Signatários rebatem acusações de antissemitismo sofridas pelo governo brasileiro por apoiar denúncia contra genocídio na Palestina
Ex-ministros, intelectuais, parlamentares e ativistas dos
direitos humanos enviaram uma carta aberta ao presidente do Brasil, Luiz Inácio
Lula da Silva, e ao ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, nesta
quarta-feira (17/01), defendendo o governo brasileiro por seu apoio à petição na
Corte Internacional da ONU, feita pela África do Sul, contra Israel por
genocídio contra os palestinos.
A defesa, assinada por nomes como Paulo Sérgio Pinheiro,
ex-ministro da Secretaria de Estado de Direitos Humanos; a professora Marilena
Chaui; e o jornalista Breno Altman, vem de encontro a críticas
"hipócritas" que a diplomacia brasileira tem sido alvo, sendo acusada
de "deslegitimar Israel, quebrar a irmandade com o povo judeu"
e "reforçar o antissemitismo".
O documento alerta que tais acusações, como a
instrumentalização política do termo 'antissemitismo' são um "flagelo
perigoso" que "deve ser combatido vigorosamente". E defende que
"condenar o apartheid e o desrespeito sistemático, por Israel,
das decisões dos órgãos da ONU e de leis internacionais humanitárias e
de direitos humanos, incluindo a não prevenção de genocídio", não
significa ser "antissemita".
"Qualquer referência à crise em Gaza deve ser
examinada no contexto da história das relações entre Israel e o povo
palestino", argumenta a carta, informando que o Estado israelense é uma
potência ocupante diante de uma Palestina "submetida a anos de apartheid,
56 anos de ocupação militar e a 16 anos de bloqueio em Gaza".
No final de dezembro passado, o governo da África do Sul
apresentou a petição à Corte Internacional de Justiça da Organização das Nações
Unidas (ONU), acusando Israel de descumprir a Convenção de Prevenção
e Punição do Genocídio de 1951.
Já no dia 10 de janeiro, o presidente Lula por meio de uma
nota do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, manifestou seu apoio à
iniciativa do governo sul-africano.
Leia a carta na íntegra:
Carta Aberta de apoio ao Excelentíssimo Senhor Presidente
da República Senhor Luiz Inácio Lula da Silva e ao
Excelentíssimo Senhor Ministro de Estado das Relações Exteriores,
Embaixador Mauro Vieira
17 de janeiro de 2024
O governo da África do Sul apresentou, em 29 de dezembro
passado, uma petição à Corte Internacional de Justiça da Organização das
Nações Unidas (ONU), em Haia, órgão com 15 juízes que julga disputas entre
Estados, com o apoio de 67 países, inclusive o Brasil. A petição acusa o
Estado de Israel de descumprir a Convenção de Prevenção e Punição do
Genocídio de 1951.
No dia 10 de janeiro, em uma nota do Ministério das
Relações Exteriores, o presidente da República relatou os esforços e ações
que seu governo tem feito em inúmeros fóruns, em prol do cessar fogo, da
libertação dos reféns e da proteção da população civil em Gaza. Destacou
ainda a atuação incansável do Brasil no exercício da presidência do
Conselho de Segurança para promover uma solução diplomática para o
conflito. À luz da continuidade de flagrantes violações ao direito
internacional humanitário em Gaza, o presidente Lula manifestou seu apoio
à iniciativa da África do Sul de acionar a Corte Internacional de Justiça,
para que determine que Israel cesse imediatamente todos os atos e medidas
que possam constituir genocídio ou crimes relacionados nos termos
da Convenção de Genocídio.
A decisão do presidente da República suscitou críticas
como a alegação de uma suposta falta de coerência da diplomacia brasileira
ao apoiar a ida à Corte, que foi considerada em discordância com a
política externa de equilíbrio entre Israel e a Palestina, e teria por objetivo
a deslegitimação de Israel quebrando a irmandade(sic) com o povo judeu,
reforçando o antissemitismo.
Não há incoerência alguma na diplomacia brasileira. Essas
críticas ignoram que o Estado brasileiro tem se guiado, nas relações
internacionais, pela primazia do respeito aos direitos humanos, conforme o
artigo 4º da Constituição de 1988. A política externa brasileira sob
a constitucionalidade democrática sempre respeitou a primazia das
normas internacionais e das decisões de órgãos multilaterais.
Qualquer referência à crise em Gaza deve ser examinada,
como asseverou recentemente o secretário-Geral da ONU, no contexto da
história das relações entre Israel e o povo palestino. A manutenção da
equidistância nas relações do Brasil advém da situação das duas partes do
conflito, sob o ângulo das obrigações do Brasil em face da legislação
internacional: o Estado de Israel, como potência ocupante, e a Palestina
ocupada, submetida a anos de apartheid, 56 anos de ocupação militar e a 16
anos de bloqueio em Gaza.
Muitas críticas apontam que o processo na Corte deixa de
lado o exame dos ataques do Hamas em 7 de outubro. Porém, o Hamas não pode
ser parte em um processo perante a Corte Internacional de Justiça, que
examina apenas disputas entre Estados. A Corte examinará a defesa de
Israel, que culpa o Hamas pelas mortes de civis e não pela sua própria
conduta. Em qualquer hipótese, o órgão judicial que pode penalizar os
crimes de guerra do Hamas é o Tribunal Penal Internacional (que investiga
e processa indivíduos), mas Israel impediu o procurador do Tribunal de
entrar em Gaza diante do risco de que ele pudesse investigar e processar
autoridades oficiais de Israel.
A acusação de reforçar o antissemitismo faz parte da
campanha de instrumentalização política do termo, ao considerar qualquer
crítica ao Estado de Israel e seu governo como antissemita. O
antissemitismo é um flagelo perigoso e deve ser combatido vigorosamente.
Mas não significa ser antissemita condenar o apartheid e o desrespeito
sistemático, por Israel, das decisões dos órgãos da ONU e de leis
internacionais humanitárias e de direitos humanos, incluindo a não
prevenção de genocídio. Conforme observado pela Declaração de Jerusalém e
pelo The Nexus Document sobre antissemitismo, equiparar falsamente
antissemitismo com crítica a Israel prejudica a importante luta conta o
antissemitismo.
Lamentavelmente todas essas críticas hipócritas à decisão
do governo em cartas jactanciosas, editoriais, avalanche de notas na mídia
social não levam em conta natureza, âmbito e extensão dos ataques
militares de Israel a Gaza, com um bombardeio contínuo durante 100 dias em
uma das regiões mais densamente povoadas do mundo, forçando a evacuação de
1,9 milhão de pessoas (85% da população de Gaza) de suas casas, deslocadas
para áreas cada vez mais exíguas, sem abrigo adequado, onde continuam a
ser bombardeadas, mortas, feridas e privadas de necessidades básicas
para sobrevivência. Os ataques já mataram mais de 23 mil palestinos. Gaza
se transformou em um cemitério de mais de 10 mil crianças, com milhares
de feridos com amputações sem anestesia, desaparecidos,
supostamente enterrados sob os escombros. Foram mortos 82 jornalistas,
muitos com suas famílias extensas. Mais de 150 funcionários da ONU foram
mortos, mais do que em qualquer outro conflito nos 78 anos de história
da organização.
Israel destruiu vastas áreas de Gaza, incluindo bairros
inteiros, danificou ou destruiu mais de 355 mil casas palestinas, terras agrícolas,
padarias, escolas, quatro universidades, empresas, mesquitas e locais de
culto, cemitérios, sítios culturais e arqueológicos, serviços municipais
e instalações de água e saneamento e redes de eletricidade, sistema médico
e de saúde palestinos. Israel continua a reduzir Gaza a escombros,
matando, ferindo e destruindo a população e criando condições de vida que
a petição da África do Sul alega serem calculadas para a destruição física
dos palestinos como grupo étnico e nacional.
Os aqui abaixo assinados apoiam o governo democrático do
Brasil e concordam com a decisão tomada pela diplomacia brasileira junto à
Corte Internacional de Justiça. Nesse sentido, apoiamos o presidente
da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e o ministro de Estado das Relações Exteriores,
embaixador Mauro Vieira.
PAULO SÉRGIO PINHEIRO, Ex-ministro da Secretaria de
Estado de Direitos Humanos
KENNETH ROTH, Ex-diretor Executivo da Human Rights Watch
EMBAIXADOR JOSÉ MAURÍCIO BUSTANI, Ex-diretor Geral
da Organização para Proibição de Armas Químicas
JUAN E. MENDEZ, Ex-assessor Especial do Secretário-Geral
da ONU para a Prevenção do Genocídio
FABIO KONDER COMPARATO, Professor Emérito da Faculdade
de Direito, USP
EMBAIXADOR TADEU VALADARES, Ex-diretor do Departamento
de Direitos Humanos e Temas Sociais, Ministério das Relações Exteriores
JAMES CAVALLARO, Ex-presidente da Comissão Interamericana
de Direitos Humanos, OEA
MARILENA CHAUI, Professora Emérita, Faculdade de
Filosofia Letras e Ciências Humanas, USP
PAULO VANNUCHI, Ex-ministro de Direitos Humanos
REGINALDO NASSER, Professor de Relações Internacionais,
PUC-SP
ROGERIO SOTTILI, Ex-ministro de Direitos Humanos
LUIZ CARLOS BRESSER PEREIRA, Ex-ministro da Fazenda,
Ex-ministro da Administração Federal e da Reforma do Estado
EMBAIXADOR EDUARDO ROXO
LUIZ EDUARDO SOARES, Antropólogo e Escritor,
Ex-secretário Nacional de Segurança Pública
NILMA LINO GOMES, Ex-ministra da Igualdade Racial
EMBAIXADOR FRANCISCO ALVIM
JOSE´LUIZ DEL ROIO, Historiador, Ex-senador da Itália
IDELI SALVATI, Ex-senadora, Ex-ministra de Direitos
Humanos
MILTON HATOUM, Escritor
ELEONORA MENICUCCI DE OLIVEIRA, Ex-ministra de Políticas
para as Mulheres
BRENO ALTMAN, Jornalista
SALEM NASSER, Professor de Relações Internacionais,
FGV-Direito
PEPE VARGAS, Deputado Estadual- RS e Ex-ministro de
Direitos Humanos
LAURA GREENHALGH, Jornalista
MARIA DO ROSARIO, Deputada Federal, Ex-ministra de
Direitos Humanos
MARIA VICTORIA DE MESQUITA BENEVIDES, Professora Emérita
da Faculdade de Educação, USP
BRUNO HUBERMAN, Professor de Relações Internacionais, PUC-SP
EMBAIXADOR JOSÉ VIEGAS FILHO, Ex-ministro da Defesa
Fonte: Ópera Mundi
Ao convidar ministros do STF e do STJ para visitar Israel na próxima semana, com tudo pago, fica clara a tentativa da @coniboficial, principal agência sionista no Brasil, de fazer lobby, corromper as instituições, desrespeitar nossa soberania e afrontar o presidente @LulaOficial.
— Breno Altman (@brealt) January 17, 2024
Esse foi o convite da @coniboficial para ministros do STF e STJ visitarem Israel, com tudo pago. A @StandwithusBr, uma organização sionista norte-americana, é co-patrocinadora da agenda. Prova robusta de que o sionismo tenta corromper instituições e violar nossa soberania. pic.twitter.com/aCWyFrxpwJ
— Breno Altman (@brealt) January 18, 2024
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