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terça-feira, 7 de maio de 2024

‘Tragédia no RS é responsabilidade também de senadores e deputados que desmontam legislação ambiental’, diz secretário do Observatório do Clima


As fortes chuvas que atingem o Rio Grande do Sul, as mais intensas registradas em território gaúcho em décadas, já deixaram dezenas de mortos, causaram estragos em 300 municípios, romperam uma barragem e desalojaram mais de 80 mil pessoas. Há ainda mais de uma centena de pessoas desaparecidas enquanto o mau tempo já provoca danos em outros Estados do Sul.


253 municípios foram afetados por chuvas no Sul

Mas a responsabilidade não é apenas dos governos estaduais e federal, diz Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima (OC), mas também do Congresso — pois as tragédias são resultado da falta de adaptação e de combate às mudanças climáticas, duas áreas onde os Executivos precisam fazer mais e onde o Legislativo têm promovido ativamente retrocessos, na opinião dele.

"A maioria conservadora tem aprovado diversos projetos considerados nocivos para o meio ambiente. Nunca tivemos um Congresso tão dedicado a desmontar", afirma o especialista em políticas públicas à frente do Observatório do Clima, rede de entidades que monitora a questão climática no Brasil.

Além disso, segundo Astrini, ações que se limitam às respostas de emergência em situações de crise não são suficientes. Eventos extremos como esse — cada vez mais comuns por causa das mudanças climáticas — não podem mais ser tratados como “imprevistos”.


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Embora nem sempre seja possível prever com precisão a intensidade de um evento extremo, já sabemos que eles se tornarão mais frequentes — e quais as medidas que precisam ser tomadas para nos adaptarmos a eles, afirma o especialista.

Modelos climáticos preveem há décadas um aumento de chuvas extremas no sul da América do Sul, incluindo toda a bacia do Prata (formada pelos rios Paraná e Uruguai), lembra Astrini.

“O maior problema que a gente enfrenta neste momento não é a previsão, é a aceitação”, afirma Astrini. “A gente precisa aceitar que, infelizmente, esse é o novo normal. Mas não basta aceitar pacificamente, é preciso aceitar e tomar atitudes.”

Todo ano o governo do Rio Grande do Sul fica extremamente espantado que as chuvas são intensas. O governo do Rio de Janeiro fica super surpreso quando acontece em Petrópolis. É uma surpresa em São Sebastião (SP), no norte de Minas Gerais, em Recife (PE), no sul da Bahia. Só que acontece que já faz nove anos consecutivos que as médias de temperatura do planeta são as mais quentes já registradas. Não tem mais surpresa. A gente precisa se preparar para isso”, afirma Astrini.


Dinheiro investido em prevenção evita tragédias, diz Astrini

Mitigação, adaptação e redução de danos

Astrini explica que existem três tipos de resposta possíveis diante da crise climática: a mitigação das causas, a adaptação em preparação para as consequências e a redução de danos diante das tragédias.

“Mitigação é quando você ataca o problema: é quando você interrompe o desmatamento, quando você tira uma termoelétrica de operação, quando substitui uma fonte poluente por uma fonte renovável”, afirma o especialista.

“A adaptação é quando o problema vai acontecer e você começa a adaptar principalmente as populações mais vulneráveis ao problema. Por exemplo, quando tira as populações da área de risco, quando dá mais assistência para um pequeno agricultor lidar com uma seca.”

As ações também são necessárias contra problemas que não necessariamente são causados pelo aquecimento global, embora agravados por ele, explica Astrini.

“Adaptação é também quando você reforça a rede de saúde, porque vão aumentar os casos de dengue, porque o ciclo de reprodução do mosquito vai ficar mais longo por causa de chuvas desproporcionais e do calor prolongado.”

Já lidar com as perdas e reduzir os danos é promover as respostas emergenciais às tragédias.

“Perdas e danos é o que se faz normalmente: desbarrancou, você vai procurar sobreviventes, vai construir casas”, diz Astrini. O problema, na visão do especialista, é que as ações tomadas por autoridades federais, estaduais e municípais tendem a se concentrar apenas nesse terceiro estágio de resposta.

“O pessoal só age quando já está no nível da desgraça”, diz Astrini.

“O dinheiro investido na primeira camada vale muito mais, porque ele evita a adaptação e evita o desastre.”

Ações que estão sendo tomadas tanto pelo governo federal quanto pelo governo estadual e pelos municípios no caso das chuvas no Rio Grande do Sul — alertas da Defesa Civil, evacuação de pessoas de áreas de emergência, restabelecimento de serviços etc — se encaixam no terceiro tipo.

Após a região ser atingida por um ciclone em setembro do ano passado, o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional repassou R$ 82 milhões para o governo do Estado e outros R$ 243 milhões aos municípios gaúchos para lidar com a crise. Segundo reportagem da CNN Brasil, a maior parte do dinheiro foi usada em ações emergenciais, como compra de mantimentos e desobstrução de estradas.

“A gente pode ter a Defesa Civil 30 vezes maior no Rio Grande do Sul ou em qualquer outro Estado. Vai continuar morrendo gente, porque a Defesa Civil vai conseguir salvar a vida de alguém próximo, mas não de todos. Quem salva mais vidas é o planejamento, e no caso dos municípios, o planejamento urbano”, afirma o líder do Observatório do Clima.

Embora o aquecimento global seja um problema em escala mundial, ações de mitigação não são responsabilidade apenas de entidades internacionais e governos nacionais. Elas podem — e precisam — ser alvo também dos governos locais, diz Astrini.

“A mitigação é uma agenda de responsabilidade, não de ganho político. Vou pegar um exemplo aqui no Cerrado, que bateu o recorde de desmatamento nesse último período: mais de 60% de aumento de agosto do ano passado para cá. E quem dá as autorizações de desmatamento são os governos estaduais”, diz ele.

“E há vários outros exemplos, como legislações de licenciamento ambiental mais frouxas nos Estados, a responsabilidade com o saneamento básico, com a transição energética.”

O governo do Rio Grande do Sul não respondeu inicialmente ao pedido de informações sobre ações de mitigação e adaptação da BBC News Brasil. O governador Eduardo Leite (PSDB) tem dado atualizações diárias sobre as medidas emergenciais tomadas no Estado, que incluem alertas e remoção das pessoas das áreas de risco.

Após a publicação desta reportagem, a Secretaria do Meio Ambiente do Estado enviou nota em que "reforça a necessidade de adaptação para garantir a sobrevivência na Terra" e afirma que as ações de mitigação, adaptação e resiliência são parte do programa ProClima2050, lançado em 2023.

O programa, diz a pasta, criou o Gabinete de Crise Climática, "que tem como principal função conectar as secretarias de Estado, instituições e pesquisadores no monitoramento e implementação de ações práticas de resposta à crise do clima".

Segundo a secretaria, entre as medidas em andamento estão "a contratação de serviço de radar meteorológico pela Defesa Civil; melhorias na Sala de Situação, responsável pelo monitoramento das chuvas e dos níveis dos rios; e a implementação do roadmap climático dos municípios, que mapeará as ações relacionadas ao clima em esfera municipal".


Chuvas foram as piores já registradas no Estado

‘Deputados e senadores também são responsáveis’

Astrini diz ainda que é preciso lembrar da responsabilidade do Congresso em relação à situação climática que leva à tragédias como a sofrida pelo RS neste momento.

"Deputados trabalham dia e noite para destruir a legislação ambiental do Brasil com afinco. Neste momento estão querendo acabar com a Lei de Licenciamento Ambiental, querem acabar com a reserva legal na Amazônia, querem acabar com as reservas indígenas”, diz Astrini.

Ele se refere a um um projeto de lei que flexibiliza o licenciamento ambiental, permitindo que Estados e Municípios determinem os projetos que precisam ou não fazer uma análise de impacto, entre outras medidas.

Os defensores do PL argumentam que ele “diminuirá a burocracia” e por isso facilitaria o desenvolvimento econômico.

Mas Astrini diz que o projeto não só não resolve o problema da burocracia como pode comprometer metas de desenvolvimento sustentável.

“A gente nunca teve um Congresso tão agressivo nesse esforço para desmontar a legislação ambiental no Brasil”, afirma.

Deputados e senadores contrários a pautas importantes para ambientalistas argumentam que a legislação ambiental atrapalha o desenvolvimento econômico e, em alguns casos, negam dados científicos sobre o aquecimento global ou sobre desmatamento no Brasil.

“Tem dois momentos em que o Congresso ajuda o Brasil na área ambiental: no recesso do meio do ano e no recesso do final”, diz Astrini.

Para Astrini, o governo federal vem falhando na disputa com os deputados e senadores pelas pautas ambientais, embora tenha um bom projeto para a área.

Ele cita, por exemplo, o fato de a bancada governista ter sido liberada para votar em qualquer sentido (em vez de receber a orientação para votar contra) o marco temporal para as terras indígenas.

“A gente nunca teve um Ministério do Meio Ambiente com tanto apoio no governo. É a primeira vez que um presidente fala em desmatamento zero e tolerância zero para desmatadores. Você tem um ministro da Economia que faz conversas sobre o meio ambiente, um Ministério dos Povos Indígenas... Mas mesmo assim as coisas não estão andando como deveriam”, afirma.

Além na tragédia no Sul, há outras notícias negativas na área. O Norte registra número recorde de queimadas de janeiro a maio deste enquanto a greve de servidores dos dois principais órgãos de fiscalização ambiental do país —Ibama e ICMBio— já dura mais de 100 dias.

Para o especialista, não se trata apenas de uma questão de orçamento mais robusto para ministérios da área —que também é importante — mas da capacidade de integrar essa visão em todos os setores.

“Quem causa o problema de emissões do Brasil? São os atores no setor do Ministério da Agricultura. E no Ministério das Minas e Energia. São esses ministérios que têm que ter programas e investimentos para diminuir as emissões de seus setores”, afirma Astrini. “O Ministério do Ambiente pode multar uma área que já foi desmatada, mas para as ações de mitigação você precisa da ação de todos os agentes.”

A BBC procurou o governo federal para falar sobre o assunto, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.

O governo, que apesar de não ter maioria no Congresso conseguiu aprovar agendas suas como o novo arcabouço fiscal, não tem “comprado a briga” nas pautas ambientais, opina Astrini.

No caso do marco temporal para as terras indígenas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva até tentou barrar a aprovação da lei que limita a demarcação, mas seu veto foi derrubado pelo Congresso.

A tese do marco temporal é de que apenas áreas ocupadas por indígenas em outubro de 1988, momento em que a Constituição Federal foi promulgada, poderiam ser demarcadas.

Movimentos indígenas questionam a tese porque havia terras que, naquele momento, não eram ocupadas porque seus habitantes originários haviam sido expulsos por invasores. Já os ruralistas alegam que não estabelecer um marco temporal criava insegurança jurídica.

Além de um direito dos povos originários, a demarcação de terras indígenas é considerada por ambientalistas e pesquisadores uma das principais formas de preservação da mata nativa brasileira — hoje as reservas impedem o desmatamento de diversas áreas cujo entorno foi devastado.

Astrini também critica o fato de pautas ambientais terem entrado no cabo de guerra entre o Supremo e o Legislativo, virando parte de uma disputa de poder mais do que uma discussão sobre políticas públicas.

O Senado e Câmara têm entrado em rota de colisão com o STF em diversos temas, em uma disputa sobre os limites de cada poder.

A questão do marco temporal, inclusive, só teve a sua votação acelerada como resposta da bancada ruralista a uma decisão do STF de 2023.

Na época, a Corte rejeitou a tese do marco, que era baseada em uma situação jurídica ambígua. Logo em seguida o Congresso aprovou uma nova legislação determinando a existência de um marco temporal.

“Em algumas áreas, como essa do marco temporal, o Congresso tem usado a questão para atacar os indígenas e o Supremo.”

Além das decisões recentes tomadas pela maioria conservadora do Congresso e de projetos em tramitação, Astrini critica a postura pública de deputados e senadores em relação a temas ambientais.

“São os homens privilegiados, com espaço, que falam com seus eleitores e formam opinião pública. Eles não cansam de repetir que essa coisa de meio ambiente, de regra ambiental, é uma besteira”, diz Astrini. “Mas aí as consequências chegam e a responsabilidade é de quem?”

Para o secretário-executico do OC, esses parlamentares "incentivam quem quer desrespeitar a leis ambientais e prejudicam quem quer fazer certo”. “Então eles têm enorme responsabilidade por situações como essa (no Rio Grande do Sul) e têm que ser cobrados por isso.”

Por: Letícia Mori - Twitter,@_leticiamori 

Da BBC News Brasil em São Paulo


Observatório do Clima

E esse aqui é o candidato a vice-prefeito de São Paulo dizendo o que ele pensa sobre o aquecimento global. Vão eleger esse cidadão em plena crise climática na chapa de um prefeito que já teve outro negacionista cuidando de clima?


 

Esse aqui é o picareta Luiz Molion, negacionista do clima que palhaços como @PlinioValerio45 e @marciobittar alçaram à condição de “especialista”, dando um depoimento na CPI das ONGs que fala por si.



 ClimaInfo

Doe @MST_Oficial, @gzhdigital, @defesacivilrs, @AMRIGS, mas não esqueça de cobrar empresas e parlamentares pela solução do problema!

#AçãoPeloClima #AjudaRioGrande #SOSRS



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sexta-feira, 10 de setembro de 2021

Greta Thunberg responsabiliza governo Bolsonaro por destruição da Amazônia

 

"A Amazônia, os pulmões do mundo, agora está no limite e emitindo mais carbono do que consumindo por causa do desmatamento e das queimadas. Isso está acontecendo enquanto nós assistimos, isso está sendo diretamente alimentado pelo governo", disse a ativista sueca


Ativista ambiental sueca Greta Thunberg, em pronunciamento via videoconferência. (Foto: Pedro França/Agência Senado)

247A ativista sueca Greta Thunberg voltou a responsabilizar o governo brasileiro pela destruição da Amazônia. "O Brasil não tem desculpas para assumir sua responsabilidade. A Amazônia, os pulmões do mundo, agora está no limite e emitindo mais carbono do que consumindo por causa do desmatamento e das queimadas. Isso está acontecendo enquanto nós assistimos, isso está sendo diretamente alimentado pelo governo. O mundo não pode arcar com o custo de perder a Amazônia", disse a ambientalista sem citar o nome de Jair Bolsonaro, de acordo com o jornal Folha de S. Paulo

A declaração de Greta foi feita durante uma audiência pública realizada pela Comissão de Meio Ambiente do Senado nesta sexta-feira (10). Ela também qualificou como “vergonhosas” as atitudes  das lideranças nacionais em relação aos povos originários e ressaltou que "esses acontecimentos no Brasil têm colocado em risco essa população e a própria Floresta Amazônica". 


TV Senado

Senadores debatem nesta sexta-feira o Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, também conhecido como relatório do IPCC. Foram convidados especialistas internacionais e a ativista ambiental sueca Greta Thunberg participa do evento. O documento destaca o aquecimento global de 1,5°C acima dos níveis pré-industriais e o aumento da emissão de gases de efeito estufa. Os resultados do IPCC vão ser avaliados sob o ponto de vista do impacto e das recomendações para o Brasil.

Assista ao VÍDEO



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segunda-feira, 23 de agosto de 2021

Efeitos mais drásticos do aquecimento global no Norte de Minas


Cenário é desolador em dezenas de municípios da região, com elevação da temperatura, desaparecimento de nascentes


O que antes era uma lagoa hoje é terra esturricada em Montes Claros: um dos efeitos do aquecimento global no Norte do estado
(foto: Fotos: Luiz Ribeiro/EM/D.A Press)

Muitos peixes, poços e caudaloso o ano inteiro. Nos relatos do pequeno produtor Nilson Marques das Neves, de 65 anos, o Rio das Pedras fazia jus ao nome da comunidade de Água Boa, onde mora, na zona rural do município norte-mineiro de Glaucilândia. O leito, que literalmente corta o seu quintal, no fundo da casa, hoje está bem diferente da memória fotográfica dele.

Da abundância de cerca de 20 anos atrás, só restaram as pedras, com o leito seco, parecendo uma estrada. A água de outrora virou "coisa rara" e só corre no rio na efêmera e curta estação chuvosa do Norte de Minas. “Com o passar dos anos, a água foi diminuindo até acabar de vez”, descreve Nilson.

O cenário desolador enfrentado pelo pequeno produtor se repete em outras dezenas de municípios da região, onde os efeitos drásticos das mudanças climáticas são cada vez mais visíveis e permanentes, com a elevação da temperatura, o desaparecimento de nascentes, a diminuição e o secamento de centenas de rios e córregos, intempéries que deterioram mais ainda a qualidade de vida na região historicamente castigada pelas estiagens prolongadas. O drama que repete atualmente – 89 municípios norte-mineiros estão em situação de emergência por causa da seca, segundo a Associação dos Municípios da Área Mineira da Sudene (Amams).

De acordo com a Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM), dos 33 municípios mineiros mais críticos na chamada "vulnerabilidade climática", 13 estão na região Norte e um deles é Glaucilândia.

A dura realidade enfrentada pelo “seo” Nilson e por milhares de pequenos produtores é confirmada pelo estudo “Vulnerabilidade da Mesorregião Norte de Minas face às mudanças climáticas”, publicado pela PUC Minas e realizado por um grupo constituído pela geógrafa Letícia Freitas Oliveira e pelos meteorologistas Ruibran dos Reis (do Instituto de Meteorologista Climatempo) e Tomás Calheiros, português vinculado à Universidade de Lisboa, parceira da PUC Minas na elaboração da pesquisa. 

O levantamento analisa as mudanças climáticas projetadas a médio e longo prazos para a região, por meio dos parâmetros de temperatura média e precipitação, a partir de modelos regionais do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) da Organização das Nações Unidas (ONU), no período de 2015 a 2017. “As mudanças climáticas já são realidade e seus efeitos cada vez mais catastróficos”, conclui o estudo. 

“Os efeitos das mudanças climáticas já são realidade e se mostram cada vez mais frequentes e severos. No Norte de Minas são observados extremos climáticos como ondas de calor, secas ainda mais intensas e prolongadas e chuvas cada vez mais irregulares”, afirma a geógrafa Letícia Freitas Oliveira, que mergulhou no tema ao concluir o curso de mestrado na PUC Minas. “O norte do estado é ao mesmo tempo frágil e vulnerável às variações do clima, apresenta características semiáridas e limitados recursos para se adaptar ao clima futuro”, assinala.

A especialista afirma que as mudanças climáticas, com o aumento da temperatura e da aridez, afetam diretamente a disponibilidade de água e a qualidade de vida das populações. Como o clima mais quente e seco, observa, as pessoas tendem a enfrentar dificuldades no acesso à água para irrigação, atividades agropecuárias, abastecimento e dessedentação.


Deslocamentos

“As consequências podem afetar a segurança alimentar, a biodiversidade e a saúde humana. As restrições de ocupação impostas pelo clima podem impulsionar disputas pela água e deslocamentos populacionais para áreas onde se tenha maior disponibilidade hídrica e/ou menor dependência das atividades agrárias, por exemplo”, afirma Letícia Oliveira.

Os estudos projetam a evolução das variáveis climáticas com base em cenários otimistas e pessimistas de emissões de GEE (gases de efeito-estufa). “A médio prazo (2041-2070) e longo prazo (2071-2100), estimam-se cenários mais quentes, secos e intensificação da irregularidade das chuvas.”

Um dos projetos é o "Círculo de Bananeira", sistema de reuso da água para umedecer o terreno e fazer o cultivo da banana (foto: Cleisson Carpegiane/Divulgação)


Economia impactada

O estudo da PUC Minas e da Universidade de Lisboa também aponta os prejuízos das mudanças climáticas para a economia. “Os impactos negativos nos setores agropecuário e industrial afetam diretamente a economia da mesorregião e, principalmente, das populações menos desenvolvidas. O fato que agrava a situação é o perfil socioeconômico limitado da maioria dos municípios do Norte de Minas. São populações com poucas condições de investir em medidas de mitigação e adaptação ao clima”, diz o levantamento.

A geógrafa Letícia Oliveira ressalta que os efeitos climáticos vão atingir diretamente a produção agrícola e a geração de energia em áreas vulneráveis como o Norte de Minas.

“As alterações no clima da região podem reduzir as áreas com aptidão agrícola, os ambientes favoráveis à criação de animais e os reservatórios. Os efeitos são de queda da produtividade agropecuária, limitações na irrigação, comprometimento da capacidade das usinas hidrelétricas, entre outros”, avalia.

A especialista chama atenção para os investimentos que devem ser feitos pelo Poder Público para amenizar os efeitos das mudanças climáticas na economia. “As medidas devem envolver preservação e proteção das áreas verdes, redução do desmatamento, diversificação das matrizes energéticas, considerando que o clima do norte do estado favorece o uso de energias renováveis como eólica e solar.”

A geógrafa ressalta que os povos e comunidades tradicionais do Norte de Minas devem ser vistos como estratégicos no enfrentamento da situação, pois convivem em estreita relação com os recursos naturais e detêm conhecimentos e práticas agrícolas que respeitam os limites da natureza.

O produtor Nilson das Neves se apega à fé e diz acreditar que as mudanças climáticas, com o secamento dos rios e “o fim das águas”, são consequências da própria ação do homem. “O mundo está doente porque o homem acha que o dinheiro dele é que vale mais”, afirma.

Nilson guarda na memória um fato ligado à religiosidade e aos costumes da região que prova que o Rio das Pedras, até 20 anos atrás, realmente corria o ano inteiro: “Na festa da fogueira de são-joão, em junho, o pessoal tomava banho no rio com a crença de que se fizesse não iria envelhecer”. 

O agricultor acredita que será possível o Rio das Pedras e outros cursos d’água voltarem a correr cheios como no passado. “A primeira coisa que as pessoas têm que fazer é respeitar a natureza.”

O produtor Nilson Marques das Neves, de 65 anos, dentro do que já foi o Rio das Pedras, na comunidade de Água Boa (foto: Cleisson Carpegiane/Divulgação)

Ações tentam reparar prejuízos 

A pequena Glaucilândia, de 3,2 mil habitantes, vive um paradoxo: está entre os 13 municípios do Norte de Minas incluídos na lista das 33 cidades em grau crítico de vulnerabilidade climática. Ao mesmo tempo, destaca-se pelas ações conservacionistas, que asseguraram ao município o recebimento de várias premiações estaduais e nacionais.

De acordo com o último IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU), de 9 de agosto, a temperatura média anual de Glaucilândia é de 22,2ºC e tem tendência para aumentar 0,8ºC, podendo chegar à média de 23ºC em 2100.

A previsão é que, em uma situação mais dramática, o município pode ter aumento de 3,6ºC, com a média anual podendo alcançar 25,8ºC. Outros municípios vizinhos vivem situação semelhante, por terem o mesmo clima. Um deles é Montes Claros, cidade-polo da região, distante 30 quilômetros de Glaucilândia.

Na última quarta-feira (17/8), sob o sol forte, a reportagem do Estado de Minas percorreu a zona rural de Glaucilândia, deparando-se com sequidão e a escassez hídrica por onde passou. Como prova que a região já sofre os duros efeitos das mudanças climáticas, o Rio Verde Grande, um dos principais afluentes da margem direita do Rio São Francisco, está vazio em praticamente sua extensão que corta o município – apenas alguns poços ainda resistentes em pontos isolados do leito seco e assoreado. Em quadro semelhante ao Rio das Pedras (que faz parte da bacia do Verde Grande), todos os córregos do município estão esturricados: Caiçara, Tabocal, Gameleiras, “Casa de Curral”, Teixeiras e Barro Vermelho.


Consequências

O prefeito de Glaucilândia, Herivelton Alves Luiz (PSD), afirma que os efeitos das alterações climáticas são uma realidade no município, afetando os pequenos produtores. “Os nossos rios que eram perenes, hoje são todos intermitentes. Isso é um reflexo das mudanças climáticas, cujas consequências são catastróficas para o homem do campo”, diz.

Herivelton relata que praticamente todos os pequenos produtores de Glaucilândia lidam com a agricultura de subsistência. Com os danos provocados pela escassez dos recursos hídricos, ocorreu uma inversão: famílias que antes produziam e vendiam alimentos, hoje, precisam ser socorridas com a doação de cestas básicas por parte da municipalidade, que também se viu obrigada a abrir poços tubulares e pagar as despesas de manutenção deles para garantir água para as comunidades rurais.

Além da ajuda às famílias, a Prefeitura de Glaucilândia combate os efeitos das mudanças climáticas com outra estratégia: o investimento em projetos de conservação ambiental, que já garantiram várias premiações ao município. Entre as ações estão o cercamento de nascentes e a construção de barraginhas de captação de água da chuva e a distribuição de mudas para recomposição de matas ciliares.

Uma das iniciativas ambientais premiadas de Glaucilândia é o Projeto Reciclar, “Reciclar: Menos Lixo, Mais Segurança Alimentar", desenvolvido em parceria com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG). O projeto estimula os moradores rurais a coletar e juntar resíduos recicláveis e trocar por mudas frutíferas certificadas, sementes de hortaliças e pintinhos.

Outra ação de destaque é o projeto “Círculo de Bananeira”, que cuida do reuso da água. Pelo sistema, o efluente de esgoto de pia é jogado em um buraco no chão, onde ocorre a decantação natural, umedecendo o terreno para cultivo da banana.

Morador da comunidade de Curral Queimado, Gilmar de Andrade é um dos pequenos agricultores do município de Glaucilândia beneficiados com a técnica do reuso da água para manter as plantações no seu quintal. Com tristeza, ele conta que o córrego do fundo de sua casa secou há anos, assim como os minadouros da região. “A água só vai voltar se plantarem árvores nas cabeceiras dos rios e córregos.”

Fonte: Estado de Minas


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