Pesquisadores destacam ativismo de ultradireita em discurso, com islamofobia e mentiras sobre meio ambiente
A participação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na
Assembleia Geral da ONU nesta terça-feira (21) reforça o isolamento do Brasil,
derruba a tese de uma suposta moderação do novo ministro das Relações
Exteriores e demonstra o uso da religião como arma política, afirmam
professores de relações internacionais ouvidos pela Brasil de Fato.
Ao abrir a 76ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova
York, Bolsonaro disse "não entender" porque outros países não apoiam
o "tratamento precoce" contra a covid-19, afirmou que acredita em
Deus e distorceu dados sobre a realidade econômica brasileira e a política
ambiental de seu governo.
O presidente brasileiro disse que oferecerá visto
humanitário para "cristãos, mulheres, crianças e juízes afegãos" do
Afeganistão. O país atravessa um período turbulento após o
fim da invasão dos Estados Unidos e a retomada do poder pelo grupo
fundamentalista Talibã.
Leia mais: Em NY, Bolsonaro encontra presidente de extrema direita da
Polônia
Para Roberto Goulart Menezes, professor do Instituto de
Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), a proposta reforça a
afinidade ideológica de Bolsonaro com Steve Bannon, estrategista da campanha do
ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e articulador da extrema direita
global.
Em 2020, a conta de Bannon no Twitter foi suspensa após ele
sugerir a decapitação de Anthony Fauci, especialista em doenças infecciosas dos
Estados Unidos.
Bolsonaro segue a "lógica da cartilha do Steve Bannon,
de tal modo que ele quer disputar os valores religiosos mundo afora. A ideia de
que os afegãos que ele vai receber primeiro têm que mostrar não estar vivendo
ou sofrendo uma situação humanitária lamentável, primeiro qual é a fé que ele
propaga", avalia Menezes.
O professor de relações internacionais da Universidade
Estadual Paulista (Unesp), Luís Alexandre Fuccille, destaca a islamofobia
da proposta bolsonarista.
"O que se percebe nesse discurso, com relação ao
Afeganistão especificamente, é a islamofobia do presidente Bolsonaro, ou seja,
o que está presente aí é que muçulmanos são terroristas, então muçulmanos
não são bem vindos no Brasil, cristãos sim seriam, entre aspas, pessoas de bem.
Então mulheres, juízes, contanto que sejam cristãos, poderiam pedir refúgio
nesse maravilho país tropical", analisa o professor da Unesp.
Os dois analistas concordam que a participação do Brasil na
Assembleia Geral da ONU reforça o isolamento diplomático nacional.
Discurso sobre meio ambiente não convence
Bolsonaro também tentou pintar o Brasil como exemplo de
preservação da Amazônia, dizendo que o país tem uma "moderna e sustentável
agricultura de baixo carbono" ao mesmo tempo que defendeu sua política ambiental.
Apesar da fala de Bolsonaro sobre uma suposta conservação da
Amazônia, a destruição avança nesse importante bioma do clima global. De acordo
com dados compilados pelo Observatório do Clima, o desmatamento cresceu por
dois anos consecutivos na gestão em curso e deve registrar nova alta anual.
"Nos cinco anos anteriores ao governo Bolsonaro, a
média de desmatamento na Amazônia foi de 6.719 km2, segundo o Inpe.
Já nos dois primeiros anos da atual gestão a média foi de 10.490 km2,
um aumento de 56%. Os dados de 2021 serão divulgados apenas no fim do ano, mas
devem ficar novamente em torno de 10 mil km2, como já admitiu o
vice-presidente Hamilton Mourão", registra o Observatório do Clima.
Para Menezes, Bolsonaro segue sendo "percebido
internacionalmente como um inimigo do meio ambiente", afinal o presidente
brasileiro cogitou tirar o Brasil do Acordo de Paris e o Fundo Amazônia está
suspenso.
"Mais uma vez o Brasil desperdiça a oportunidade de
abrir a Assembleia Geral da ONU, ter uma audiência mundial para simplesmente
afirmar o que mundo inteiro já sabe: Bolsonaro é um mentiroso", avalia o
professor da UnB.
Edição: Arturo Hartmann
Fonte: Brasil de Fato
DW Brasil
Bannon festeja Bolsonaro: "Um dos políticos mais
importantes do mundo".