BRASÍLIA – Primeiro a ser interrogado pela CPI da Covid, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta disse nesta terça-feira, 4, ter sido chamado no Palácio do Planalto para tratar sobre incluir na bula da cloroquina a recomendação para tratar covid-19. O medicamento, propagandeado pelo presidente Jair Bolsonaro como solução para a doença, é usado para contra malária, artrite reumatoide e lúpus, mas não há comprovação científica de que tenha efeito contra o novo coronavírus.
O ex-ministro, demitido em 16 de abril de 2020, narrou ter
sido chamado às pressas para uma reunião no terceiro andar do Palácio do
Planalto, onde fica o gabinete presidencial, na qual outros integrantes da
equipe e médicos convidados discutiam mudar a bula por meio de decreto. Na
versão de Mandetta, o presidente da Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres, teria
barrado a ideia.
“Era para eu subir para o terceiro andar porque tinha lá uma
reunião de vários ministros e médicos que iam propor esse negócio de cloroquina
que eu nunca havia conhecido. Ele (Bolsonaro) tinha um assessoramento
paralelo. Nesse dia, havia sobre a mesa, por exemplo, um papel não timbrado de
decreto presidencial para que fosse sugerido naquela reunião que se mudasse a
bula da cloroquina na Anvisa, colocando na bula a indicação da para
coronavírus”, afirmou. “O presidente da Anvisa disse que não. Jorge Ramos (na
verdade Jorge Oliveira, então ministro da Secretaria-Geral da Presidência)
disse que era uma sugestão. Uma sugestão de alguém que se deu trabalho de
colocar aquilo em formato de decreto.”
Em outro momento, Mandetta afirmou não ter dado qualquer
orientação sobre aumentar a produção de cloroquina nos laboratórios do
Exército. A medida foi tomada pelo governo no ano passado, quando alguns
médicos passaram a recomendar o medicamento para tratar a doença com base em
alguns casos, mas sem embasamento em estudos científicos.
“A única orientação sobre cloroquina que partiu do
Ministério foi sobre o uso compassivo, ou seja, quando não há outro recurso,
para pacientes graves em ambiente hospitalar. A cloroquina tem margem de
segurança estreita. Ela tem uma série de reações adversas e cuidados que devem
ser feitos. Poderia ser perigoso para as pessoas”, afirmou.
No depoimento, o ex-ministro afirmou que filhos políticos de
Bolsonaro acompanhavam reuniões ministeriais que tratavam do enfrentamento ao
vírus e atrapalharam a relação com a China, principal fornecedora de insumos.
Segundo o ex-ministro, o vereador Carlos
Bolsonaro (Republicanos-RJ) participava de reuniões ministeriais
tomando notas. E os demais, o deputado Eduardo
Bolsonaro (PSL-SP) e o senador Flávio
Bolsonaro (Republicanos-RJ), chegaram a barrar uma reunião
presencial com o embaixador da China no Planalto.
“O outro filho do presidente, Eduardo (Bolsonaro),
tinha rotas de colisão com a China. Um dia estavam os três filhos do presidente
(no Palácio do Planalto). E disse a eles que precisava conversar com o
embaixador da China. E ele disse que ‘aqui não’. Acabei fazendo por telefone.
Havia dificuldade de superar essas questões”, relatou.
Aos senadores, Mandetta afirmou que a postura de Bolsonaro
na pandemia contribuiu para o agravamento da crise e para o aumento do número
de mortes.“Se a postura teve um impacto? Sim. Em tempos de pandemia, tem que
ter unidade, fala única. O raciocínio não é individual, o vírus ataca a
sociedade como um todo. Ataca a economia, o esporte, o lazer”, disse, em
resposta ao senador Randolfe
Rodrigues (Rede-AP).
Ainda no começo de seu depoimento, Mandetta descreveu o
comportamento errático de Bolsonaro: durante algumas reuniões, o presidente
dizia concordar com as orientações do Ministério da Saúde e da Organização
Mundial de Saúde (OMS). Mas, em seguida, fazia declarações públicas defendendo
tratamentos e estratégias que não foram corroboradas pela evidência científica,
como o uso da cloroquina e o chamado “isolamento vertical”. Este último é a
ideia de manter em isolamento apenas pessoas idosas ou com comorbidades,
liberando as demais para transitar normalmente.
“Eu imagino que ele (Bolsonaro) construiu,
fora do Ministério da Saúde, alguns aconselhamentos que o levaram para estas
tomadas de decisões que ele as teve. Mas não saberia lhe nominar cada uma
delas”, completou Mandetta.
Fonte: Estadão
Estadão
Mandetta na CPI da Covid: Presidência avaliou decreto para
incluir covid-19 na bula da cloroquina
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Precisamos de explicações sobre as intenções do governo de mudar bula da Cloroquina para que remédio fosse indicado para coronavírus! #CPIdaPandemia pic.twitter.com/R2owLtSYQZ
— Mídia NINJA (@MidiaNINJA) May 4, 2021
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