Após chamar atenção ao circular por Nova Iorque sem estar vacinado, o chefe
de Estado brasileiro declarou oficialmente na abertura do evento que
"os recursos para fiscalização, nos órgãos ambientais, foram dobrados. E
os resultados já começam a aparecer.”
Em abril, o governo aprovou corte de 24% no orçamento do
meio ambiente para 2021 em relação ao ano passado.
Bolsonaro também mentiu sobre dados de desmatamento na
Amazônia em agosto. Ele falou em 32% de redução em relação ao mesmo mês de
2020. Segundo o Imazon, houve aumento de 7%, um recorde desde 2012.
“Nenhum país do mundo possui uma legislação ambiental tão
completa quanto a nossa. Nossa agricultura é sustentável e de baixo
carbono", afirmou o presidente brasileiro. Bolsonaro acrescentou
que “indígenas desejam utilizar suas terras para agricultura e outras
atividades.”
O discurso reforçou a polarização política interna, mentindo
que as manifestações pró-governo do último dia 7 foram "as maiores da
história do país."
“Estávamos à beira do socialismo. Apresento agora um novo
Brasil, com credibilidade reconhecida em todo o mundo”, disse o presidente. Em
seguida, mentiu mais uma vez, dizendo que não houve nenhum caso de corrupção em
seu governo – apesar de todos os indícios levantados pela CPI da Covid.
Sobre a pandemia, ele disse que sempre defendeu
"combater o vírus e o desemprego com a mesma responsabilidade."
Para o capitão reformado, “as medidas de lockdown deixaram
um legado de inflação”, e as pessoas foram "obrigadas a ficar em
casa" por prefeitos e governadores.
Bolsonaro foi obrigado a usar máscara nas dependências do
prédio / John Minchillo / POOL / AFP
O discurso durou, ao todo, 13 minutos.
Jair Bolsonaro valorizou os números da vacinação no
Brasil, embora nunca tenha feito um pronunciamento incentivando os
cidadãos a se imunizarem.
"Fiz tratamento inicial [contra a covid]. Nosso governo
é contra a vacinação obrigatória", ressaltou.
“Meu governo recuperou a credibilidade, e hoje o Brasil se
apresenta como um dos melhores destinos para investimentos”, disse ainda o
capitão reformado, citando os programas de concessão e privatização no setor de
infraestrutura.
A reportagem do Brasil de Fato selecionou as principais
informações falsas do pronunciamento do presidente brasileiro na manhã desta
terça (21) em discurso na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas.
A reportagem do Brasil de Fato selecionou as principais informações falsas do pronunciamento do presidente brasileiro.
😳 Especialistas ouvidos pelo BdF afirmam que o presidente mentiu "descaradamente" várias vezes na tribuna da ONU. Confira! 📽️ pic.twitter.com/ESnYYfMP70
Ajustes do sistema de anúncios online permitem irrigar sites
bolsonaristas sem despertar a atenção dos órgãos de controle.
O GOVERNO Jair Bolsonaro entregou mais de R$ 11
milhões ao Google, entre maio de 2019 e julho de 2020, para que o gigante da
internet distribua anúncios do governo de extrema direita pela internet. Parte
considerável desse dinheiro – até
68%, segundo o próprio Google – vai parar no bolso dos editores dos
sites que os veiculam pelo sistema AdSense.
Mesmo antes de chegar a essa conclusão, a comissão
já havia convidado, em 2019, executivos do Google a prestar
esclarecimentos – o que ainda não ocorreu, porque os trabalhos estão parados
por causa da pandemia de coronavírus.
Agora, fica claro que o bolsonarismo foi ainda mais
generoso. Numa conta simplista, o Planalto colocou R$ 7,5 milhões (já excluída
do montante a fatia abocanhada pelo próprio Google) à disposição de todo tipo
de site, inclusive propagadores de mentiras como o Jornal da Cidade Online e o
Conexão Política, primeiros alvos do movimento Sleeping Giants Brasil.
Os dados foram compilados pelo Intercept a
partir de um pacote de contratos, termos aditivos e relatórios de despesas com
publicidade oficial enviado pelo ministro das Comunicações, Fábio Faria, em
resposta a requerimento feito pelo deputado federal David Miranda, do Psol
fluminense.
Com os mais de R$ 11 milhões que recebeu, o Google só fica
atrás de dois outros veículos de comunicação, a Record e o SBT, aliados de
primeira hora do bolsonarismo, e de uma empresa que fornece mídia out
of home, jargão do mercado publicitário para todo tipo de anúncio em
ambiente externo, de painéis eletrônicos em grandes avenidas a anúncios em
pontos de ônibus.
A rede de televisão da Igreja Universal do Reino de Deus
embolsou mais de R$ 17,3 milhões para propagandear o governo Bolsonaro. O canal
de Sílvio Santos, segundo colocado, outros R$ 15,4 milhões. Em seguida, está
uma fornecedora de mídia outdoor a quem o bolsonarismo entregou quase R$ 11,2
milhões, R$ 70 mil a mais do que recebeu o Google.
Fabio Wajngarten, responsável pela comunicação do governo
Bolsonaro: ele prometeu ajudar sites de fakes news a manterem anúncios e está
na mira do Ministério Público Federal. Foto: Anderson Riedel/PR
Driblando a lei
Em maio, o Sleeping Giants Brasil alertou que o Banco do
Brasil era um dos anunciantes que usava o Google AdSense para patrocinar sites
de fake news. “É realmente triste assistir o aparelho governamental interferir
e fazer uso do dinheiro do povo para empregá-lo em discursos odiosos e na
disseminação de notícia falsas”, disse à revista Veja o criador do movimento, que prefere
permanecer anônimo por temer represálias.
O relatório de despesas de publicidade oficial permite ver
quanto dinheiro o bolsonarismo colocou à disposição dos sites de fake news. Os
R$ 11 milhões pagos ao Google representam 6,5% do total gasto no período
coberto pelo relatório – R$ 168,5 milhões, pulverizados entre mais de
1.600 fornecedores de todo tipo, de grandes emissoras de televisão e redes
sociais a jornais e emissoras de rádio dos rincões do país.
Mas o Google alega sigilo comercial para não revelar os
destinatários finais do dinheiro. Num leilão, a empresa distribui os anúncios
com base no público que acessa os sites. A remuneração é por cliques: se o
usuário clicar no anúncio, o Google e o site dividem a grana. A audiência é uma
das variáveis que torna sites mais lucrativos, assim como a afinidade do
público com os anúncios.
O Google não revela quais são os anunciantes de sites
específicos. Mas nós já mostramos que, desde 2016, a extrema direita criou uma
rede de sites lucrativa para receber esse dinheiro, e recebeu inclusive treinamento do próprio Google para
bombar a audiência e lucrar mais com anúncios.
É uma corrida, portanto: quem atrair mais gente ganha mais
dinheiro. E, para atrair a audiência da extrema direita, vale mentir e inventar
– e falar bem de Bolsonaro, claro. Afinal, é bastante provável que um fã do
presidente que chegou a um site de fake news atrás de matérias que confirmem
sua fé no presidente clique num anúncio que fala bem de seu governo. É uma
relação em que todos saem ganhando – a não ser os fatos e a democracia.
Concentrando parte considerável de sua verba publicitária
nesse sistema, o governo escapa das críticas (e possíveis processos por
improbidade) de que seria alvo se escolhesse entregar diretamente dinheiro
público a sites que defendem o presidente, a cura da covid-19 pela cloroquina
(descartada pela ciência), culpam adversários de Bolsonaro pelas mortes
causadas pelo coronavírus ou simplesmente negam que ele seja a causa.
Em português claro, Bolsonaro encontrou no sistema de
anúncios do Google uma maneira de entregar dinheiro público a seu exército de
difusores de mentiras e teorias da conspiração sem ser alvo dos órgãos que
controlam os gastos do governo. Já admitiu isso publicamente e passou recibo quando sua tropa de choque esperneou em reação ao surgimento do
Sleeping Giants Brasil.
O movimento, que conseguiu retirar os anúncios do Google de
dois dos principais sites de fake news, foi alvo de ataques do secretário-executivo do Ministério
das Comunicações, Fabio Wajngarten, e dos filhos 02 e 03 do presidente, Carlos
e Eduardo Bolsonaro.
Wajngarten falou, inclusive, que iria “contornar a
situação”. Em seguida, o Banco do Brasil, um dos grandes anunciantes do
governo, retomou a veiculação de propaganda via Google AdSense em um dos sites
de fake news – até ser proibido de fazê-lo por decisão do Tribunal de Contas da União.
Para se defender, o governo tenta jogar a culpa no Google.
“Não há, nem é possível, qualquer direcionamento para sites ou blogs impróprios
porque a Secom não compra, não investe. Não existe nem blacklist nem
whitelist”, tentou se esquivar o secretário de Publicidade de Bolsonaro, Glen
Valente, numa entrevista à imprensa concedida em junho.
Só que não é assim. O sistema de anúncios do Google permite
que o cliente (no caso, o próprio governo, representado pelas agências de
publicidade que contrata) direcione seus anúncios a partir de um cardápio de
180 filtros disponíveis diretamente no sistema. Por eles, o anunciante pode
escolher o perfil do público (incluir ou não crianças, aparecer ou não em sites
que veiculam conteúdos violentos), segundo uma fonte que conhece profundamente
o sistema e que conversou com o Intercept sob sigilo.
Além dessas opções, ainda há inúmeras possibilidades de
ajustes finos, a partir do que se chama, no jargão do mercado, de listas de
positivação e de exclusão – em que se pode incluir de endereços de sites a
palavras-chave. Por exemplo: é possível pedir ao sistema para não exibir os
anúncios em sites em que apareça a expressão “direito ao aborto” e privilegiar
os que falam em “proteção à família tradicional” e “defesa da vida”. “Isso
sinaliza ao algoritmo que estou disposto a pagar mais para veicular meu anúncio
nesse tipo de site”, disse a fonte.
Em português claro, quem sabe usar esses ajustes pode
multiplicar as chances de um anúncio do governo Bolsonaro ser exibido num site
de fake news e eliminar as de que ele vá parar no de um jornal que critica o
presidente de extrema direita. Tudo isso, claro, deixa rastros, ou logs, nome
de registros de históricos de alterações feitas em sistemas de tecnologia da
informação. O próprio Google confirma a existência dessas opções.
“Nossas plataformas oferecem aos anunciantes e agências
controles robustos que permitem o bloqueio de categorias, palavras-chave e
sites específicos, além de gerarem relatórios em tempo real sobre onde os
anúncios foram exibidos. Isso é importante, pois entendemos que os anunciantes
podem não desejar seus anúncios atrelados a determinados conteúdos, mesmo
quando estes não violam nossas políticas”, disse, em nota enviada como resposta
a perguntas sobre os destinatários finais da verba de publicidade e o controle
exercido pelos anunciantes.
Esses logs podem ser pedidos ao comprador dos anúncios
– o governo – pela CPMI e pelos órgãos de controle – o Tribunal
de Contas da União ou o Ministério Público Federal, por exemplo.
O MPF já está na história. Em maio, foi aberto inquérito para investigar Fabio Wajngarten pela
suspeita de direcionar verba do governo a sites de fake news que apoiam o
governo Bolsonaro. Os procuradores veem “impacto na liberdade de expressão e de
imprensa de uma forma geral, pela potencialidade de inibição de reportagens
investigativas e críticas sobre a atual administração, o que significa censura,
ainda que por outros métodos”.
Correção: 14 de agosto, 11h20
Uma versão anterior desse texto afirmava que executivos
do Google haviam sido convidados a prestar esclarecimentos para a CPMI das fake
news após a descoberta de que R$ 2 milhões de propaganda oficial foram parar em
sites de “conteúdo inadequado”. Na verdade, o convite já havia sido feito antes
disso. O texto foi corrigido.