Membros do MPSP querem ser incluídos nos grupos prioritários
para a vacinação, como idosos e profissionais da saúde
Um grupo de promotores e procuradores do Ministério
Público do Estado de São Paulo (MPSP) escreveu um
abaixo-assinado encaminhado para o gabinete de crise contra a pandemia do governo do estado de São Paulo solicitando
que todos os membros do MP recebam a vacina contra a covid-19 antes da população em
geral.
O pleito foi apresentado ao procurador-geral de Justiça do
Estado de São Paulo, Mário Luiz Sarrubbo, no dia 24 de novembro deste ano,
durante reunião do Conselho Superior do Ministério Público do estado. Quem fez
formalmente o pedido foi o procurador Arual Martins, um dos membros do
conselho.
O pedido consta em ata oficial da referida reunião, à que a
reportagem do Brasil de Fato teve acesso. De acordo Martins, a
demanda foi levada a ele pelo promotor Roberto Barbosa Alves, que
apresentou manifestação que também teria sido assinada por "outros colegas
do MP".
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Durante a reunião, o procurador leu um trecho do
abaixo-assinado dos membros do MP, em que os signatários explicam por que
querem ser passados na frente do resto da população quando a vacina estiver
disponível:
"Não é uma questão de egoísmo em relação a outras
carreiras, mas tendo em vista notadamente os colegas do primeiro grau, que
trabalham com audiências, atendimento ao público e outras atividades em que o
contato social é extremamente grande e faz parte do nosso dia a dia", diz
o trecho citado.
Após a apresentação do abaixo-assinado, o procurador-geral Mário Luiz Sarrubbo prontamente apoiou o pleito, informando que "poderia pessoalmente se empenhar em apresentar esse pleito ao Governo do Estado, (...) para ser levado à análise pelo Gabinete de Crise".
O Brasil de Fato entrou em contato nesta
quarta-feira (2) com a assessoria de comunicação do MPSP, direcionando
perguntas para o procurador-geral e para os membros do órgão identificados na
ata da reunião como dois dos signatários do pedido. Foi perguntado sobre a
justificativa para tal pleito e sobre sua eventual legalidade.
Em resposta, o MPSP enviou uma nota (veja a íntegra no final
desta reportagem) afirmando "estar certo de que as autoridades
sanitárias definirão o cronograma de aplicação da vacina com base em critérios
científicos, priorizando a imunização das parcelas da população mais
vulneráveis, tanto do ponto de vista médico quanto social. Tal definição,
evidentemente, será plenamente acatada pela instituição."
Questionado pela reportagem se o pedido dos procuradores e
promotores já foi levado ao Gabinete de Crise do Estado de São Paulo, o
Ministério Público não respondeu.
Por que prioritários?
Para o professor de Direito Processual e conselheiro da
Comissão de Prerrogativas da OAB-SP André Lozano Andrade, o pedido dos
promotores e procuradores "é inviável" e não deve prosperar.
Ele explicou que o Ministério da Saúde definiu que irá
iniciar a vacinação - quando o medicamento for liberado pela Anvisa - por
grupos prioritários, como idosos, pessoas com doenças crônicas, funcionários da
segurança pública e da Educação, indígenas, presidiários e profissionais
de saúde.
Não há justificativa para tornar o MP prioridade.
"O MP-SP está pedindo para ser incluído nesses grupos
prioritários. Mas os promotores não atuam diretamente com as pessoas. As
audiências vêm sendo feitas remotamente, mesmo quando presidiários são levados
ao fórum para uma audiência, os promotores participam por
teleconferência", esclarece Andrade.
Ele continua: "Mesmo se as audiências passassem a ser
presenciais, seria mais do que necessário incluir advogados, juízes e
defensores públicos como prioritários na aquisição da vacina, uma vez que eles
também fazem parte das audiências e realizam atendimento ao público, todos eles
atuando na administração da Justiça. Não há justificativa para tornar o MP
prioridade e não fazer o mesmo com os demais".
Ainda que, então, se incluísse todas essas classes
profissionais entre o público prioritário, isso aumentaria muito as classes
prioritárias. "Isso geraria uma questão de política e de interesse
público, sobre o que ou quem priorizar. É muito mais importante a volta às
aulas e, por exemplo, a reabertura segura do comércio, do que as audiências
judiciais voltarem a ocorrer presencialmente", conclui o especialista.
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Já a advogada criminalista Pollyana Soares, da
banca Roberto Pagliuso Advogados, que atua em fóruns de Justiça exatamente da
mesma maneira e sob as mesmas exposições que os promotores, só que defendendo a
parte acusada, afirma que o pedido de seus colegas operadores do Direito do MP
não encontra respaldo legal.
"Do ponto de vista da exposição ao coronavírus, o que
faz dos membros do Ministério Público mais vulneráveis à infecção do que
advogados, juízes ou serventuários da Justiça? Absolutamente nada. Então, desde
essa perspectiva – da igualdade – a preferência não se justifica", explica
a advogada.
Soares escuda seu entendimento com base na Lei federal
nº 8.906/94, que, em seu artigo 6º, preconiza: "Não há hierarquia nem
subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público,
devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos".
Leia, abaixo, o trecho da ata da reunião do Conselho
Superior do Ministério Público de São Paulo referente ao assunto desta
reportagem, e, em seguida, a nota enviada pelo MP-SP ao Brasil de Fato.
Extrato da Ata da 22ª Reunião Ordinária do Conselho
Superior do Ministério Público, Realizada no Dia 24-11- 2020
"Dirigindo-se ao Procurador-Geral, o Conselheiro
Arual apresentou manifestação que lhe foi trazida pelo colega Promotor de
Justiça Doutor Roberto Barbosa Alves e outros colegas que a subscreveram, e que
deve ser tratada no Comitê de combate à Covid-19. Trata-se de sugestão para
análise da possibilidade de que os Promotores de Justiça sejam incluídos em uma
das primeiras etapas prioritárias da vacinação contra a Covid-19, dada a
atividade funcional da carreira.
Realizou a leitura do seguinte trecho de referida
manifestação: “não é uma questão de egoísmo em relação a outras carreiras, mas
tendo em vista notadamente os colegas do primeiro grau, que trabalham com
audiências, atendimento ao público e outras atividades em que o contato social
é extremamente grande e faz parte do nosso dia a dia”. O Conselheiro Arual
relatou que recebeu essa matéria e respondeu ao colega no sentido de que iria
apresentá-la na reunião para que o Comitê da Covid-19, que é integrado por
diversos colegas e está realizando um trabalho extremamente valoroso e
grandioso, pudesse analisar a questão e verificar essa possibilidade, dentro
das análises que o Comitê tem realizado.
4.3. O Conselheiro Sarrubbo afirmou que encaminhará a
questão ao Gabinete de Crise e que pode pessoalmente se empenhar em apresentar
esse pleito ao Governo do Estado. Registrou que a notícia recebeu na reunião
realizada na data de ontem, 23/11, com o Governador, é que terminaram os testes
da Coronavac, que será encaminhada para registro na Anvisa, sendo este o
próximo passo do protocolo tradicional.
Relatou que assim como a Coronavac, outras vacinas têm se
mostrado com eficácia muito boa e há uma perspectiva de que a partir de janeiro
comecem as vacinações, inicialmente para a população mais vulnerável, que
seriam os idosos, os profissionais de medicina, e assim por diante. De todo
modo, considera que é um pleito que pode ser levado a análise pelo Gabinete de
Crise."