele]. Ele cuidava da parte financeira, mas exclusivamente da
atividade-fim, que era venda de combustível”, afirma Moura.
Para o MPF, no entanto, o gerente
do posto de gasolina era responsável por fazer pagamentos em uma extensa rede
de lavagem de dinheiro, que envolvia, além de seu patrão, os doleiros Alberto
Youssef, Raul Henrique Srour e Nelma Kodama e um suposto traficante de drogas,
René Luiz Pereira. Duas ações penais foram movidas contra o gerente, uma delas
por tráfico de drogas. Nesse caso, segundo o MPF, Chater teria utilizado, com a
cumplicidade de seu gerente, a estrutura do Posto da Torre para lavar US$ 124
mil provenientes da venda de cocaína na Europa.
Nos depoimentos que prestou na 13ª
Vara de Curitiba, Miranda disse ter feito os pagamentos por determinação do
patrão. Mas, em outubro de 2014, Sergio Moro o condenou a quatro anos de
reclusão em regime semiaberto. Menos de um ano depois da condenação, em
setembro de 2015, o TRF4 absolveu André e manteve as punições de René Luiz
Pereira (14 anos de prisão) e Carlos Habib Chater (cinco anos). Os
desembargadores Leandro Paulsen e Victor Luís dos Santos Laus apresentaram voto
favorável à absolvição, enquanto o relator João Pedro Gebran Neto votou pela
manutenção da condenação em primeira instância.
Segundo Paulsen, “André era um
empregado de Habib, não havendo nenhum elemento que aponte qualquer
enriquecimento”, disse. “O Ministério Público Federal não trouxe elementos
(quebra de sigilo financeiro, fiscal, prova testemunhal ou documental)
demonstrando que o réu (André) auferia recursos derivados de atividade ilícita.
Também parece contrariar a lógica afirmar que Miranda coordenava todo o núcleo
de operações financeiras ilícitas de Carlos Habib sem a obtenção de qualquer
contrapartida específica para tanto”, afirmou o desembargador.
Apesar de absolvido, a condenação
mudou a vida de Miranda para sempre, de acordo com o seu advogado: “O reparo
nunca é suficiente para voltar ao ponto anterior de uma pessoa que não tinha
envolvimento nenhum com atividade criminosa e é surpreendida com uma prisão,
que acaba por perdurar durante sete meses. Essas máculas não podem ser
reparadas, tanto do ponto de vista financeiro quanto emocional”.
Além disso, em outubro de 2018,
Sergio Moro, voltou a condená-lo, dessa vez a dois anos e seis meses em regime
aberto pelo crime de pertencimento a organização criminosa. De acordo com o
ex-juiz, Miranda “fazia pagamentos, recebimentos e lançamentos no Sismoney, ou
seja, na contabilidade informal. Não era meramente um gerente financeiro
regular do Posto, mas pessoa de confiança de Carlos Habib Chater. Não se pode
afirmar que não tinha conhecimento da utilização da estrutura do Posto da Torre
para a prática dos crimes financeiros e dos quais aliás participava”.
A pena foi revertida para serviços
comunitários, mas Miranda “ficou revoltado”, diz o seu advogado. “Ele já tem as
marcas de uma prisão ilegal. Após a absolvição, ele estava reestruturando a
vida aos poucos. Uma notícia pesada como essa gera a sensação de que uma nova
injustiça precisa ser combatida.”
Após a primeira condenação,
Miranda morou em Uberlândia e atualmente trabalha em uma empresa da família, em
Brasília. A nova condenação, diz o advogado, significa uma pá de cal nos planos
do ex-gerente. “O André é o tipo de cidadão que poderia atravessar a vida
inteira sem entrar em uma delegacia, muito menos ser preso. As investigações
mostraram que ele não tinha aparelho de comunicação restrita, possuía um
apartamento adquirido com recurso próprio, utilizando fundo de garantia, e não
tinha automóvel. Ele entrou no bolo de uma investigação precipitada, que
geraram prisões e condenações injustas”, critica.
O recurso no TRF4 já foi
protocolado e a defesa espera o julgamento, que ainda não tem data marcada. Na
avaliação de Moura, a Lava Jato extrapolou limites jurídicos. “Acho que se
elegeu a corrupção, que é um mal a ser combatido, como um tema que extrapola a
legalidade. É como se as armas utilizadas contra a corrupção pudessem ser
ilegais.”
Com ele concorda Maria Carolina
Amorim, coordenadora do escritório do Instituto Brasileiro de Ciências
Criminais (IBCCRIM) em Pernambuco. “Antes de se ver condenado, o réu é exposto
pela imprensa de forma irreparável, em razão da permissividade que o Judiciário
tem tido com os seus funcionários que vazam informações. Em caso de condenação,
tal dano é ainda maior, motivo pelo qual deve-se exigir mais responsabilidade
do julgador”, diz Maria Carolina.
Outros casos
Além dos já citados Fernando
Stremel, Maria Dirce e André Catão de Miranda, há outras 12 pessoas – entre
elas o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, que teve duas condenações
anuladas pelo TRF4. A primeira, de setembro de 2015, em que foi condenado a 15
anos e quatro meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, foi revogada
em 2017. Em outra ação penal, envolvendo a empresa Engevix, a condenação a nove
anos de prisão foi anulada por insuficiência de provas. Em contato com a
Pública, o advogado Luiz Flávio D’Urso afirmou que Vaccari “se vê injustiçado,
pois somente fez o que lhe competia como tesoureiro do partido: pedia doações
legais para o PT, sempre por depósito bancário e com recibo, jamais recebeu
recursos em espécie. Ele foi um símbolo, um troféu”, afirmou o advogado.
Veja os outros casos em que as
sentenças de Moro foram revistas pelo TRF4:
Mateus Coutinho de Sá Oliveira:
condenado a 11 anos de prisão em agosto de 2015, aderiu à delação premiada e
foi absolvido um ano depois. Ele era diretor financeiro da OAS e foi apontado
pelo MPF como um dos responsáveis pelo departamento de propinas da empreiteira.
André Luiz Vargas Ilário:
ex-deputado federal (PT) foi condenado a quatro anos e seis meses de prisão em
regime fechado por lavagem de dinheiro e absolvido no ano passado pelo TRF4.
Foi condenado em outras duas ações da Lava Jato: seis anos em um esquema de
lavagem de dinheiro envolvendo uma empresa fornecedora de softwares, e 14 anos
e quatro meses de prisão, em 2015, também por lavagem de dinheiro. As
condenações foram mantidas em segunda instância, mas, como ele já havia
cumprido parte da pena quando foi preso preventivamente, está em liberdade
condicional e com algumas restrições.
Leon Vargas Ilário: foi absolvido
junto com irmão, André Vargas, no mesmo processo por lavagem de dinheiro. Em
outubro do ano passado, na ação penal envolvendo o esquema de softwares, que
também afetou o ex-deputado André Vargas, Leon teve a pena reduzida pelo TRF4
de cinco anos, para quatro anos, nove meses e 18 dias em regime semiaberto
Fernando Schahin: executivo do
Grupo Schahin, recebeu condenação, em setembro de 2016, de cinco anos e quatro
meses de prisão, por corrupção ativa, envolvendo benefícios em uma licitação da
Petrobras para operação do navio-sonda Vitória 10.000 e empréstimos concedidos
ao pecuarista José Carlos Bumlai. Foi absolvido em maio de 2018. Em outro
processo, que também aponta irregularidades na construção e operação dos
navios-sonda Petrobras 10.000 e Vitória 10.000, Fernando teve a pena reduzida
para pouco mais de cinco anos.
Agosthilde Mônaco: assessor do
ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró, foi absolvido da
condenação de 2017 pelo crime de lavagem de dinheiro proveniente de contratos
dos navios-sonda Petrobras 10.000 e Vitória 10.000. Foi, no entanto, denunciado
outra vez pelo MPF, dessa vez por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, na
negociação da compra da Refinaria de Pasadena pela Petrobras. O processo se
encontra na fase de oitiva de testemunhas.
José Carlos Costa Marques Bumlai:
pecuarista e empresário apontado pelo MPF como responsável pela realização de
reformas no sítio de Atibaia. Foi condenado a uma pena de três anos e nove
meses de reclusão na primeira instância, mas absolvido pela Oitava Turma por
ausência de provas em novembro do ano passado. Ele foi condenado também, dessa
vez a nove anos e dez meses de prisão, por gestão fraudulenta de instituição
financeira e corrupção, no mesmo caso que envolve o Banco Schahin e
navios-sonda da Petrobras. Cumprindo prisão domiciliar, foi beneficiado com a
retirada da tornozeleira eletrônica após novo entendimento do Supremo Tribunal
Federal (STF) sobre prisão em segunda instância, em novembro do ano passado.
Emyr Diniz Costa Júnior: diretor
de contratos da construtora Norberto Odebrecht. Supervisionou a obra de reforma
do sítio de Atibaia, que tem como principal alvo o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva. Emyr foi condenado a três anos de reclusão por Sergio Moro, mas foi
absolvido pelo TRF4, no dia 27 de novembro de 2019, por ausência de provas.
Roberto Teixeira: advogado e amigo
do ex-presidente Lula, também foi acusado de envolvimento no processo do sítio
de Atibaia. Ele teria ocultado documentos que demonstrariam a ligação da OAS
com a reforma, além de orientar engenheiros da empreiteira a celebrar contratos
fraudulentos com Fernando Bittar, um dos proprietários do sítio. Teixeira foi
condenado a dois anos de reclusão na primeira instância, mas foi absolvido por
ausência de provas.
Paulo Roberto Valente Gordilho:
diretor técnico da OAS, era o encarregado da reforma do sitio de Atibaia. Foi
condenado a um ano de reclusão por Sergio Moro, mas foi absolvido pelo TRF4 por
ausência de provas.
Isabel Izquierdo Mendiburo Degenring
Botelho: agente do banco Société Générale no Brasil, foi acusada de auxiliar a
abertura de contas em offshores pelo mundo de ex-diretores da Petrobras,
caracterizando crime de lavagem de dinheiro. Foi condenada a três anos e oito
meses de prisão em novembro de 2018, mas foi absolvida na segunda instância um
ano depois.
Álvaro José Galliez Novis: doleiro
condenado a quatro anos e sete meses por lavagem de dinheiro em março de 2018,
na mesma ação penal que envolveu o ex-presidente do Banco do Brasil Aldemir
Bendine. Em agosto do ano passado, foi beneficiado pelo habeas corpus deferido
pela Segunda Turma do STF, em agosto do ano passado, que anulou a sentença
confirmada pelo TRF4 em maio de 2019.
Alteração às 20h33 21.01.2020 –
Aldemir Bendine foi presidente do Banco do Brasil e não do Banco Central como
constava anteriormente
Pedido da Procuradoria-Geral da República foi enviado ao
Supremo Tribunal Federal a partir de notícia-crime de senadores. Pazuello, é
denunciado pelo MPF por improbidade administrativa na gestão da pandemia
O presidente Jair Bolsonaro, em cerimônia no Palácio do
Planalto em 29 de junho.ADRIANO MACHADO / REUTERS
A Procuradoria-Geral da República (PGR) informou nesta
sexta-feira ao Supremo Tribunal Federal (STF) a instauração de
inquérito para apurar o suposto crime de prevaricação cometido pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no caso da compra
da vacina indiana Covaxin. Na semana passada, o deputado Luis Miranda (DEM-DF)
afirmou em depoimento à CPI da Pandemia que Bolsonaro foi informado sobre
irregularidades na compra do imunizante. A investigação busca apurar se o
presidente de fato soube do ocorrido e se não agiu, cometendo assim o crime de
prevaricação.
O pedido da PGR foi protocolado nesta sexta-feira, depois
que a ministra do Supremo, Rosa Weber, cobrou uma posição da Procuradoria sobre
a notícia-crime apresentada ao STF pelos senadores Randolfe
Rodrigues (Rede-AP), Fabiano Contarato (Rede-ES) e Jorge Kajuru (Podemos-GO).
No documento, os autores atribuem a Bolsonaro a prática de prevaricação.
Previsto no código penal, o crime pune o servidor público acusado de “retardar
ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra
disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal”.
Ao ser cobrada pela ministra, a PGR pediu para esperar pelo desfecho da CPI, que deve ser
prorrogada por mais 90 dias. Rosa Weber, no entanto, afirmou que a apuração da
CPI da Pandemia não impede a atuação da Procuradoria.
Segundo o deputado Luis Miranda, ele e seu irmão, o servidor
do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, foram pessoalmente informar
Bolsonaro sobre as irregularidades na compra da vacina indiana. O servidor Luis
Ricardo disse que sofreu “pressão” para fechar contrato com a Precisa
Medicamentos, intermediadora dos negócios entre o Brasil e a Índia. Segundo os
irmãos, o presidente chegou a afirmar que acionaria a Polícia Federal para
apurar o caso, o que não ocorreu.
No pedido da PGR, assinado pelo vice-procurador-geral da
República, Humberto Jacques de Medeiros, pede que “se esclareça o que foi feito
após o referido encontro em termos de adoção de providências”. Ele também
solicita informações à Controladoria-Geral da União, ao Tribunal de Contas da
União, à Procuradoria da República no Distrito Federal, e em especial à CPI da
Pandemia com o compartilhamento de provas. E sugere o prazo de 90 dias para as
providências solicitadas.
Sobre as acusações, Bolsonaro diz apenas que não desembolsou
“nem um centavo” para a compra do imunizante indiano. Mas nesta semana, o
Ministério da Saúde e a Controladoria-Geral da União anunciaram a suspensão do
contrato a Precisa Medicamentos até que os fatos sejam apurados.
Pazuello é alvo do MPF
O Ministério Público Federal (MPF) enviou à Justiça uma ação
contra o ex-ministro da Saúde, Eduardo
Pazuello, que responderá por danos ao patrimônio público e violação aos
princípios da Administração na gestão da pandemia. De acordo com reportagem
publicada pelo portal UOL, a ação, que tramita provisoriamente em segredo de
justiça por conter documentos protegidos por sigilo legal, aponta quase 122
milhões de reais de dano aos órgãos de administração pública. O MPF pede o
ressarcimento integral do prejuízo mais pagamento de multa de até duas vezes o
valor do dano.
Além da devolução dos valores e da multa, o MPF pede que
Pazuello perca a função pública, os direitos políticos por até oito anos e a
proibição de contratar com o Poder Público. Embora tenha deixado o comando do
Ministério da Saúde, Pazuello ocupa atualmente o cargo de Estudos Estratégicos
da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.
A PGR (Procuradoria-Geral da República) pediu hoje ao STF
(Supremo Tribunal Federal) a instauração de um inquérito para apurar se o
presidente Jair Bolsonaro (sem partido) prevaricou no processo de compra da
vacina Covaxin. O presidente foi alvo de uma notícia-crime apresentada por
senadores. Leonardo Sakamoto, colunista de política do UOL, e Wallace Corbo,
professor de Direito da FGV-Rio, explicaram os impactos do pedido no governo
federal e na conjuntura econômica.
O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública
contra a Rede TV! e Sikêra Jr, apresentador dos programa Alerta Nacional,
veiculado na emissora, por conta de falas discriminatórias e preconceituosas
contra a população LGBTQIA+ que foram ao ar em 25 de junho de 2021 na grade de
programação do referido canal de televisão (aberta e fechada). Na ocasião,
Sikêra relacionou a prática de crime, pedofilia e uso de drogas à
homossexualidade, entre outras falas de menosprezo e de preconceito.
Sikêra Jr está sendo acusado no Ministério Público por
LGBTfobia – Foto: Reprodução
O MPF assina a ação em conjunto com a associação que atua na
defesa dos direitos humanos da população LGBTQIA+ Nuances – Grupo Pela Livre
Expressão Sexual.
O procurador regional dos Direitos do Cidadão no RS, Enrico
Rodrigues de Freitas, e a advogada Alice Hertzog Resadori, do Nuances,
signatários da ação, reiteram que as falas preconceituosas veiculadas na Rede
TV! tiveram por objeto de fundo a campanha publicitária realizada pela rede de
alimentação Burger King, focada em celebrar junho como o Mês do Orgulho
LGBTQIA+. Alusiva à temática da diversidade, a campanha dedica especial atenção
a enfrentar o preconceito e procura tratar do tema da diversidade também junto
ao público infantil.
MPF e Nuances pedem que Rede TV! e Sikêra Jr sejam
condenados ao pagamento de R$ 10 milhões a título de indenização por
danos morais coletivos – valor a ser destinado à estruturação de centros de
cidadania LGBTQIA+.
Além da indenização, a ação civil pública também requer a
exclusão da íntegra do programa objeto da presente ação que foi veiculado em 25
de junho de 2021 de seus sites e redes sociais e que tanto a emissora como seu
apresentador sejam obrigados a publicar retratação pelos mesmos meios e mesmo
tempo e em idêntico horário, especificando tratar-se de condenação judicial
imposta nos autos da ação, devendo a referida postagem permanecer nos sites da
empresa ré pelo prazo mínimo de um ano.
Pedimos ao Ministério Público que investigue este apresentador por homofobia, conduta que deve ser punida na lei penal. Liberdade de expressão não pode ser usada p/ cometimento de crimes, incitação à violência e ofensa à honra, à dignidade e à imagem. https://t.co/XJCJ0bt3kO
— Fabiano Contarato (@ContaratoSenado) June 28, 2021
Olá @Caixa, tudo bem? No país que mais mata lgbts ainda temos que repetir que não há cura para o que não é doença! Que tal se posicionar ao lado da comunidade e parar de patrocinar com DINHEIRO PÚBLICO as falas criminosas do SIkêra Jr na TV? Pfv Caixa #DesmonetizaSikera!✊🏽🏳️🌈 pic.twitter.com/ZYPu3Ct9cQ
— Sleeping Giants Brasil (@slpng_giants_pt) June 28, 2021
Conversas gravadas pelo advogado Nythalmar Dias Ferreira
Filho mostra o juiz Bretas combinando penas
Marcelo Bretas - Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal
Segundo o advogado Nythalmar Dias Ferreira Filho, Bretas
está longe de ser um juiz imparcial e “se comporta como policial, promotor e
juiz ao mesmo tempo: negocia penas, orienta advogados, investiga, combina
estratégias com o Ministério Público, direciona acordos, pressiona
investigados, manobra processos e já tentou até influenciar eleições, mas
claro, tudo à margem da lei”.
O advogado Nythalmar afirma que tem provas e que vai
apresentar todas elas e, a principal delas, é a gravação de uma conversa entre
ele, o juiz e um procurador da República encarregado da Lava Jato.
Segundo informações da revista Veja, em 2017 os três
discutiam uma estratégia para convencer o empresário Fernando Cavendish a
confessar seus crimes mediante o oferecimento de algumas vantagens jurídicas.
O juiz diz a Nythalmar, representante de Cavendish, que havia sondado o Ministério Público sobre um acordo e, caso tudo saísse como combinado, poderia “aliviar” a pena do empresário. “Você pode falar que conversar com ele, com o Leo, que fizemos uma videoconferência lá, e o procurador me garantiu que aqui mantém o interesse, aqui não vai embarreirar”, diz Bretas ao advogado.
Léo é o procurador Leonardo Cardoso de Freitas, então
coordenador da Lava Jato do Rio de Janeiro.
“E aí deixa comigo também que eu vu aliviar. Não vou botar
43 anos no cara. O cara tá assustado com os 43 anos”, afirmou o juiz.
Posteriormente à conversa obtida por Veja, de fato Cavendish começou a
confessar os seus crimes e mais tarde assinou um acordo de delação premiada com
o Ministério Público. À época, o empresário revelou que gastou milhões em
propinas para políticos. Com isso, ganhou o direito de responder ao processo em
liberdade.
O advogado afirma que, a partir dos áudios apresentados que
o juiz Marcelo Brettas “demonstra de forma inequívoca que o juiz responsável,
juntamente com os membros da força-tarefa, montou um esquema paraestatal,
ilegal de investigação, acusação e condenação
No anexo II do acordo de colaboração, Nythalmar afirma que,
por volta de maio de 2018k, a pedido do filho de Cabral, procurou Bretas com a
proposta de livrar Adriana. O juiz concordou, ajustou os detalhes com o
procurador Eduardo El Hage, então chefe da Laja Jato no estado, e deu
orientações para que Cabral e a ex-primeira-dama redigissem uma carta de
próprio punho “abrindo mão de todo o patrimônio”.
Preso em Bangu 8, Sérgio Cabral passou a confessar seus
crimes a Bretas em junho de 2018. Em agosto do mesmo ano, o magistrado revogou
a prisão domiciliar de Adriana Ancelmo e autorizou que ela respondesse às
acusações em liberdade.
Por fim, o delator informou que tem guardada uma gravação
que “demonstra a participação, ciência e aquiescência de acordo similar” ao do
ex-governador.
The last remaining Lava Jato investigation, in Rio de Janeiro, is also falling into disgrace as Judge Marcelo Bretas (shown here eating popcorn with disgraced Lava Jato Curitiba judge Sergio Moro) is accused of negotiating sentences and illegal collusion with prosecutors. pic.twitter.com/cLxwGUvB3W
A despeito das ações temerárias do Ministério do Meio
Ambiente, da omissão da Funai e da narrativa que propõe a abertura das Terra
Indígenas (TIs) à mineração, ao agronegócio e ao garimpo, a Polícia Federal
(PF) está de volta à Terra Indígena Munduruku, dando sequência à investigação
que identificou a atuação de uma organização criminosa na extração de ouro.
A ação é uma resposta à decisão do Supremo Tribunal Federal
(STF), que determinou ao Governo Federal a adoção imediata de todas as medidas
necessárias à proteção da vida, da saúde e segurança do povo Munduruku.
Alvo de uma sequência de denúncias produzidas por lideranças
do povo Munduruku ao Ministério Público Federal (MPF), as ações criminosas do
grupo “Boi na Brasa” no interior da TI Munduruku foram alvo de quase um ano de
investigação realizada pela PF, que acabou por tornar réus oito pessoas
acusadas de comandar as operações do referido grupo e mais cinco indígenas
envolvidos no esquema investigado.
Os acusados serão agora processados e julgados por crimes
contra o meio ambiente, associação criminosa e extração ilegal de minério,
podendo ser condenados a penas que, somadas, ultrapassam 30 anos de prisão.
Não é novidade que a TI Munduruku vem sendo sistematicamente
invadida por garimpeiros, e que estes se associaram de maneira criminosa com um
pequeno grupo de indígenas e passaram a explorar ouro ao longo dos principais
rios do território Munduruku.
De 2008 a 2020 foram nada menos que 61 km² da mais pura
destruição, sendo 63% desse total destruído entre 2019 e 2020, sob a clara
influência da promessa do governo Bolsonaro de abrir as terras indígenas à
mineração e ao garimpo.
Os planos do governo Bolsonaro e da bancada ruralista no
Congresso, de limitar os direitos indígenas e quebrar o usufruto exclusivo das
terras indígenas, já são bastante claros para toda a sociedade. Para além das
falas do presidente, são muitas as iniciativas que buscam entregar as áreas
indígenas para o “desenvolvimento” da chamada economia da destruição, a exemplo
do Projeto de Lei (PL) 191/2020 e do Projeto de Lei (PL) 490/2007, que
na prática obrigarão os povos indígenas a abrir mão de seu modo de vida e a se
associarem ao agronegócio e a mineração, além de praticamente inviabilizar a
demarcação das mais de 800 terras indígenas ainda não reconhecidas pelo Estado
brasileiro.
Depois de 520 anos, não podemos aceitar que tudo que temos a
oferecer aos sobreviventes do genocídio praticado ao longo do processo de
colonização e constituição de nossa sociedade, seja tão somente mais morte e
desrespeito à culturas que há mais de 10 mil anos se desenvolvem neste canto do
mundo.
Por isso, e por reconhecer o direito originário conferido
aos 305 povos indígenas desta nação, o Greenpeace Brasil reitera seu
compromisso com a defesa e a promoção dos direitos indígenas no Brasil e
repudia todas as tentativas daqueles que se orientam pela monocultura do lucro,
em detrimento da diversidade que caracteriza a cultura nacional e o amplo
conjunto dos nossos recursos naturais.
É urgente que sejamos capazes de romper com a economia da
destruição que coloca em xeque não só o futuro dos povos indígenas, mas de
todos os brasileiros.
STF determina que governo adote medidas de proteção às
populações indígenas Yanomami e Munduruku
O governo vai ter que adotar medidas para proteger as
populações das terras indígenas Yanomami e Munduruku. A determinação é do
ministro do supremo tribunal federal, Luís Roberto Barroso.
Quero manifestar minha solidariedade para Maria Leusa e ao povo Munduruku que lutam por suas vidas. @apiboficial e @coiabamazonia junto com as organizações de base mobilizam todo apoio necessário para que a justiça seja feita e o direito dos povos, garantido pela CF, prevaleça.
Denunciamos uma grave ofensiva em curso, nesta quarta (26), contra lideranças indígenas da TI Munduruku.
Garimpeiros que atuam na região estão atacando com tiros e incendiando casas em retaliação à operação Mundurukânia, da Polícia Federal. pic.twitter.com/lsiimShzvh