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segunda-feira, 3 de maio de 2021

Parlamento de Rondônia reduz em 90% reserva Jaci-Paraná em prol da pecuária ilegal


Redução recorde de áreas de conservação premia invasores e ameaça biodiversidade


Da órbita terrestre, é possível ver a barreira contra o desmatamento exercida pelas unidades de conservação - Aqua/Nasa/Reprodução

Dias antes da abertura da Cúpula do Clima, quando aumentaria a pressão internacional sobre o governo de Jair Bolsonaro (sem partido), a Assembleia Legislativa de Rondônia “passou a boiada” e promoveu a maior redução de unidades de conservação já aprovada por um parlamento estadual.

Os deputados decidiram na terça-feira (20) praticamente extinguir a Reserva Extrativista (Resex) Jaci-Paraná, uma das mais desmatadas do país, em benefício da pecuária ilegal. Dos 193 mil hectares, sobrarão apenas 22 mil, pouco mais de 10% do território original.

Já o Parque Estadual de Guajará-Mirim perderá 55 mil dos 216 mil hectares e terá a própria sede excluída da área de conservação. A área total desafetada ultrapassa os 200 mil hectares, equivalente a quase 300 mil campos de futebol.

Caso seja sancionada pelo governador bolsonarista coronel Marcos Rocha (sem partido), o projeto vai permitir a legalização de terras griladas, além de comprometer seringueiros, extrativistas, povos em isolamento e indígenas cuja população ainda se recupera de ataques inciados na época da extração da borracha.

O presidente da Ação Ecológica Guaporé – Ecoporé, organização com 33 anos de atuação em prol da conservação de áreas protegidas em Rondônia, classifica a medida como um estímulo a crimes ambientais.

“Mesmo que as invasões sejam de 15 ou 20 anos atrás, o recado é que em algum momento esses invasores serão regularizados. Essa é a mensagem que está sendo passada para esses grupos organizados que invadem áreas de conservação e terras indígenas”, alerta Paulo Bonavigo.


Povos ameaçados

Da órbita terrestre, é possível visualizar a olho nu uma imensa massa de floresta amazônica preservada a oeste de Rondônia. Cercados pelo desmatamento, moradores da imensidão verde, cada vez mais encolhida, articulam-se para sobreviver.

É o caso dos karipuna, autodenominados ahé (“gente verdadeira”) e quase exterminados no século passado por epidemias e conflitos. Segundo o Instituto Sócio Ambiental (ISA), em 2004 restavam 14 deles.

Por segurança, Adriano Karipuna, ativista e liderança do povo, prefere não divulgar em quantos são atualmente. Especialmente agora, com a iminência da desafetação – perda de vínculo jurídico - das unidades de conservação que formam um “cinturão” de proteção em volta da Terra Indígena (TI) Karipuna, homologada em 1998 e alvo de violações constantes.

Adriano Karipuna viajou o mundo denunciando o genocídio contra seu povo / Guilherme Cavalli/Cimi/Reprodução

“Estamos muitos preocupados porque as Unidades de Conservação e a Reserva Extrativista estão todas no entorno da TI, em um raio de 10 km. Para os invasores, essa distância é fichinha, é a coisa mais fácil do mundo adentrar na terra Indigena”, afirma Adriano.

“Nós estamos na luta contra esse projeto genocida dos povos indígenas. Vai haver uma facilidade imensa para aumentar a invasão nos territórios indígenas e loteamentos, como já vinha ocorrendo”, preocupa-se.

A desafetação ameaça também indígenas em situação de isolamento voluntário.“Eles são nômades, não têm as fronteiras definidas, então transitam com muita frequência na área que envolve o parque Guajará-Mirim e a Terra Indígena Uru-eu-wau-wau”, explica Edjales Benício de Brito, da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé.

“As Unidades de Conservação (UCs), junto com as terras indígenas, formam verdadeiros corredores etnoambientais. No momento que você desafeta uma unidade que integra um corredor ecológico, você retira uma barreira de proteção, você impacta tanto esses povos, como a biodiveridade”, completa.

Divida entre os municípios de Porto Velho, Buritis e Nova Mamoré, a TI Karipuna é alvo constante da exploração ilegal de madeira. Conforme Adriano, madeireiras localizadas nos distritos de União de Bandeirantes, Jacinópolis e Nova Dimensão funcionam a todo vapor com matéria prima retirada da TI.

“Nesses municípios há um surto muito grande de serrarias que roubam madeira do território Karipuna. Por aí a gente vê que toda essa madeira que está abastecendo esses três distritos está saindo da Terra Indigena, da Unidade de Conservação Jaci Paraná e de parques naturais”, conclui.


Grilagem premiada

“A desafetação da Reserva Extrativista Jaci-Paraná automaticamente afeta também a Terra Indígena que está do lado”, explica Joadir Luiz de Lima, assessor da Organização dos Seringueiros de Rondônia (OSR), solidarizando-se com o povo Karipuna.

O geógrafo relembra um momento de calmaria na história da Jaci-Paraná, criada em 1996, quando mais de 50 famílias de seringueiros já viviam na beira do rio Jaci, com base na pesca e extração de castanha e borracha.

Principalmente a partir de 2005, um exército de grileiros foi tomando a área protegida, expulsando de forma violenta a população local, hoje substituída por 120 mil cabeças de gado, conforme apontam lideranças locais.

“Agora não tem nenhuma dessas famílias lá, o impacto foi muito grande. Em 96 não tinha invasão. E o governo usa justamente essas invasões como desculpa para desafetar a área”, diz o assessor da OSR.

“Existem duas reservas do lado de Jaci que já estão todas devastadas, que juntas somam 140 mil hectares. Estão numa situação pior que a dela”, completa.


Legislando em causa própria

Na Assembleia Legislativa, os danos irreversíveis à sociobiodiversidade brasileira foram justificados por um fim aparentemente nobre: a proteção a pequenos agricultores que ocupam as áreas preservadas.

“Nós reconhecemos que o esteio da economia de Rondônia é o homem e a mulher da roça, o povo da mão calejada, e é pra esses que nós devemos a obrigação de apoiar em todas as ações necessárias (...)”, bradou o líder do governo, deputado Luizinho Goebel (PV).

“Na verdade esse discurso é mentiroso porque a grande maioria não é de pequenos produtores. Existem, de fato, produtores que vivem daquela terra, mas são minoria”, rebate Paulo Bonavigo, da Ecoporé.

Ele atuou como coordenador das unidades de conservação de Rondônia pela Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental de Rondônia (Sedam) entre 2011 e 2013 e conhece de perto a Resex Jaci-Paraná.

“Quando eu andava por lá, o pessoal falava: ‘essa propriedade aqui é de um senador, essa de um deputado, essa é do prefeito, essa aqui é o dono da casa agropecuária”, narra.

“Tem gente grande, muito laranja. É difícil você provar quem é o dono da terra. Mas uma reserva que tem mais de 100 mil cabeças de gado em área de invasão, não é de pequeno produtor rural”, diz Bonavigo.

Na Assembleia Legislativa, durante a sessão que aprovou o Projeto de Lei Complementar em duas votações, o deputado Ezequiel Neiva (PTB) buscou conscientizar os colegas da importância de agilizar a votação.

“Uma das últimas oportunidades [de aprovar o projeto] estamos tendo hoje, haja vista que em muitos poucos dias acontecerá a grande cúpula do clima lá nos Estados Unidos", afirmou no plenário.

Mapas revelam as invasões que expulsaram violentamente seringueiros da Reserva Extrativista Jaci-Paraná / OSR/Divulgação

Contrapartida contestada

Ciente dos impactos negativos, os parlamentares incluíram na proposta a criação de seis Unidades de Conservação (UCs) que, juntas, somam 120 mil hectares. A contrapartida, no entanto, pode não surtir efeito.

Segundo a Ecoporé, algumas das UCs já haviam sido formalmente criadas no governo anterior, mas a implementação foi travada por contestações judiciais.

“A inclusão dessas unidades acabou sendo moeda de barganha em troca das áreas invadidas da Jaci-Paraná e do Parque Estadual de Guajará-Mirim. Barganharam unidades que já haviam sido criadas por eles mesmos”, analisa o presidente da Ong.

O Ministério Público do Estado de Rondônia (MP-RO) encaminhou à Procuradoria-Geral de Justiça um pedido de Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a alteração dos limites das áreas de conservação.

Para o MP-RO, os espaços territoriais protegidos não podem ser reduzidos por legisladores infraconstitucionais, como os deputados de Rondônia.

Entidades que representam extrativistas e indígenas também se articulam para barrar judicialmente a iniciativa.

“A gente teme que esses ataques estejam só começando. Nós temos outras florestas estaduais invadidas e outras unidades de conservação que a gente já recebeu denúncia que estão sendo invadidas”, prevê o presidente da Ecoporé.

Fonte: Brasil de Fato


Greenpeace Brasil

Amazônia Explicada - A Amazônia pode acabar algum dia? #4

A floresta amazônica é tão grandiosa, que é difícil imaginar o mundo sem ela. Mas estudos vêm mostrando que se o desmatamento atingir um ponto limite, é possível que ela nunca mais consiga se recuperar por completo, o que mudaria o planeta como conhecemos.

Assista ao VÍDEO


sexta-feira, 19 de março de 2021

Bancada ruralista divulga informações falsas em defesa da “regularização fundiária”


Para o MPF, objetivo é anistiar crimes de grilagem, invasões de terras públicas e desmatamentos



 FPA retoma campanha para aprovar projeto prioritário do governo

A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), nome oficial da bancada ruralista, retomou neste mês uma campanha em redes sociais com informações falsas para defender o projeto de “regularização” fundiária do governo Bolsonaro.

O Projeto de Lei 2633/2020 foi apontado como prioritário em uma lista apresentada em fevereiro aos novos presidentes da Câmara e do Senado.

Para o Ministério Público Federal, o objetivo do governo – inicialmente com a MP 910, barrada em 2020 – é anistiar crimes de grilagem, invasões de terras públicas e desmatamentos, favorecendo organizações criminosas.

Estudo da pesquisadora Brenda Brito, do Imazon, estima que a proposta de mudança nas regras fundiárias ameaça pelo menos 19,6 milhões de hectares de áreas federais não destinadas na Amazônia, que podem ser ocupados e desmatados na expectativa de regularização.

Reprodução Twitter @fpagropecuaria

Em postagem no dia 11/03, a FPA afirma que “sem regularização fundiária não há responsáveis por crimes ambientais”, o que é falso. Cerca de dois terços das áreas desmatadas têm ocupante reconhecido ou declarado. Ou seja, ao contrário do que afirma a FPA, em grande parte dos casos o governo sabe quem é o dono ou quem está reivindicando a posse de uma área.

Segundo dados do Mapbiomas, 77% da área desmatada no Brasil em 2019 – 83% do desmatamento está na Amazônia – ocorre em áreas que se sobrepõem a pelo menos um Cadastro Ambiental Rural (CAR).

Bastaria aplicar as punições. No entanto, isso não tem ocorrido. As multas do Ibama por infrações contra a flora na Amazônia caíram pela metade (50,2%) em 2020 na comparação com 2018, último ano do governo Temer, apesar da alta recorde do desmatamento no período. Isso ocorreu mesmo com a informação disponível de quem são os responsáveis pelas áreas onde foi registrada a maior parte do desmatamento.

Além disso, a legislação atual já permite titular terra pública ocupada até 2011.

No dia 13/03, a FPA voltou a afirmar que é “impossível” responsabilizar infratores por crimes ambientais em terra não regularizada, sob o argumento de que “terra sem destinação gera grilagem”. Em resposta ao post, o professor da UFMG Raoni Rajão alertou que “mudar a lei para legalizar invasões até então criminosas só piora o problema”. Ele lembrou que o CAR já possui nome e CPF de 7 milhões de imóveis, inclusive os sem título, mas governo não usa esse dado.

Ao contrário do que afirma a FPA, não é preciso saber quem é o proprietário da terra para conter o dano ambiental. Sem alterar a legislação fundiária, o Brasil reduziu o desmatamento na Amazônia em 73% entre 2004 e 2009.

Em post no dia 10/03, a FPA afirma que “queimadas ilegais acontecem com muito mais frequência em terras sem regularização fundiária”. “Uma área pública ocupada, mas não regularizada, não tem ninguém para ser legalmente responsabilizado”, alega a entidade, atribuindo as informações ao Incra: “134% mais queimadas em áreas sem regularização fundiária”.

No entanto, estudo de Benedict Probst (Universidade de Cambridge) e outros pesquisadores publicado em 2020 na Nature aponta que proprietários de áreas tituladas tendem a continuar desmatando. O estudo analisou 10 mil imóveis titulados na Amazônia entre 2011 e 2016 e mostrou que pequenos e médios proprietários tendem a desmatar mais as suas áreas nos anos seguintes à titulação, em comparação a imóveis ainda não titulados.

De modo similar, Gerd Sparovek, da USP, e colaboradores mostraram que, enquanto as áreas não destinadas apresentavam uma cobertura florestal de 77% em 2018, as áreas tituladas como imóveis particulares sofreram um rápido processo de desmatamento, reduzindo a área florestal de 68% para 55%, entre 1999 e 2018. “Auditorias realizadas pelo Tribunal de Contas da União em 2020 sugerem que esse resultado é consequência das falhas na fiscalização do Incra”, aponta Rajão, da UFMG. Segundo ele, “pode-se inferir que a ênfase do atual governo na titulação de terras, sem os devidos controles ambientais, juntamente com a paralisação do processo de criação de unidades de conservação e demarcação de terras indígenas, têm agido como importantes vetores do desmatamento na Amazônia”.

Em outra Nota Técnica, pesquisadores da USP e da UFMG mostram que as áreas não destinadas e as áreas públicas destinadas (como Unidades de Conservação e Terras Indígenas) possuem taxas de desmatamento mais baixas, mantendo mais de 80% da cobertura vegetal. “Por outro lado, nos imóveis rurais autodeclarados (inscritos no CAR) e áreas privadas destinadas (beneficiadas pela regularização) observam-se taxas de desmatamento altas, chegando a perder até 3% da área de vegetação nativa em um ano. Além disso, essas áreas possuem menos de 60% de sua área como vegetação nativa, valor bem inferior à reserva legal, que deve ser de 80% nos imóveis rurais no bioma Amazônia.”

O estudo aponta que, entre os imóveis que são alvo da proposta de regularização fundiária apresentada pelo governo Bolsonaro, predomina entre os pequenos o padrão de nenhum déficit de Área de Preservação Permanente e/ou Reserva Legal, o que ocorre em 63% dos 107.466 imóveis em glebas federais.

Já nos médios e grandes imóveis o padrão se inverte, e a existência de algum déficit, isso é, o não cumprimento do Código Florestal, passa a ser o padrão predominante, atingindo 74% dos imóveis, mostram os pesquisadores. “Esses resultados, juntamente com a análise da taxa de desmatamento, indicam que o processo de regularização fundiária não garante o cumprimento da legislação florestal, principalmente entre os médios e grandes proprietários.”

Em outro post, no dia 12/03, a FPA afirma que “com o sensoriamento remoto será possível comprovar se há desmatamento ilegal, queimadas e até a confirmação do cultivo efetivo por parte do proprietário da terra”.

O monitoramento já é feito hoje, seja por órgãos do governo, como o Inpe, seja por iniciativas da sociedade civil, como o projeto MapBiomas, que já produziu mapas de toda a mudança de cobertura do solo no Brasil de 1985 até 2019.

A campanha da FPA repete desinformação difundida pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, em vídeo de outubro de 2020, que desmentimos aqui.

Fonte: Fakebook.eco


Mídia NINJA

Amazônia na mira dos desmatadores! Querem legalizar o roubo de terras públicas - 29 de abr. de 2020

Lembra, no ano passado, quando o dia virou noite na cidade de São Paulo? Este acontecimento tem uma ligação direta com a grilagem de terras e as queimadas em toda a Amazônia Legal. A qualquer momento, deputados e senadores podem aprovar a MP 910. A atriz @dirapaes ajuda a lembrar os riscos que essa medida representa.

Conhecida como MP da Grilagem, a proposta do governo Bolsonaro vai premiar grileiros (ladrões de terras públicas) que desmatam e tocam fogo na Amazônia e no Cerrado. Segundo organizações ambientalistas e especialistas na área, a proposta vai contra os interesse da sociedade brasileira e beneficia criminosos que invadiram e desmataram terras públicas, deixando de fora o trabalhador honesto que há anos produz sem destruir a Amazônia.

Assista ao VÍDEO



No Twitter


 

terça-feira, 2 de março de 2021

Investigação revela terras protegidas da Amazônia à venda no Facebook


Uma investigação da BBC encontrou na plataforma dezenas de anúncios em que vendedores negociam pedaços da floresta ou áreas recém-desmatadas, que eles não possuem, por valores que chegam à casa dos milhões de reais.


Madeireiro derruba árvore em área protegida nos arredores de Porto Velho; Rondônia já perdeu um terço de sua mata nativa

 
Pessoas que invadem e desmatam ilegalmente trechos da Floresta Amazônica estão anunciando as áreas no Facebook em busca de compradores.

Assista aqui ao documentário exclusivo da BBC


Há áreas à venda até mesmo dentro de unidades de conservação e de terras indígenas. Segundo a lei, é proibido vender áreas que sejam parte de terras indígenas ou unidades de conservação. São áreas de domínio público que se destinam exclusivamente a populações tradicionais.

A investigação deu origem ao documentário Amazônia à venda: o mercado ilegal de áreas protegidas no Facebook, disponível a partir de meio-dia (hora de Brasília) desta sexta-feira (26/02) no canal da BBC News Brasil no YouTube e transmitido mundialmente pela BBC.

O documentário mostra que o mercado ilegal de terras na Amazônia está aquecido com a perspectiva de que o Congresso anistie invasões recentes e permita que invasores obtenham os títulos das áreas.

Atualmente, só áreas públicas desmatadas até 2014 são passíveis de regularização, mas a bancada ruralista e o governo federal articulam um Projeto de Lei que prorrogaria o prazo.

O documentário revela também como a grilagem — ocupação ilegal de terras públicas — avança na Amazônia brasileira.

É um padrão que se repete. Grupos de grileiros se organizam em associações com CNPJ, contratam advogados, mantêm laços com políticos e pressionam órgãos públicos a lhes conceder as áreas invadidas.

Como eles não detêm a propriedade oficial da terra, muitos invasores usam um registro oficial, o Cadastro Ambiental Rural (CAR), para reivindicar as áreas griladas e colocá-las à venda, tentando dar um aspecto de legalidade às transações.

O problema é que o CAR não é prova de direito à propriedade sobre uma área. E, por ser autodeclaratório, em tese, qualquer pessoa pode registrar qualquer parte do território nacional como se fosse sua dona e usar isso em uma futura batalha jurídica pela posse da terra.

Anúncio oferece áreas de mata dentro da Floresta Nacional do Aripuanã, no Amazonas; florestas nacionais são públicas e se destinam a comunidades tradicionais


Desmatamento em alta

A investigação mostra ainda estratégias que os vendedores usam para driblar a fiscalização e evitar multas, como dificultar o acesso aos terrenos grilados e manter documentos em nome de terceiros.

O uso do Facebook, uma plataforma pública, para a venda de áreas de floresta revela ainda a sensação de impunidade expressa pelos entrevistados na investigação.

O alcance irrestrito dos anúncios na plataforma ameaça agravar o desmatamento na Amazônia, em alta desde a posse do presidente Jair Bolsonaro, em 2019. Entre agosto de 2019 e julho de 2020, o bioma perdeu 11.088 quilômetros quadrados, o maior índice desde 2008.

A BBC identificou trechos desmatados ilegalmente no ano passado à venda na rede social.

Os anúncios estão na seção "Venda de imóveis residenciais" do MarketPlace, espaço do Facebook aberto a todos os usuários.

Outdoor dentro de serraria em Ariquemes (RO); Jair Bolsonaro recebeu 72% dos votos no segundo turno em Rondônia


Após vários meses de pesquisa, foram mapeadas dezenas de anúncios com aparentes ilegalidades em diversos Estados amazônicos.

Muitos vendedores admitem nos próprios anúncios que desmataram as áreas e não têm títulos que comprovem a propriedade dos lotes.

Desmatar floresta sem autorização é crime com pena de até quatro anos de prisão e multa. Já vender terras sem possuir títulos que comprovem a propriedade pode ser enquadrado como estelionato, segundo advogados entrevistados. O crime tem pena de até cinco anos de prisão e multa.

Já compradores podem ter a posse invalidada pela Justiça ou ser enquadrados no crime de invasão de terras públicas, caso se comprove que sabiam que as áreas eram públicas.

Em nota, o Facebook afirmou que usuários têm de seguir as leis ao fazer negócios pela plataforma e que está à disposição das autoridades para tratar das questões levantadas pela investigação.


Câmera escondida

Para comprovar que as terras anunciadas de fato existiam e de que os anúncios não eram simplesmente parte de um golpe virtual, a equipe da BBC se encontrou com quatro vendedores em Rondônia, passando-se pela assessoria de um comprador fictício.

Rondônia é um dos Estados com mais anúncios do tipo no Facebook. Quase completamente coberto pela Floresta Amazônica até 1980, já perdeu cerca de um terço de suas matas nativas.

As reuniões foram filmadas com câmera escondida. Vários vendedores elogiaram Bolsonaro nas gravações e manifestaram a expectativa de regularizar as áreas invadidas durante seu governo.

Pastagem nos arredores de Monte Negro (RO); há oito cabeças de gado para cada humano em Rondônia

Entre as áreas à venda que foram identificadas, há um terreno dentro da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau (RO), dois na Floresta Nacional do Aripuanã (AM) e um na Reserva Extrativista Angelim (RO). As áreas foram localizadas cruzando-se as coordenadas geográficas com mapas e imagens de satélite. 


Floresta 'pronta para a agricultura'

As duas áreas à venda na Floresta Nacional do Aripuanã somam 1.660 hectares (o equivalente 1.660 campos de futebol) e foram oferecidas ao custo de R$ 3,2 milhões no total.

Corretor Alcimar Araújo da Silva, que postou anúncio de áreas dentro de floresta nacional, durante filmagem com câmera escondida em seu escritório em Porto Velho


Os lotes foram anunciados no Facebook por um corretor de Porto Velho, Alcimar Araújo da Silva, que tem um escritório no centro da cidade. O post mostra o número de registro de um dos lotes no Cadastro Ambiental Rural (CAR).

Uma consulta no site do CAR mostra que a área está 100% dentro da Floresta Nacional do Aripuanã e tem 98,6% de seu território coberto por mata nativa. O anúncio diz, porém, que a área está "pronta para a agricultura".

Quando indagado sobre os documentos dos lotes, em encontro filmado com câmera escondida, o corretor disse que só poderia cedê-los após o envio de uma carta de intenção de compra. Ele não quis revelar a identidade do pretenso dono das áreas.

O corretor sugeriu ainda que seria possível desmatar até 50% de cada lote — o que constituiria irregularidade mesmo que as áreas fossem de propriedade particular. Segundo o Código Florestal, donos de terras na Amazônia devem preservar pelo menos 80% de suas propriedades.

Questionado sobre restrições ambientais que hoje limitam atividades agropecuárias na Amazônia, ele disse acreditar que elas serão suprimidas pelo atual governo.

"O empecilho do meio ambiente, o negócio dos índios, o Bolsonaro vai passar por cima, e aí a tendência é asfaltar até Manaus", afirmou.

Terra Indígena Uru Eu Wau Wau é uma das áreas protegidas que tiveram pedaços anunciados ilegalmente no Facebook; líder Bitaté (à esq.) cobrou providências

Alguns meses após o encontro, a BBC contatou o corretor para informá-lo de que ele havia sido gravado e pedir esclarecimentos sobre suas colocações, mas ele não se manifestou.


Terra indígena à venda

Outro anúncio encontrado no Facebook oferece um lote de 21 alqueires (o equivalente a 57 campos de futebol) "todo em mata, com toda madeira ainda para tirar" no município de Buritis (RO), por R$ 126 mil.

Com base em coordenadas geográficas citadas no anúncio, a BBC descobriu que a área está dentro da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau, que abriga o maior trecho de floresta preservada em Rondônia.

Órgãos do governo já contaram 209 habitantes indígenas no território, mas a população total é maior, pois há registro de cinco grupos isolados na área, com número desconhecido de integrantes.

Em encontro gravado com câmera escondida, o pretenso proprietário do lote à venda, Alvim Souza Alves, admitiu que a área fica dentro da terra indígena, mas disse integrar um grupo que busca regularizar a ocupação com autoridades em Brasília. Ele também disse esperar que o caso seja solucionado pelo governo Bolsonaro.

Imagens de satélite mostram avanço do desmatamento em Rondônia entre 1985 (à esq.) e 2020; Estado já perdeu um terço da cobertura original

"Vou te falar a verdade: se não liberar com o Bolsonaro lá, não libera mais, não", afirmou.

Porém, segundo advogados entrevistados, qualquer tentativa de reduzir a terra indígena provavelmente seria judicializada e dependeria da chancela do Supremo Tribunal Federal (STF).

Alves afirmou que a inclusão de seu lote na terra indígena se deveu a um "erro de digitação" quando o território foi demarcado, nos anos 1990 — posição contestada pela Funai e pelos indígenas.

Afirmou ainda que não há indígenas em seu terreno, embora eles circulem pela região.

Contatado pela BBC após o encontro filmado com câmera escondida, Alves não se manifestou.


'Desmatar nossas vidas'

A BBC mostrou o anúncio de Alves a Bitate Uru Eu Wau Wau, presidente da principal associação da terra indígena.

"Isso é uma falta de respeito", ele afirmou. Bitate cobrou o Facebook e o governo a tomarem providências.

Segundo o líder indígena, o lote à venda fica numa área usada pela comunidade para caçar, pescar e coletar frutos.

Toras de árvores amazônicas prontas para serem vendidas em depósito próximo ao rio Jamari, em Rondônia

"Eu não conheço essas pessoas. Acho que o objetivo delas é desmatar a terra indígena, desmatar o que está de pé. Desmatar as nossas vidas, vamos dizer assim."


Laços com políticos

Alvim Alves diz ter comprado o lote de um membro da Associação Curupira, formada por outros postulantes a pedaços da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau.

Em 2017, uma operação da Polícia Federal prendeu 14 pessoas acusadas de invadir o território — entre as quais o então coordenador da associação, Nelson Bispo dos Santos.

No encontro com a reportagem da BBC gravado com câmera escondida, Alves apresentou outro pretenso proprietário de lotes na terra indígena, Edinário da Silva Batista.

Batista citou dois políticos que, segundo ele, têm apoiado as demandas do grupo: o ex-senador e ex-governador de Rondônia Ivo Cassol (PP-RO) e o deputado federal Coronel Chrisóstomo (PSL-RO).

Alvim Alves tentou vender pelo Facebook um lote no interior da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau

Segundo Batista, na véspera da eleição de 2018, o então senador Cassol prometeu ao grupo que os "assentaria" na terra indígena e brigaria para regularizá-los.

"Ivo Cassol, se tivesse ganhado, ele disse: 'Eu assento vocês lá e depois a gente vai brigando com usucapião'. Mas aí ele teve aquele processo e não pode sair (candidato)", disse Batista.

O processo a que Batista se referiu foi a condenação de Cassol por fraude em licitação quando ele era prefeito em Rolim de Moura, entre 1998 e 2002, e que o impediu de concorrer à reeleição ao Senado, em 2018.

Em março de 2018, em reunião da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária do Senado, Cassol pediu ao então presidente da Funai, Franklimberg Ribeiro de Freitas, que intercedesse em favor de ocupantes da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau e endossou a tese de que teria havido um "erro de digitação" na demarcação da área.

Já o presidente da Funai disse que a terra indígena estava sendo invadida por um grupo "irregular, (que) inclusive está praticando grilagem", e questionou a tese sobre a falha na demarcação. "Se houve o erro, por que não se recorreu na época?", indagou.

Franklimberg deixou a Presidência da Funai em junho de 2019.

Questionado pela BBC News Brasil sobre o episódio, Cassol disse que nunca teve contato com o grupo de Batista e nunca apoiou "grileiros de terras".

Cassol disse que, na audiência no Senado com o presidente da Funai, não estava tratando de invasores, mas sim de 105 famílias assentadas pelo Incra na região antes da demarcação da terra indígena. "Cabia a mim como senador buscar o entendimento entre as partes dentro da lei."

Também apontado por Batista como um aliado, o deputado federal Coronel Chrisóstomo disse à BBC que ajudou o grupo a se reunir com o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), o Ministério do Meio Ambiente e a Funai, mas não sabia que eles haviam invadido uma terra indígena.

Deputado federal Coronel Chrisóstomo foi apontado por grupo de grileiros como um de seus principais apoiadores em Brasília

"Eles não me contaram. Se eles invadiram, não têm mais o meu apoio", ele afirmou à BBC em seu escritório em Porto Velho.

"O parlamentar, qualquer parlamentar, não sabe de tudo. Porque as pessoas trazem ao parlamentar aquilo que há interesse para ela, entendeu? Foi o caso", disse Chrisóstomo.

Contatado pela BBC após a gravação, Edinario Batista não se manifestou.


Documentos fraudados

Para tentar comprovar que era dono do lote à venda, Alvim Alves apresentou uma cópia do Cadastro Ambiental Rural (CAR) do terreno.

O CAR descreve a ocupação do solo em cada propriedade rural e foi criado pelo governo federal em 2012 para facilitar o controle do desmatamento.

Edinario Batista diz ter sido recebido por autoridades em Brasília para tratar de regularização de lotes dentro da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau

Uma visita ao site do CAR mostra que a área reivindicada por Alves foi de fato registrada e que 100% do lote está dentro da Terra Indígena Uru Eu Wau Wau. O sistema não apenas permite que qualquer um registre qualquer terra como também não impede que se reivindiquem áreas protegidas.

Em 2020, o Ministério Público Federal (MPF) identificou quase 10 mil registros de CAR que se sobrepõem a terras indígenas no país.

Em entrevista à BBC News Brasil, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, disse que usar o CAR para tentar legitimar áreas ocupadas ilegalmente é crime, e que cabe às polícias e ao Ministério Público investigar as irregularidades (leia mais abaixo).





Grilagem como 'investimento'


A investigação mostra ainda como a destruição da Amazônia pode ser altamente lucrativa e como um pedaço de floresta pode passar por várias mãos até se transformar numa fazenda.

Vários vendedores contatados disseram que haviam ocupado ou adquirido os lotes unicamente com a intenção de "investir" — ou seja, buscavam revendê-los por um preço maior do que o gasto na área.

Todos tinham outras fontes de renda e disseram que nunca pretenderam instalar fazendas nas áreas.

Um dos fatores que estimulam a valorização de terras na Amazônia é a expectativa de regularização da ocupação.

Queimada em Rondônia; ao desmatar um terreno, grileiros creem ter mais chance de poder regularizar a ocupação


Uma estratégia comum entre invasores de áreas protegidas é desmatar ao máximo o território e depois pleitear junto a autoridades a extinção do status de proteção, argumentando que a área já foi transformada e não serve mais ao propósito original.

Segundo um estudo da ONG Conservação Internacional, 85 unidades de conservação no Brasil foram extintas, reduzidas ou tiveram seu status de proteção rebaixado até 2017.

Já invasores de terras públicas que não integram unidades de conservação se alimentam da expectativa de que o Congresso postergue a data limite a partir da qual áreas públicas ocupadas não podem ser regularizadas.

Hoje, só áreas públicas desmatadas até 2014 são passíveis de regularização, mediante uma série de condições.

Em 2019, o presidente Jair Bolsonaro editou uma Medida Provisória que esticava esse prazo até dezembro de 2018, mas a iniciativa perdeu validade por não ter sido aprovada no Congresso a tempo.

Agora congressistas debatem um Projeto de Lei que pode postergar o prazo mais uma vez.

Faixa de floresta ladeada por plantações de soja em Rondônia


Valorização pós-desmatamento

Outro fator que costuma valorizar as terras amazônicas é o desmatamento.

Em março de 2020, Fabrício Guimarães anunciou no Facebook uma área de 39,5 alqueires (107 campos de futebol) "em mata" em Abunã, um distrito de Porto Velho, por R$ 190 mil.

Uma foto de satélite no anúncio mostrava um lote coberto por floresta à beira do rio Madeira, próximo à fronteira com a Bolívia.

Questionado sobre o terreno em agosto, Guimarães disse que o preço havia subido para R$ 515 mil, pois desde então ele tinha desmatado a área e plantado capim.

Fabrício Guimarães mostra a área próxima ao rio Madeira em Abunã que ele desmatou e anunciou no Facebook

Sem floresta e pronta para a criação de gado, a área ficou 270% mais cara.

Em conversas no Whatsapp, Guimarães disse que o único documento do lote que ele tinha era um contrato de compra e venda — registro em cartório que tampouco comprova a propriedade e não lhe dá o direito de desmatá-la.

Em seu perfil no Facebook, ele diz trabalhar como supervisor em um frigorífico de Humaitá, município amazonense na divisa com Rondônia.

Imaginando que lidava com potenciais compradores, ele levou a equipe da BBC até o lote e mostrou a área recém-desmatada com uma motosserra.

Imagens de satélite acessadas pela BBC confirmam que o local foi desmatado entre maio e julho do ano passado.

Imagens de satélite mostram lote anunciado por Fabrício Guimarães em maio de 2020 (à esq.), antes do desmatamento, e em janeiro de 2021

Uma estrada de terra que parte da BR-364 dá acesso ao terreno. No fim da jornada, a via fica tão estreita que é preciso abandonar o carro e caminhar por pouco mais de um quilômetro até o lote.

Guimarães diz que o afunilamento é proposital e busca impedir que fiscais cheguem à área.

"Eu não quis arrumar (a estrada) porque eu desmatei agora, recente. Aí facilita para o pessoal (da fiscalização) ir lá", afirma.

Procurado pela BBC após o encontro, Guimarães não se manifestou.


Venda ilegal de gado

História semelhante à de Guimarães é narrada por André Alves de Souza, pecuarista que ofereceu pelo Facebook um lote dentro da Reserva Extrativista Angelim, no município de Cujubim (RO).

No encontro gravado com câmera escondida, Souza — que também só possuía um contrato de compra e venda do lote — disse que adquiriu a área para "investir".

Ele disse que desmatou o terreno há alguns anos e jamais teve a intenção de ocupá-lo, pois já possuía outras fazendas na região.

André Alves de Souza anunciou no Facebook um lote dentro da Reserva Extrativista Angelim, em Cujubim (RO)

Assim como Alvim Alves, Souza disse integrar uma associação que representa os ocupantes da reserva. Ele disse que uma advogada contratada pelo grupo os orientou a tomar uma série de providências para fortalecer a reivindicação das áreas.

"Ela pediu para construir casa, fazer criação (de animais), mas não tive tempo", afirmou.

Pela lei, quem pleitea regularizar ocupações de terra precisa provar que utiliza a área economicamente, entre outros fatores.

Questionado se seria possível criar gado naquela área mesmo sem o título da terra, Souza disse que sim. Ele então contou como fazia para vender bois que criava em outra área sem documentação.

"Hoje eu não consigo matar, nessa área minha que eu tenho aqui, eu não consigo matar boi para exportação. Os frigoríficos de Rondônia (voltados à exportação), como funcionam: você tem de ter o documento da terra certinho, o CAR certinho, para você conseguir matar. Mas tem frigorífico que mata e compra do mesmo jeito. Eu vou matar nos outros frigoríficos que matam."

Procurado pela BBC após o encontro, Souza não respondeu.


'Caos fundiário'

Fazenda de gado na região de Monte Negro (RO)

Para Raphael Bevilaqua, procurador da República em Rondônia, boa parte da elite política e econômica de Rondônia tira proveito do "caos fundiário" no Estado.

Bevilaqua afirma que 70% das terras de Rondônia são da União. "A maioria dos ditos proprietários de terras (em Rondônia) são pessoas que na verdade não têm a propriedade (por ocuparem terras públicas)", afirma.

"Isso gera todo tipo de demanda e de reivindicações — tanto das pessoas que não têm acesso à terra e querem cultivar para trabalhar, quanto daqueles que têm apenas o intuito especulativo", diz o procurador.

Bevilaqua afirma que "grandes pretensos proprietários de terra" de Rondônia mantêm vínculos com políticos e juízes locais e são vistos como "grandes benfeitores", por criarem empregos e investirem na região.

"E essa proximidade, seja por corrupção, seja por afinidade, faz com que haja uma permissividade do Estado para com esses pretensos proprietários".

Bevilaqua afrma que autoridades estaduais sempre tiveram essa postura permissiva, mas que operações do governo federal ajudavam a conter o desmatamento em Rondônia.

Para a ambientalista Ivaneide Bandeira, atitudes e declarações de Bolsonaro "empoderaram os criminosos do meio ambiente"

Após a eleição de Bolsonaro, no entanto, ele diz que o governo federal deixou de fazer esse contraponto.

"Agora a situação é realmente desesperadora (...), e houve um alinhamento do governo estadual com o governo federal."

Para Ivaneide Bandeira, fundadora da ONG ambientalista Kanindé, que atua em Rondônia desde 1992, atitudes e declarações de Bolsonaro "empoderaram os criminosos do meio ambiente".

"Eles se sentem tão empoderados ao ponto de não terem vergonha de ir para o Facebook, para as redes sociais, e negociar terras."

Em nota enviada à BBC, o Facebook diz que suas "políticas comerciais exigem que compradores e vendedores cumpram as leis e regulações locais quando compram ou vendem no Marketplace".

"Estamos à disposição para trabalhar com as autoridades locais em qualquer uma das questões levantadas pela reportagem da BBC", diz a empresa.


'Questão de polícia'

A BBC compartilhou os achados da reportagem com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

Ele afirmou que a venda ilegal de terras na Amazônia pelo Facebook "é uma questão de polícia".

Questionado sobre o aumento no desmatamento em 2020, Salles o atribuiu ao impacto da pandemia nas ações de fiscalização.

A BBC questionou Salles sobre a visão favorável que os vendedores entrevistados têm de Bolsonaro e indagou se a retórica do presidente não estaria estimulando o desmatamento.

"O governo do presidente Jair Bolsonaro sempre deixou claro que é um governo de tolerância zero a qualquer crime, inclusive os ambientais", disse Salles.

Fazendas de soja em Rondônia

"Agora, o entendimento das pessoas acerca da sua situação pessoal, do que eles dizem nas entrevistas, cada um responde pelas suas atitudes. Para isso nós temos a polícia, temos o Código Penal, tem toda uma legislação para isso."

O ministro defendeu, no entanto, "que alguns aspectos da legislação fundiária no Brasil precisam ser revistos, até para você ter uma solução definitiva para um problema que se arrasta há décadas".

Ele criticou o Congresso por não ter aprovado a Medida Provisória 910/2019, que facilitaria a regularização de áreas desmatadas ilegalmente, e disse que o desmatamento também se deve à pobreza existente na Amazônia.

"São mais de 23 milhões de brasileiros que vivem numa situação muito ruim em termos de IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) e que precisam melhorar de vida."

O próprio ranking do IDH mostra, no entanto, que o desmatamento não se traduz necessariamente em melhoria dos padrões de vida.

Rondônia, que já perdeu quase 30% de sua floresta, está em 19º lugar entre os 27 Estados brasileiros no ranking. O IDH do Estado cresceu 178% entre 1991 e 2017.

O Amazonas, 16º do ranking, teve avanço semelhante no IDH no mesmo período (170%), mas o fez preservando 97% da floresta nativa.


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Fonte: BBC News Brasil 

 

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