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sábado, 11 de maio de 2024

A culpa não é do clima: o extremo climático no Rio Grande do Sul não é isolado


A crise ambiental tem suas origens no próprio modo com que o sistema organiza a relação entre o ser humano e a natureza; Confira artigo do Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis


Foto: Gilvan Rocha

A humanidade possui valores profundamente solidários. Ainda que o capitalismo atente contra a vida e busque espetacularizar a tragédia, com seus âncoras mais importantes destacados para fazer a cobertura em meio ao cenário de caos, há um sentimento coletivo que conecta as pessoas sem esperar um reconhecimento individual. Quando um repórter global vai entrevistar uma das médicas responsáveis pela acolhida das vítimas das enchentes, ele se refere a ela como a figura mais importante, e ela, prontamente responde que não é ela que é importante, mas todos que estão ali. Com isso, queremos reafirmar toda a solidariedade às pessoas atingidas pelas enchentes no Rio Grande do Sul, e nos reconhecer nos profissionais e voluntários que vem somando esforços para enfrentar esse momento difícil. Todos, em coletividade, são importantes para a superação da dor, da perca e do luto.

O Estado do Rio Grande do Sul possui 497 municípios. Destes, 388 foram impactados de alguma forma pelo temporal, somando 1,3 mi de pessoas atingidas em diferentes níveis, seja pelas enchentes, pela falta de energia, abrigo, água, etc. Os dados até então informam que há 90 pessoas mortas, 132 desaparecidas e 361 feridas.

Não há palavras que possam confortar as pessoas que estão vivenciando este horror cotidiano. Podemos caracterizá-las como parte dos vários refugiados climáticos ao redor do mundo, que na essência, são pobres, trabalhadores, moradores das periferias urbanas e rurais e impactadas pelo fio comum da destruição capitalista. Elas evidenciam-se em duas questões que emergem com força em nossos dias, mas não são novas, sendo a primeira parte de que “o capitalismo destrói suas principais fontes de riqueza: o ser humano e a natureza”. Karl Marx, que afirmou isso há 150 anos atrás, continua e continuará atual enquanto o modo de produzir capitalista existir, pois a destruição está em sua natureza de funcionamento.

A crise ambiental que vivenciamos vai muito além da crise climática e tem suas origens no próprio modo com que o sistema capitalista organiza a relação entre o ser humano e a natureza. A produção orientada somente pela acumulação de lucro gera um enorme desperdício dos recursos naturais, ou como preferimos denominar popularmente, os bens comuns da natureza. Afinal, quem pode ter a propriedade privada dos rios, das plantas, dos animais? Este modelo consumista e acumulador extrapola as necessidades da vida digna da humanidade, e ele agora está em uma crise profunda, uma crise estrutural do sistema capitalista.

Na verdade, os interesses pela exploração desenfreada servem apenas para deixar os ricos cada vez mais ricos, e essa escala de produção, circulação e consumo orientada na lógica da acumulação envenena o planeta com gases tóxicos, lixo, contaminação das águas e do solo, desperdício de eletricidade. Importante ressaltar que o problema não está em fechar ou não a torneira, pois enquanto alguns podem gastar milhares de metros cúbicos de água, outros nem possuem água potável para beber.

Logo, num sistema perversamente desigual, as consequências disso, sejam elas sociais como a fome, a miséria, a falta de saneamento, a violência armada, sejam elas ambientais, como a vivida nas terras gaúchas e enfrentadas também no Quênia, Tanzânia e outros países africanos nestas semanas, recaem sempre sobre os ombros dos que tudo produzem e pouco possuem: os trabalhadores e trabalhadoras que moram nos locais de maior vulnerabilidade social dentro das cidades, como as encostas e fundos de vale, pois são empurrados pela especulação imobiliária e pela ação do Estado que legitima a instalação de empresas e condomínios fechados no locais mais privilegiados.


Assim como na pandemia de Covid-19, não estamos todos no mesmo barco. Há barcos equipados com a melhor tecnologia para enfrentar os desastres ambientais causados pela ação dos grandes capitalistas, barcos cheios de botes salva-vidas. Barcos que levam as pessoas para lugares onde podem se refugiar, se aquecer e refazer suas vidas sem tantos custos”

 

E há barcos superlotados, furados, sem coletes, sem motor e esses barcos são muito mais numerosos. O que queremos dizer é que os efeitos climáticos e ambientais da crise do capitalismo recaem sobre a parcela mais pobre e mais numerosa da sociedade. Assim foi durante a Covid-19, que, por sinal, é consequência da degradação das florestas asiáticas, como aponta a pesquisa exposta no livro Pandemia e agronegócio: doenças infecciosas, capitalismo e ciência, de Rob Wallace.

Vamos à segunda questão: o que a humanidade está fazendo para solucionar este grave problema? Há uma série de iniciativas da comunidade internacional para debater a questão ambiental, desde o fim dos anos 1970, que ganha mais força e projeção nos países a partir dos anos de 1990, sobretudo com a Rio-92, ou a famosa ECO-92, que é a antecessora das Conferências das Nações Unidas sobre as mudanças climáticas, as famosas COPs (em inglês Conference of the Parties [Conferência das Partes, traduzido]) 

A COP serve, ou deveria servir, para a busca de soluções, elaboração de propostas e alternativas às mudanças climáticas, construídas entre os países junto à comunidade científica. Contudo, estes espaços se mostraram, antes de tudo, um lugar para organizar a acumulação de riqueza com a crise climática, ou “um lugar de oportunidades para lucros”. Nelas têm se desenhado ideias de transições energéticas que movimentam milhões em recursos financeiros, se arquitetam mercados de carbono e agriculturas “inteligentes” que enchem os bolsos dos causadores da crise, mas pouco agem na centralidade de debate climático, como a necessidade de adaptar as cidades e o campo para enfrentar a crise climática.

Se olharmos atentamente para as propostas elaboradas nestes eventos internacionais veremos que elas não passam, no bom português, de uma tentativa de “tapar o sol com a peneira”, pois se tratam de formas lucrativas de enfrentar o problema e não de mudança paradigmática no modo de uso e ocupação dos territórios e dos bens comuns, uma vez que não se propõe uma alternativa à forma destrutiva de se relacionar com a natureza mas sim a mudança da forma de destruir e de poluir. Troca-se a emissão de carbono pela contaminação da mineração e a produção de imensas quantidade de lixo resultante da produção de energias “limpas”, no médio prazo.

Situações dramáticas e catastróficas como a dos últimos dias no Rio Grande do Sul nos alertam para a incapacidade de mecanismos como a ONU de propor alternativas concretas, mas eles não são os únicos a lidar com a questão. Há diversos países do chamado Sul Global que vem buscando alternativas. A Etiópia, por exemplo, plantou 350 milhões de árvores em 12 horas, esforço combinado entre ação do Estado e da população para atuar diretamente sobre a situação de seca causada pela vegetação reduzida a 4% do território nacional. A solução para a crise ambiental são os povos que a fazem, com o compromisso do Estado ao lado dos mais vulnerabilizados.


Nos anos 2000, a Etiópia tinha apenas 4% de cobertura florestal. Foto: BBC News Brasil

No caso brasileiro, a tendência é de cada vez mais vivenciarmos esses eventos climáticos extremos, e é necessário atuar na complexidade que a situação exige. Adaptação territorial no campo e nas cidades, previsibilidade e conscientização da população sobre os alertas, fundos que subsidiem a reconstrução da vida das famílias e pessoas atingidas, e principalmente a reorganização de nosso modelo agrícola. É necessário, por exemplo, que as universidades com seus estudos geomorfológicos, climáticos e demais ferramentas deem subsídios para o planejamento territorial junto com as populações urbanas e rurais, papel este que deveria ser do governador, no caso em questão, e que foi negligenciado.

Há o fenômeno de ordem natural que explica a situação climática na região Sul do país neste momento, que se trata da circulação geral da atmosfera. Um dos fatores que contribuíram para que as chuvas ficassem concentradas no Rio Grande do Sul foi o sistema de alta pressão atmosférica na região Centro-Sul, que impediu a frente fria que chegou nos últimos dias de avançar sobre o continente e espalhar as chuvas, reduzindo possibilidade de chuvas concentradas. Mas, existem os fatores de influência direta na dinâmica atmosférica, como o forte calor que emana desta região, explicado pelas queimadas e do desmatamento, sobretudo no Cerrado para plantio de commodities. A terra nua, sem vegetação, esquenta e retém calor, o que contribui para  que a frente fria, que forma a chuva, possa avançar para outras regiões. 

Exemplo disso foi o legado de Ricardo Salles, que durante seu mandato de ministro do meio ambiente no governo de Bolsonaro, editou mais de 300 atos oficiais que flexibilizaram os crimes ambientais para o agronegócio, colocando em risco a política ambiental brasileira, conforme evidenciou informações levantadas pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc).

Ou seja, temos toda a tragédia bolsonarista, o Congresso e sua enorme bancada de deputados federais da “bala e do boi” como responsáveis diretos desta situação. Estamos literalmente vivenciando as consequências de “passar a boiada” promovida por Ricardo Salles, Luciano Zucco e todo o time de grileiros, latifundiários, jagunços que promoveram a destruição ambiental no governo Bolsonaro, marcado por nuvens de fuligem, garimpo ilegal, dias de queimadas intensas, entre tantos outros episódios. Este mesmo Congresso impõe um teto de gastos que impede que o recurso chegue de acordo com a necessidade de atendimento aos atingidos e atingidas no Rio Grande do Sul e que fecharam os olhos para o colapso da Lagoa Mundaú como resultado da mineração da Braskem, em Maceió e que deslocou forçadamente mais de 60 mil famílias.


Não tem como desvincular a tragédia ambiental da questão fundiária brasileira, tampouco fazermos lutas em defesa da natureza sem falar de reforma agrária, revogação do marco temporal, reconhecimento e regularização das terras de povos e comunidades tradicionais. Não há possibilidade de alternativa sem começar por apontar os verdadeiros culpados pela crise climática, pois a luta ambiental está no motor da luta de classes, e para determos as tragédias e preservar as vidas, devemos parar o sistema capitalista e construir um outro modelo de sociedade, em nome dos que se foram, em nome dos que estão vivos, em nome dos que virão, a natureza e a humanidade não aguentam mais o capitalismo“.

 

Nessa disputa de narrativas, que coloca a espetacularização de um lado, e os fatores determinantes da crise climática de outro, é fundamental apontar para o elemento da solidariedade que se renova a cada situação de vulnerabilidade social vivenciada. Apostamos na prática e na reflexão sobre a solidariedade de classe nesse momento de atenção com os trabalhadores e trabalhadoras no Sul. Não se trata de campanha de arrecadação, se trata de partilha e de cuidado coletivo. Essa é, por exemplo, a preocupação de instalar Cozinhas Solidárias e Comunitárias e de destinação de parte da produção de alimentos produzidos pelas cooperativas do MST em outros estados que estão sendo enviados para contribuir na recuperação das famílias. 

É por esta solidariedade que acreditamos que nem tudo está perdido, e com isso avançamos para a questão: o que é possível fazer diante deste cenário? Um primeiro elemento se diz à luta que os países do Sul Global vem fazendo, em partes nos espaços internacionais de discussão da dita governança climática global, que é exigir que os países do centro do capitalismo financiem as mudanças necessárias para enfrentar a crise ambiental.

Todavia, falta qualificar essa luta colocando na ordem do dia o financiamento para a adaptação, que é o patinho feio das metas e acordos mundiais do clima, pois fica sempre escondida enquanto as ações de mitigação ganham toda a atenção por fazerem parte das estratégias de lucro de grandes conglomerados como a Tesla, que ao mitigar a emissão de CO2 com seus carros elétricos, lucra bilhões com a destruição de florestas e rios para extrair os minérios necessários para isso.

É urgente pensarmos a adaptação às mudanças climáticas, e lutar por investimentos suficientes para tanto, pensar em uma cidade com planejamento, inclusiva, que atenda aos interesses populares e eficiente e uma agricultura camponesa de base familiar, agroecológica, adaptada às condições do clima, do bioma e com subsídios estatais. Isso se faz com planejamento urbano e políticas eficientes de moradia que possibilitem ao povo ocupar espaços que não estejam sujeitos às consequências de eventos climáticos extremos, e por outro lado, pensar uma produção agrícola que crie condições de se produzir na adversidade do clima, coisa que já é feito através dos Sistemas Agroflorestais.

A questão ambiental deve ser convertida em campo de batalha para que consigamos avançar na construção de soluções verdadeiramente efetivas, que resolvam os problemas ambientais e sociais gerados pelo capitalismo. Como afirmam nossos parceiros das periferias: “nada sobre nós, sem nós!”. Nós seguiremos fazendo o cordão da solidariedade e estendemos nossas mãos para alcançar um outro mundo, construído braço a braço. Nossos sentimentos de indignação com a tragédia e de solidariedade com as gaúchas e os gaúchos. 

*Editado por Fernanda Alcântara


PAULO MIKLOS DOS TITÃS MANIFESTA SOLIDARIEDADE AO RIO GRANDE DO SUL O ator, apresentador, diretor e roteirista ressalta a importância da solidariedade neste momento delicado que nossos companheiros e companheiras do Rio Grande do Sul enfrentam. #SOSRioGrandeDoSul



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 Por Plano Nacional “Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis”

Fonte: Página do MST


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sábado, 21 de agosto de 2021

Governo brasileiro promove transição energética para muito pior


Anúncio de programa que incentiva uso de carvão mineral pelo Ministério de Minas e Energia significa retrocesso brutal em tempos de crise climática


Ativistas do Greenpeace Brasil pedindo que o governo brasileiro se comprometa com o fim das usinas a carvão, em frente à termelétrica de Candiota (RS), em 2018. © Marlon Marinho / Caio Paganotti / Greenpeace

No mesmo dia (09/08) em que foi lançado o 6º relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), que alertou o mundo sobre a urgência de ações concretas e imediatas para conter as mudanças climáticas e de que é inequívoca a influência das ações humanas no aquecimento global – especialmente com a queima de combustíveis fósseis, o governo brasileiro publicou o detalhamento do Programa para Uso Sustentável do Carvão Mineral Nacional, que prevê o fomento do setor de carvão mineral. 

A proposta promove uma política de estímulo à aquisição de equipamentos de mineração e pesquisa para o setor, além de vantagens fiscais para atrair até 20 bilhões de reais em investimentos nos próximos 10 anos para a fonte de energia que mais polui o mundo.

Segundo o IPCC, a concentração de CO2 na atmosfera já é a mais alta dos últimos 2 milhões de anos. É nesse contexto que o governo do Brasil, país que não depende do carvão para geração de eletricidade e que tem entre as melhores condições de geração de energia limpa e renovável do planeta, propõe um programa de incentivo ao carvão, enquanto vários países do mundo já buscam formas de se livrar desse mal.

Em 2017, 19 países que dependem mais do carvão do que nós, anunciaram uma aliança pelo encerramento de seus programas a carvão até 2030, entre eles Reino Unido, França, Canadá, Portugal e México. Em 2018 foi a vez do Chile, em que o mineral responde por 35% da geração elétrica. Este período serve para que os países desenvolvam estratégias para promover uma transição energética justa, ou seja, um plano de ação para promover outras fontes de renda às populações das regiões carboníferas, inclusive com o fomento à geração de energias renováveis nessas localidades. 

É este debate que deveria estar na mesa, em especial nas cidades do sul do Brasil onde hoje está a maior parte das usinas de geração termelétrica a carvão. No entanto, ao invés de olhar para os diversos potenciais e o futuro dessas comunidades, investindo na transição justa, o governo insiste em um modelo fadado ao fracasso, tanto financeiro como climático. E os impactos quem sente é o povo brasileiro, no bolso e na vida.

Fonte: Greenpace Brasil


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