Um novo relatório da ONU conclui que Israel tinha a intenção de assassinar civis em massa, causar destruição urbana em larga escala e punir coletivamente os palestinos em Gaza — ao mesmo tempo que os mantinha reféns de seus objetivos políticos
Comissão Independente Internacional das Nações Unidas sobre
o Território Palestino Ocupado emitiu sua
“primeira investigação detalhada sobre os eventos que ocorreram desde 7 de
outubro de 2023”. O relatório responsabiliza a ocupação israelense pela
situação catastrófica contínua em Gaza. No entanto, também sugere a
possibilidade de que 7 de outubro seja um momento decisivo para uma ocupação
israelense ainda mais dura, a menos que o direito internacional seja
urgentemente aplicado.
Enquanto tanto o Hamas quanto Israel são considerados
culpados por crimes de guerra (incluindo violência sexual), Israel também é
sancionado por cometer “crimes
contra a humanidade de extermínio, perseguição de gênero direcionada a homens e
meninos palestinos, assassinato, transferência forçada, tortura e tratamento
desumano e cruel”.
Em clara e deliberada violação do direito internacional,
Israel tinha a intenção de cometer esses crimes: assassinar civis em massa,
causar destruição civil em larga escala e punir coletivamente e desumanizar os
palestinos em Gaza. Palestinos foram assassinados. Eles não morreram como danos
colaterais ou vítimas não intencionais de operações militares israelenses, mas
como alvos deliberados de Israel.
O imenso número de vítimas civis em Gaza e a destruição
generalizada de objetos e infraestruturas civis foram o resultado inevitável de
uma estratégia executada com a intenção de causar o máximo de dano, ignorando
os princípios de distinção, proporcionalidade e precauções adequadas. O uso
intencional de armas pesadas com grande capacidade de destruição em áreas
densamente povoadas constitui um ataque intencional e direto à população civil.
A destruição generalizada e sistemática de bairros inteiros
em Gaza é consistente com a aplicação da doutrina Dahiya em Gaza, na qual a
infraestrutura civil é deliberadamente destruída como parte de uma estratégia
de punição coletiva, reminiscente da guerra de Israel contra o Líbano em 2006.
A comissão deixa a questão do genocídio para a investigação
em curso da Corte Internacional de Justiça julgar. No entanto, acusa Israel de
manter toda a população civil em Gaza como refém para alcançar seus já
declarados objetivos políticos e militares. Se Israel falsamente e
persistentemente acusou o Hamas de usar “escudos humanos” desde 2008, a ONU
mais uma vez descobriu que, na prática, é Israel que emprega essa tática
ilegal. De fato, quando adversários do Ocidente fazem reféns, autoridades e
veículos de mídia os rotulam de terroristas. Ao punir violentamente civis
palestinos para alcançar seus objetivos políticos, Israel emprega um caso
clássico de terrorismo.
Como declarado na
Carta Aberta de Oxford sobre a Crise Humanitária em Gaza já em 20 de outubro de
2023: pensar que as atrocidades perpetradas pelo Hamas justificam a crise
humanitária atual em Gaza é indulgir em um princípio central do terrorismo —
que todos os cidadãos devem pagar pelos crimes de seus governos — assim como a
prática central do terrorismo: punição coletiva. Conforme mostrado pelo
jornalista investigativo Yuval Abraham, Israel de fato usa táticas de terror
sistematicamente em Gaza.
Além da retaliação, Israel também usou a ajuda humanitária
como arma em sua guerra contra Gaza e empregou a fome como arma de guerra. A
comissão identificou “uma intenção de instrumentalizar e usar como arma o
fornecimento de necessidades básicas, para manter a população da Faixa de Gaza
refém a fim de alcançar objetivos políticos e militares, incluindo o
deslocamento forçado de civis do norte da Faixa de Gaza e a libertação de
reféns israelenses.”
Enquanto as necessidades básicas de subsistência são
bloqueadas por um cerco militar, a “elevada insegurança alimentar aguda” é “o
resultado composto da destruição e do impedimento da produção local de
alimentos, incluindo agricultura, pesca e panificação.”
As necessidades humanas essenciais dos palestinos são
violadas e degradadas de maneira cruel por Israel, resultando em que: “Até
março de 2024, a situação continua a se deteriorar; 1,1 milhão de pessoas
enfrentam níveis catastróficos de insegurança alimentar.” Uma política de
desumanização em massa deliberada dos palestinos é identificada aqui.
Se isso não é suficientemente condenatório, o relatório
acusa Israel não apenas de falhar em proteger seus cidadãos no dia 7 de outubro
de 2023, mas, através de sua ocupação ilegal, de ser fundamentalmente
responsável pela causa raiz da violência em Israel-Palestina. Esse contexto
explicativo é crucial.
Tanto o ataque de 7 de outubro em Israel como a subsequente
operação militar de Israel em Gaza devem ser vistos no seu contexto adequado.
Esses eventos foram precedidos por décadas de violência, ocupação ilegal e
negação por parte de Israel do direito dos palestinos à autodeterminação,
manifestados em contínuos deslocamentos forçados, desapropriação, exploração de
recursos naturais, bloqueio, construção e expansão de assentamentos, e
discriminação sistemática e opressão do povo palestino.
A ocupação como causa raiz é invocada também na conclusão do
relatório. Ela está na base da violência sexual e de gênero que Israel utiliza
intencionalmente contra os palestinos para humilhar sua comunidade. “Essa
violência está intrinsecamente ligada ao contexto mais amplo de desigualdade e
ocupação prolongada, que têm proporcionado as condições e a justificativa para
crimes baseados em gênero, para acentuar ainda mais a subordinação do povo
ocupado.”
Qual, então, é a solução para os atos retaliatórios e
“persecutórios” de Israel?
O fim da ocupação israelense. Como afirma o relatório:
“Esses crimes devem ser abordados enfrentando sua causa raiz; através da
desmontagem das estruturas historicamente opressoras e do sistema
institucionalizado de discriminação contra os palestinos, que estão no cerne da
ocupação.”
Apesar do discurso oficial sobre combate o terrorismo e do
direito falso que Israel tem de se defender contra aqueles que ocupa,
identificar a ocupação como a razão subjacente para a violência é crucial. Isso
coloca a responsabilidade diretamente sobre Israel, onde a paz só pode ser
alcançada “pela estrita aderência ao direito internacional” — através do fim da
ocupação israelense e do reconhecimento do direito palestino à
autodeterminação.
Em um ambiente onde explicar o contexto e identificar as
causas raízes são frequentemente associados ao antissemitismo ou à justificação
do terror, a conclusão sóbria da comissão é uma poderosa defesa dos oprimidos.
É importante destacar que um aviso é dado ao final. O dia 7
de outubro pode muito bem marcar não a paz, mas sim uma expansão da ocupação. É
um julgamento histórico significativo para se contemplar: “7 de outubro de 2023
marcou um ponto de virada claro tanto para israelenses quanto para palestinos,
e representa um momento crucial que pode mudar a direção deste conflito; com um
risco real de solidificação e expansão ainda maior da ocupação.”
Embora Israel, de acordo com suas obrigações legais como
ocupante, deva reparar os palestinos pelos danos causados em Gaza e reconstruir
Gaza agora, é provável que faça o oposto: fortalecer sua ocupação, incentivar
ainda mais seus colonos na Cisjordânia e bloquear qualquer restituição
significativa da vida palestina em Gaza.
Em parte, isso é um julgamento sobre o efeito catastrófico
da operação militar do Hamas em 7 de outubro sobre os palestinos. É um
reconhecimento claro de que o atual equilíbrio de poder vai contra os direitos
palestinos — além de um reconhecimento implícito dos obstáculos que estão no
caminho para transformar os verdadeiros ativos do direito internacional em
realidade política.
Colocar um fim à ocupação israelense requer uma estratégia
palestina coerente de emancipação que utilize o impressionante apoio popular
generalizado a esta causa justa em todo o mundo e ajude a transformar a
solidariedade global em políticas estatais, isolando Israel internacionalmente
e o forçando a pagar os custos de sua ocupação ilegal. Este é o desafio que os
palestinos enfrentam agora após a nakba de Gaza.
Leia mais:
Yanis Varoufakis e Loren Balhorn
Jouke Huijzer
Rula Jamal
POR: BASHIR ABU-MANNEH
TRADUÇÃO: SOFIA SCHURIG
Fonte: Revista Jacobina
TRT World
“Eles estão bombardeando casas sabendo quantas crianças realmente estavam lá dentro”
A veterana americana Josephine Guilbeau disse ao TRT World
que o exército israelense visa deliberadamente civis palestinos, apesar de ter
a tecnologia para ver quem está nos edifícios que eles escolhem para aniquilar
"They are bombing homes knowing how many children were actually inside"
— TRT World (@trtworld) March 2, 2024
American veteran Josephine Guilbeau tells TRT World that the Israeli army deliberately targets Palestinian civilians despite having the technology to see who is in the buildings they choose to annihilate pic.twitter.com/OXQ4GCLgUO
Sim, isso é bomba que não explodiu jogada por "israel" em uma escola da ONU que abriga centenas de palestinos em Gaza.
— FEPAL - Federação Árabe Palestina do Brasil (@FepalB) February 9, 2024
Olha o tamanho disso. "Bombardeios de precisão", né?
Dia 126 do genocídio palestino. pic.twitter.com/49i8c8G8Zf