Essas doses são adquiridas com desconto de 25%, o que gerará
uma economia de cerca de R $ 480 milhões.
RIO DE JANEIRO, 13 de junho. / TASS /. As
primeiras 3 milhões de doses da vacina contra o Janssen contra o coronavírus
chegarão ao Brasil no dia 15 de junho, ao final do prazo de validade do
medicamento. O anúncio foi feito no sábado pelo Ministério da Saúde da
república.
“Essas doses estão sendo compradas com um desconto de 25%, o
que vai economizar cerca de R $ 480 milhões (cerca de US $ 94 milhões). Eles
têm uma vida útil mais curta, mas o FDA permitiu que fosse prorrogado”, - disse
o chefe da da Ministra da Saúde, Marcelo Queiroga, em entrevista coletiva.
Segundo o ministro, o governo brasileiro terá que pagar
apenas as doses que serão utilizadas. Por questões logísticas, o Janssen
só será utilizado nos centros administrativos dos estados da república
sul-americana, explicou Queiroga.
A vacina expira no dia 27 de junho, mas a Agência Nacional
de Vigilância Sanitária (Anvisa), seguindo o FDA, pode autorizar a prorrogação
de seu prazo de validade por mais 6 semanas, até o dia 8 de agosto. A
reunião do regulador farmacêutico brasileiro deve ocorrer na próxima semana,
disse o ministério.
A vacinação contra o coronavírus começou no Brasil em 18 de janeiro. No momento, os medicamentos são usados pela empresa sueco-britânica AstraZeneca e pela Universidade de Oxford, a empresa chinesa Sinovac Biotech e a americana Pfizer. Mais de 23,6 milhões de pessoas já foram vacinadas com duas doses da vacina e mais de 54,2 milhões receberam uma vacina. Em setembro, está prevista a conclusão da primeira etapa da campanha de vacinação e a vacinação de grupos prioritários da população (mais de 78 milhões de pessoas), entre médicos, idosos e portadores de doenças crônicas.
Conhecida pela alcunha de "Capitã Cloroquina", a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação em Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, depõe nesta terça-feira (25/05) à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid.
Mayra Pinheiro usou informações falsas para promover o
"tratamento precoce"
Com o depoimento da pediatra cearense, os senadores
pretendem entender melhor a atuação do governo de Jair Bolsonaro para promover
o chamado "tratamento precoce" — um coquetel de medicamentos sem
eficácia comprovada contra covid-19 que inclui substâncias como cloroquina,
azitromicina e invermectina.
Os parlamentares querem questioná-la, principalmente, sobre
sua atuação na liderança de uma comitiva do Ministério da Saúde ao Amazonas no
início do ano, quando o Estado sofreu um colapso do sistema de saúde, com falta
de leitos e de oxigênio para tratar o crescente número de pacientes com
covid-19.
Pinheiro, porém, obteve um habeas corpus do Supremo Tribunal
Federal que permite que ela fique calada sobre esses acontecimentos. Isso
porque a secretária é alvo de uma ação de improbidade administrativa que
investiga a omissão de autoridades diante do colapso do sistema de saúde do
Amazonas.
O habeas corpus foi concedido porque a Constituição garante
o direito ao investigado de não produzir prova contra si mesmo.
O objetivo dessa ação de improbidade administrativa é
verificar se autoridades "omitiram-se no cumprimento de seus deveres, ao
retardar o início das ações do Ministério da Saúde no estado, ao não
supervisionar o controle da demanda e do fornecimento de oxigênio medicinal nas
unidades hospitalares do Amazonas, ao não prestar ao Estado a necessária
cooperação técnica quanto ao controle de insumos, ao retardar a determinação da
transferência de pacientes à espera de leitos para outros Estados, ao realizar
pressão pela utilização 'tratamento precoce' de eficácia questionada no
Amazonas e ao se omitir em apoiar o cumprimento das regras de isolamento social
durante a pandemia".
No dia 10 de janeiro, quando a comitiva do Ministério da
Saúde estava no Estado, o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), anunciou
que a situação era "dramática" e pediu de apoio ao governo federal
para transporte de cilindros do gás de outras regiões do Brasil.
No dia seguinte, porém, Pinheiro lançava em Manaus, ao lado
do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, a plataforma TrateCov e promovia como
solução para redução das internações de pacientes com coronavírus o
"tratamento precoce".
A secretária esteve na cidade antes, no dia 4 de janeiro,
como representante do ministério para "alinhar ações de fortalecimento da
pasta, para o enfrentamento da covid-19 no Amazonas", segundo registros da
sua agenda oficial.
Apesar do iminente desabastecimento de oxigênio, a principal
resposta liderada pela secretária à crise foi promover o uso de medicamentos
sem eficácia.
Segundo Pazuello disse à CPI na semana passada, o TrateCov
foi desenvolvido por sugestão de Pinheiro com o propósito de auxiliar médicos
no diagnóstico e tratamento da covid-19. Na prática, o aplicativo recomendava o
coquetel de medicamentos sem eficácia indiscriminadamente, até mesmo para
bebês.
A plataforma acabou sendo retirada rapidamente do ar após críticas,
e Pazuello hoje insiste que ela foi disponibilizada indevidamente por um
hacker, apesar de o governo ter oficialmente divulgado o TrateCov.
Ministério da Saúde reagiu à falta de oxigênio em Manaus
insistindo no uso da cloroquina
Na cerimônia em que anunciou o aplicativo em Manaus, Mayra
Pinheiro exaltou a ferramenta como uma forma de realizar diagnósticos rápidos
no lugar do uso de testes RT-PCR.
"Nós não podemos perder tempo diante do quadro
epidemiológico que hoje toma conta do Estado do Amazonas e de diversos Estados
brasileiros. Nós estamos apresentando para a sociedade um aplicativo que
permite, como eu disse, com forte valor preditivo, dizer se o doente, diante
das suas manifestações clínicas, ele tem ou não a covid-19", sustentou.
"E assim nós podemos, no período de cinco minutos, com
a utilização desse aplicativo, que já pode ser acessado através das páginas do
Ministério da Saúde, nós poderemos ofertar imediatamente para milhões de
brasileiros o tratamento precoce, evitando que essas pessoas evoluam para
quadros mais graves e que elas necessitem de novos leitos já escassos em todo o
país", acrescentou.
Na ocasião, ela fez ainda uma apelo a "todos os
prefeitos do Estado do Amazonas" para que adotassem o tratamento
precoce".
"Por mais que nós tenhamos em breve a vacina disponível
para toda a população brasileira, não há tempo a perder. Precisamos evitar
novos óbitos", disse também.
Pinheiro está no atual cargo desde o início do governo,
tendo sido nomeada na gestão do primeiro ministro da Saúde do presidente Jair
Bolsonaro, Luiz Henrique Mandetta. Sua escolha, porém, é atribuída diretamente
Palácio do Planalto, o que se refletiu na sua permanência na pasta apesar do
troca-troca de ministros.
Mandetta deixou o governo em abril de 2020, tendo sido
substituído por Nelson Teich, que durou menos de um mês no cargo — ambos
disseram ter saído do governo por não concordar com Bolsonaro na defesa da
cloroquina e na crítica ao distanciamento social.
Foi justamente com a ascensão do general Eduardo Pazuello ao
comando da pasta que Pinheiro ganhou mais projeção, ao se alinhar integralmente
ao presidente e ao ministro a favor do "tratamento precoce".
Com a militarização do ministério por Pazuello, a secretária
se tornou uma das poucas pessoas com formação médica em postos de comando na
pasta da Saúde.
Pinheiro, que se coloca como uma "técnica" no
governo, se alinha a posicionamentos de Bolsonaro sem base científica
Em sua conta no Instagram, que conta com 16,5 mil
seguidores, Pinheiro diz que tem "uma vida inteira dedicada à
medicina".
"São mais de 30 anos de estudos, mestrados e
doutoramentos até chegar ao Ministério da Saúde", diz ainda a descrição.
Apesar do plural, seu currículo na plataforma Lattes aponta
um mestrado na Universidade de São Paulo, título obtido em 2002 com a tese
"Morbidade Neonatal e pós-neonatal de crianças de alto-risco nascidas no
Hospital Geral Dr. César Cals em Fortaleza".
Além disso, indica que a secretária cursa desde 2016 um
doutorado em Bioética pela Universidade do Porto (Portugal). Procurada pela BBC
News Brasil, a instituição disse que Pinheiro está no terceiro ano do programa.
Natural de Fortaleza, ela se formou em medicina em 1991 na
Universidade Federal do Ceará e presidiu o Sindicato dos Médicos do Ceará entre
2015 e 2018.
Se projetou publicamente como opositora do programa Mais
Médicos, implementado em 2013 pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
Sua principal crítica era contra a vinda de médicos cubanos
sem a revalidação do diploma de medicina no Brasil. Pinheiro nega, porém, ter
participado do protesto que chamou os profissionais cubanos de escravos durante
seu desembarque no aeroporto de Fortaleza.
Ela se filiou ao PSDB e disputou sem sucesso duas eleições —
em 2014 tentou um mandato de deputada federal e, em 2018, concorreu ao Senado.
Terminou em quarto lugar com 11,37% dos votos.
Depois, ingressou no partido Novo, mas, segundo o jornal
Folha de S.Paulo, ela deixou a sigla após lideranças do partido, como João
Amoedo, passarem a defender o impeachment de Bolsonaro.
Informações falsas na defesa da cloroquina
Desde o início da pandemia, a secretária foi ativa em
defender o uso de medicamentos ineficazes contra a covid-19 e na crítica ao
isolamento social.
Bolsonaro empunha uma caixa de cloroquina - remédio não tem
eficácia comprovada contra covid-19
Em entrevista concedida em abril de 2020 ao canal no YouTube
da Associação Brasileira de Psiquiatria, por exemplo, ela compara a
recomendação para que a população fique em casa (com objetivo de reduzir o
contágio do coronavírus) à perda de liberdade de pessoas presas.
Na mesma ocasião, a secretária disse que já existiam estudos
amplos e com rigor científico aprovando a eficácia da hidroxicloroquina
associada à azitromicia. Pesquisas realizadas até o momento, porém, apontam
justamente o contrário.
"A gente já tem estudos com 600, com 500 pacientes que
mostram, (estudos) randomizados, duplo-cegos, controlados, mostrando a taxa de
sucesso muito alta. Mostrando que a gente tem sim agora a possibilidade de
iniciar, quando as pessoas começam a ter sintomas, iniciar o uso dessa
medicação hidroxicloroquina associada à azitromicina", afirmou na ocasião.
Estudos randomizados e controlados são pesquisas científicas
em que os voluntários são distribuídos aleatoriamente em dois grupos (os que
recebem o medicamento testado e os que recebem placebo). E duplo-cego significa
que nem os voluntários nem os médicos sabem previamente as pessoas que tomaram
cada uma dessas substâncias.
São técnicas consideradas fundamentais em pesquisas sérias.
Já existem diversos estudos desse tipo que atestam a ineficácia da
hidroxicloroquina contra a covid-19. Um deles é o do Recovery Trial, feito no
Reino Unido. Numa análise de mais de 4.500 pacientes hospitalizados, o uso de
hidroxicloroquina e azitromicina não trouxe benefício algum.
Um painel de especialistas internacionais da Organização
Mundial da Saúde (OMS) concluiu, em março deste ano, que o medicamento não
previne a infecção, fazendo uma "forte recomendação" para que não
seja usado. Esta forte recomendação é baseada em seis estudos clínicos com
evidências de alto nível que somam mais de 6 mil participantes.
Também não há evidências de que a ivermectina, fármaco usado
no tratamento de parasitas como piolho e sarna, ajude no tratamento da
covid-19. Os estudos disponíveis até agora são inconclusivos.
Por isso, a Agência Europeia de Medicamentos é contrária ao
uso de ivermectina no tratamento da covid-19. Após revisar as publicações sobre
o medicamento, a agência considerou que os estudos possuíam limitações, como
diferentes regimes de dosagem do medicamento e uso simultâneo de outros medicamentos.
"Portanto, concluímos que as atuais evidências
disponíveis são insuficientes para apoiarmos o uso de ivermectina contra a
covid-19", concluiu a agência.
A própria fabricante da ivermectina, a farmacêutica MSD,
afirmou em fevereiro que não existem evidências de que o medicamento tivesse
efeito contra a covid-19.
A cloroquina foi peça fundamental na propaganda negacionista
de Bolsonaro e um dos motivos de ele trocar médicos por um general no comando
do Ministério da Saúde
A CPI da Covid, no Senado, começa nesta semana a colher os
primeiros depoimentos, ouvindo os ex-ministros da Saúde de Bolsonaro — Luiz
Henrique Mandetta, Nelson Teich e Eduardo Pazuello —, além do atual ocupante da
pasta, Marcelo Queiroga, e do presidente da Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres.
As audiências serão uma oportunidade de, entre outras
coisas, explicar ao país por que Jair Bolsonaro defendeu tanto o uso da
hidroxicloroquina e outras drogas sem eficácia, o famigerado Kit Covid. Hoje,
já ficou claro que o atual presidente nunca se importou com o fato de os
remédios funcionarem ou não contra o novo coronavírus. A principal função
desses medicamentos sempre foi dar aos brasileiros uma falsa sensação de
segurança.
Como já mostrado aqui na série Réu Confesso,
Bolsonaro implementou a assassina estratégia de “imunização de rebanho”. Por
isso precisava que a população acreditasse no engodo da cloroquina e não se
protegesse em casa, ajudando-o a alcançar logo a meta de infectar “60% ou 70%
das pessoas”, como não se cansou de repetir. Em outras palavras, a cloroquina
era uma peça chave da propaganda
negacionista posta em prática pelo atual presidente.
Dessa maneira, Bolsonaro passou a pressionar o Ministério da
Saúde para recomendar oficialmente o uso da cloroquina. O problema é que nem
mesmo Luiz Henrique Mandetta nem Nelson Teich, médicos que aceitaram participar
de um governo cuja política de saúde passava pelo desmonte do Sistema Único de Saúde (SUS) e pela extinção de programas como o Mais Médicos, quiseram sujar
suas reputações recomendando um remédio sem eficácia e que, ainda por cima,
representa riscos à saúde.
Assim, tanto Mandetta quanto Teich deixaram o cargo quando a
pressão pela recomendação oficial da cloroquina ficou muito grande. E a
exposição desse motivo preocupa o governo, tanto que a Casa Civil da
Presidência da República, ao elaborar a lista de crimes pelos quais Bolsonaro poderia ser acusado na
CPI da Covid, anotou, no item 21: “O Presidente Bolsonaro pressionou
Mandetta e Teich para obrigá-los a defender o uso da Hidroxicloroquina”.
Quatro meses mais tarde, em setembro de 2020, Mandetta
lançou o livro Um paciente chamado Brasil, no qual expôs todo o
plano de Bolsonaro para usar a cloroquina como armas da imunização de rebanho:
“Nunca na cabeça dele houve a preocupação de propor a
cloroquina como um caminho de saúde. A preocupação dele era sempre ‘Vamos dar
esse remédio porque, com essa caixinha de cloroquina na mão, os trabalhadores
voltarão à ativa. (…) O projeto dele para combate à pandemia é dizer que o
governo tem o remédio e quem tomar o remédio vai ficar bem. Só vai morrer quem
ia morrer de qualquer maneira”.
Bolsonaro troca médico por general
Teich e Mandetta aceitaram conviver com os absurdos de
Bolsonaro até chegar ao ponto em que precisaram escolher entre manter-se em um
governo assassino e preservar a reputação como médicos. Percebendo isso, o
presidente decidiu colocar à frente do Ministério da Saúde Eduardo Pazuello,
que não é médico, mas um general que se mostrou disposto a ajudá-lo em sua
política de morte.
Bolsonaro questiona CPI da Covid: “Vai investigar o quê?”
O presidente Jair Bolsonaro criticou a CPI da covid: “Vai investigar o quê? Eu dei dinheiro para os caras”, disse o presidente, que ainda voltou a defender o uso da cloroquina contra a covid-19 pic.twitter.com/R65u5dx5dQ
Isolado e na mira da CPI da Covid-19, o ex-ministro Eduardo
Pazuello perdeu boa parte do apoio e solidariedade que tinha dos militares
247 - Na mira da CPI da Covid-19 instaurada no
Senado, o ex-ministro Eduardo Pazuello perdeu boa parte do apoio e
solidariedade que tinha da caserna no período em que estava no comando da
Saúde. A informação é da coluna Radar, do portal Veja.
Quando virou alvo do STF e da Polícia Federal por
incompetência na condução do combate à pandemia, o general chegou a receber
suporte da cúpula militar, a partir da gestão de Fernando Azevedo, então
ministro da Defesa.
No entanto, o avanço de Bolsonaro contra Azevedo e os chefes
das Forças Armadas fez com que Pazuello, o pivô da crise, conquistasse o
isolamento na caserna.
CPI
A CPI da Covid dará início nesta semana à fase de tomada de
depoimentos de ex-integrantes do governo Jair Bolsonaro. Nesta
terça-feira (3) serão ouvidos os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta e
Nelson Teich. Na quarta, o general Eduardo Pazuello, que ficou à frente da
pasta por dez meses. Na quinta-feira serão ouvidos o atual ministro da Saúde,
Marcelo Queiroga, e o presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa), Antônio Barra Torres. Para o relator da CPI, senador Renan Calheiros
(MDB-AL), “essa semana será decisiva porque vamos ter depoimentos dos
principais atores sobre os bastidores da pandemia”.
Irresponsabilidade de Pazuello reflete na
vacinação
Às vésperas da CPI, Pazuello desfila sem máscara em Shopping em Manaus, cidade onde foi omisso na crise da falta de oxigênio. Questionado sobre o uso da máscara, debochou: “sabe onde tem para vender?”
Desde o primeiro caso confirmado de covid-19 no Brasil, no
fim de fevereiro de 2020, a rotina dos profissionais de saúde mudou. Com o
aumento de infecções e mortes pela doença, médicos e enfermeiros na linha de
frente dos atendimentos passaram a viver o período mais difícil de suas
carreiras.
"Existe uma exaustão entre esses profissionais de saúde
há mais de um ano. É um estresse 24 horas, como a gente nunca viveu. É uma
exaustão física e emocional. Estamos trabalhando 24 horas salvando vidas",
diz o cardiologista Roberto Kalil, presidente do Conselho Diretor do Instituto
do Coração em São Paulo.
Nesta quinta-feira (29/04), o Brasil atingiu a marca de 400
mil mortes pela covid-19, em meio ao seu mês mais letal da pandemia — em abril
já foram registradas mais de 75 mil mortes pela doença, enquanto em março deste
ano, até então o período com mais óbitos, foram 66 mil.
Em meio às centenas de milhares de mortes, os profissionais
de saúde acompanham diversas cenas que ilustram a tragédia do novo coronavírus.
Despedidas, mortes por falta de recursos básicos e óbitos de
diferentes integrantes da mesma família são algumas das situações que marcam os
trabalhadores na linha de frente.
"É o pior período para a saúde mental dos profissionais
de saúde. Muitos médicos pararam de dar plantão ou diminuíram o ritmo de
trabalho porque estavam muito estressados. Tem sido um período muito grande de
estresse", relata o médico intensivista José Albani de Carvalho.
Os profissionais de saúde relatam que cenas difíceis de
serem esquecidas se tornaram cada vez mais comuns em meio à pandemia. Para
dimensionar a tragédia vivida no país de 400 mil mortes pela doença, a BBC News
Brasil pediu para médicos relatarem algumas das situações mais dramáticas que
presenciaram desde o ano passado.
'Vimos um paciente morrer atrás do outro'
Em janeiro, Manaus viveu tragédia da falta de oxigênio
medicinal. Caso se tornou alvo de investigação
O médico cirurgião Pierre Oliva Souza nunca esquecerá as
cenas que presenciou no plantão que começou da noite de 14 de janeiro até o dia
seguinte, em uma unidade de saúde em Manaus, no Amazonas.
Ele chegou para o plantão no Serviço de Pronto Atendimento
(SPA) Joventina Dias por volta das 19h. Na unidade, logo foi informado por um
colega que não havia estoque de oxigênio medicinal — item fundamental para
auxiliar pacientes com dificuldades respiratórias, como aqueles com quadro
grave de covid-19.
"Havia apenas dois cilindros de oxigênio, que durariam
por algumas horas somente, porque a unidade estava lotada. Normalmente, havia
20 pacientes com suspeita de covid-19 que precisavam desse oxigênio, mas
naquele período tinha mais de 40", relata o médico.
Ele conta que alguns gestores da região falaram que logo
chegaria um caminhão carregado com oxigênio. "Deram falsas esperanças,
porque isso não era verdade. Não havia oxigênio em lugar nenhum de Manaus,
porque também faltou no mesmo dia em outras dezenas de unidades do Amazonas",
comenta.
Na madrugada de 15 de janeiro, o oxigênio acabou
completamente no SPA Joventina Dias. "Ninguém tinha avisado, dias
antes, que o estoque de oxigênio estava acabando no Estado. Foi muito chocante
para todo mundo", diz Souza.
"A gente sabia o quanto essa falta de oxigênio seria
danosa e grave. O governador chegou a comentar, na semana anterior, que o
Estado estava à beira de uma crise de oxigênio, por causa do aumento de casos
de covid-19. Mas nós, profissionais de saúde, não tínhamos noção de como, de
fato, a situação estava", diz o médico.
"Por causa da falta de oxigênio, a equipe de saúde teve
que assumir a difícil decisão de quem vai sobreviver ou morrer por conta da
absoluta falta de estrutura. Vimos um paciente morrer atrás do outro naquela
madrugada. Eles definhavam, buscavam respirar, ficavam com a coloração azulada
e morriam asfixiados na nossa frente. Não tínhamos o que fazer", relata
Souza.
Segundo Souza, somente no SPA Joventina Dias foram
contabilizadas oito mortes naquela madrugada. O médico relata que, normalmente,
havia duas ou três mortes por plantão. "Sei de lugar que registrou mais de
20 mortes por causa da falta de oxigênio", comenta.
A situação no Amazonas se tornou notícia em todo o mundo.
Diversos pacientes foram transferidos para outros Estados. Posteriormente, a
cidade recebeu abastecimentos de oxigênio. "A situação foi normalizada
depois. Hoje as coisas estão bem, principalmente porque os números de
internações caíram nas últimas semanas", diz o médico.
Apurações apontam que a falta de oxigênio causou dezenas de
mortes no Amazonas em meados de janeiro.
Então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello afirmou, na época,
que foi avisado por volta de 8 de janeiro que o alto número de internações em
Manaus até quintuplicou o uso do oxigênio medicinal. Em razão disso, segundo
ele, o Ministério da Saúde logo passou a tomar providências junto com o governo
estadual e a prefeitura.
De acordo com a CNN Brasil, o secretário de Saúde do Amazonas,
Marcellus Campelo, alegou, em depoimento à Polícia Federal que a falta de
oxigênio ocorreu porque a principal fornecedora do insumo no Estado informou
somente dias antes que não teria capacidade de atender a demanda na região, em
razão do aumento de internações.
Segundo o secretário, o governo local logo comunicou o
Ministério da Saúde e foram adotadas todas as medidas necessárias para o
"enfrentamento de uma crise de saúde sem precedentes na história do
Amazonas".
Em meados de abril, o Ministério Público Federal (MPF) do
Amazonas apresentou uma ação de improbidade administrativa por omissão sobre a
crise no fornecimento de oxigênio medicinal no Amazonas. Entre os alvos do
procedimento estão três secretários do Ministério da Saúde e o então responsável
pela pasta, general Eduardo Pazuello, e dois integrantes do governo do
Amazonas, entre eles o secretário estadual de Saúde, Marcellus Campelo.
O MPF apontou falhas como omissão no monitoramento da
demanda de oxigênio medicinal e adoção de medidas para evitar o
desabastecimento, além de demora nas transferências de pacientes para outros
Estados. O caso segue na Justiça Federal do Amazonas.
Mais de três meses depois, as cenas de meados de janeiro
agora fazem parte das piores lembranças da pandemia para os profissionais de
saúde do Amazonas.
"Eu vou superar, porque nosso trabalho pede, mas não
vou esquecer nunca. Apesar de todo ensinamento que tivemos na faculdade, nunca
pensei que fosse viver em tempos de paz aquilo que só acontece na guerra, que é
escolher quem vai viver ou morrer", desabafa Souza.
'Vi famílias dizimadas'
O médico intensivista José Albani de Carvalho, que atua em
Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) de hospitais da grande São Paulo, comenta
que algumas das situações mais tristes que presenciou envolvem as mortes de
membros de uma mesma família pela covid-19.
"Ver famílias inteiras morrendo foi uma das coisas que
mais me marcaram. Não foi uma, nem duas, nem três. Foram vários casos de
irmãos, pais e filhos ou outros parentes morrendo com diferenças de horas ou
dias. A grande verdade é que na minha vida inteira nunca tinha visto isso tão
frequentemente", desabafa o médico, que trabalha em UTIs há mais de 30
anos.
"Teve uma família em que morreram três irmãos em dois
dias. Dois deles estavam em leitos próximos. Isso impacta muito, porque você vê
uma família ser dizimada", diz o médico.
Ele detalha o caso de três mortes de pessoas na faixa dos 40
anos que eram da mesma família. "O rapaz foi intubado com covid-19. A
mulher dele foi internada, mas parecia que evoluiria bem e não precisaria ser
intubada. Mas é muito difícil saber, porque às vezes um paciente demora 10 dias
na UTI e você não sabe para onde ele vai, se vai melhorar ou piorar",
comenta Albani.
"O rapaz acabou morrendo. A mulher dele, que a gente
achava que daria alta em poucos dias, piorou também e foi intubada. Dias
depois, ela morreu. Depois, a irmã dela, que estava internada no hospital,
também faleceu", relata o médico.
O intensivista foi o responsável por contar sobre as mortes
à família. "Nunca é fácil comunicar isso, porque você acompanha essas
famílias e aquele sofrimento durante as internações, que muitas vezes duram
dias ou semanas", diz.
"Por incrível que pareça, esse comunicado para as
famílias acaba sendo algo que a gente se acostuma. Não é ser insensível, mas é
que há mais de 30 anos na UTI isso acaba se tornando algo do cotidiano. Mas
claro, quando você vai comunicar três mortes para uma mesma família, como tem
acontecido em alguns casos, é mais difícil", acrescenta Albani.
O médico comenta que os familiares dos pacientes sempre
reconhecem o trabalho dos profissionais de saúde.
Enquanto precisam enfrentar números de internações e mortes
como nunca tinham presenciado em período recente, os profissionais de saúde
também enfrentam o estresse causado pela falta de cuidados de muitos em relação
ao coronavírus.
"Do ponto de vista da sociedade em geral os
profissionais de saúde não são reconhecidos. Enquanto vemos as dificuldades, as
mortes e trabalhamos sob muito estresse, há muitas pessoas nas ruas que falam
que máscara é bobagem e fazem aglomerações. Olhar essas situações causa ainda
mais estresse a esses profissionais", desabafa Albani.
'Ficamos com medo de dar a notícia da morte da esposa'
'Nenhuma outra doença tinha esse agravante de muitas pessoas
da mesma família morrendo juntas. Os casos são impactantes', diz médica
Para a médica Luisa Frota Chebabo, um dos momentos mais
tristes da pandemia envolveu uma família completamente afetada pela covid-19.
Ela conta que foram internados mãe, pai e filho no mesmo dia em um mesmo
hospital público da capital do Rio de Janeiro, em novembro passado.
"A mãe (de 60 anos) chegou muito grave e foi intubada
no momento da admissão (no hospital). O pai e o filho estavam um pouco mais
estáveis", diz Luisa.
Ela comenta que os leitos de covid-19 estavam
sobrecarregados na unidade de saúde, por isso os três integrantes da mesma
família tiveram de ficar na área de emergência.
"O filho foi mantido em observação, sem precisar de
oxigênio suplementar. O pai necessitou do oxigênio. Os dois ficaram ao lado da
mãe, intubada em estado grave", detalha a médica.
Luisa conta que o pai, que tinha 62 anos, dizia para todos
os médicos que o filho havia frequentado festas e transmitiu a covid-19 para a
família.
No dia seguinte à internação, o pai foi internado em um
leito que ficou vago na enfermaria de covid-19. O filho, por volta dos 30 anos,
se recuperou e logo teve alta hospitalar. A mãe continuava em estado grave na
emergência.
"O pai foi internado com piora progressiva. Todos os
dias, ele perguntava pela esposa, que também estava piorando cada vez
mais", detalha a médica.
Dois dias após chegar na unidade de saúde, a mãe da família
morreu. "O marido dela, cada vez mais precisando de suplementação de
oxigênio, continuava perguntando pela esposa", diz Luisa.
"A gente falava para ele que não tinha como ver muitos
detalhes sobre ela, já que estava internada em outro setor. Mas a gente falava
que ela continuava intubada, mesmo após a morte dela", relata a médica.
"Esse paciente era bem ansioso, então ficamos com medo
de dar a notícia do falecimento e precipitar uma descompensação da parte
respiratória. A própria família falou que era melhor não dar a notícia enquanto
ele não melhorasse, por causa desse componente de ansiedade importante",
diz Luisa.
A equipe médica optou por informar sobre a morte da
companheira somente quando o homem apresentasse melhora clínica. Cinco dias
após o falecimento da esposa, ele foi intubado. Três dias depois, morreu.
"Somente o filho ficou bem", diz Luisa.
A médica comenta que histórias como a da família que ela
acompanhou em novembro demonstram a gravidade da covid-19 em comparação a
outras enfermidades. "Nenhuma outra doença tinha esse agravante de muitas
pessoas da mesma família morrendo juntas. Os casos são impactantes", diz a
médica.
Jovens internados
'No ano passado, a gente via pessoas mais velhas na UTI.
Agora vemos muitos jovens. Muita gente fica grave rapidamente'
O cardiologista Roberto Kalil, que está há mais de três
décadas na Medicina, não tem dúvidas de que tem vivido o período mais dramático
de sua carreira.
"O que impacta é a agressividade do vírus, que até
então (antes do início da pandemia) era algo inesperado. É uma agressividade
tanto na fase hospitalar como até, em alguns casos, depois da alta",
relata o médico, que atua em hospitais de São Paulo.
Uma das situações que mais impactaram Kalil foi quando
notou, neste ano, a explosão de casos de covid-19 e a gravidade que a doença
passou a ter também entre muitos pacientes mais jovens, que foram parar na UTI
ou até morreram.
"No ano passado, a gente via pessoas mais velhas na
UTI. Agora vemos muitos jovens. Muita gente fica grave rapidamente", diz à
BBC News Brasil.
Ele comenta que o agravamento do quadro entre os mais jovens
é em razão da variante P.1, descoberta em janeiro em Manaus. A maior incidência
entre os mais novos é uma das características associadas à nova variante.
A maioria dos casos registrados em 2021 em São Paulo, por
exemplo, se concentra entre pessoas de 20 a 54 anos. Na Grande São Paulo, dados
do início de março mostraram que 80% dos pacientes haviam sido infectados pela
P.1.
Dados do governo paulista apontam que na primeira onda da
pandemia mais de 80% dos leitos UTIs eram ocupados por idosos e portadores de
doenças crônicas. Agora, 60% das vagas são ocupadas por pessoas de 30 a 50
anos, a maioria sem doença prévia.
Essa variante do coronavírus é mais contagiosa, entre outros
motivos, por causa de mutações que facilitaram a invasão de células humanas. Essa
característica pode estar ligada a duas hipóteses que estão próximas de serem
confirmadas por cientistas: agravamento mais rápido
do quadro de saúde e maior letalidade.
Conforme mostrado em reportagem da BBC News Brasil em 19 de
abril, uma das principais hipóteses para que a nova variante afete duramente os
mais jovens é a busca tardia por atendimento, quando a doença está bastante
agravada, muitas vezes de forma silenciosa.
Um dos principais benefícios da busca por atendimento
antecipado é o uso do oxigênio medicinal, que pode ajudar a evitar um maior
comprometimento dos pulmões. Além disso, o acompanhamento médico logo nos
primeiros sintomas pode evitar maiores complicações em outros órgãos.
Para o cardiologista Roberto Kalil, o cenário da pandemia no
Brasil pode melhorar, aos poucos, com a vacinação. Porém, diante da falta de
prazo para o avanço da imunização, que ainda está na fase dos grupos
prioritários, ele avalia que os trabalhadores na linha de frente ainda devem
enfrentar muito estresse em decorrência da sobrecarga no sistema de saúde.
"Espero que o cenário melhore a cada semana, mas ainda
estamos longe de sair da pandemia', diz Kalil.
A pediatra em estado grave
'Ela, como médica, também percebeu que não estava evoluindo
bem', relata especialista
Entre as histórias que acompanhou desde o início da
pandemia, o médico Lucas Antony se recorda do caso de uma pediatra aposentada
que foi internada com a covid-19 em janeiro deste ano.
A idosa, de 85 anos, chegou ao hospital particular, na
capital Rio de Janeiro, com dificuldades respiratórias. "Ela foi internada
e usamos uma máscara de ventilação não-invasiva nela. Mas a paciente não estava
respondendo bem. Ela, como médica, também percebeu que não estava evoluindo
bem", diz Antony.
O quadro da aposentada se agravou e ela precisou ser
intubada no dia seguinte à chegada ao hospital. Antony afirma que a situação se
tornou mais difícil por se tratar de uma paciente que era médica e sabia da
gravidade de seu próprio quadro.
"Ela estava falando com a gente com a máscara de
oxigênio e debatendo o caso dela quando informamos que ela precisaria ser
intubada. Em certo momento, ela parou de falar, ficou olhando para frente e
disse que só queria ir para casa", relembra o médico.
Enquanto era intubada, a pediatra reparou em uma enfermeira
que a auxiliou. "Ela perguntou se a enfermeira já havia sido, na infância,
atendida em um determinado serviço médico. A enfermeira disse que não que ela
soubesse, mas a pediatra falou que lembrava dela", relata Antony.
Horas após a pediatra ser intubada, a enfermeira entrou em
contato com a mãe. "A mãe da enfermeira disse que ela levava a filha para
ser atendida naquele serviço (citado pela médica aposentada) na infância.
Então, provavelmente essa pediatra atendeu a enfermeira em algum momento",
conta o médico.
Dois dias após ser intubada, a pediatra aposentada não
resistiu às complicações da covid-19. O médico relata que ficou comovido com o
caso da paciente por ser uma médica que sabia que não resistiria à doença e
pela lembrança que ela teve da enfermeira. "Foi uma história que me
marcou", diz.
A gestão da crise sanitária no Brasil está no foco da imprensa francesa desta sexta-feira (9). Os jornais destacam o aumento vertiginoso de mortes pela Covid-19 e a inércia do governo brasileiro diante da epidemia.
"O Brasil se transforma em laboratório de variantes a
céu aberto e preocupa o mundo" é manchete no jornal Ouest France.
O diário destaca que a ausência de medidas coordenadas contra a propagação do
coronavírus faz com que o país seja não somente palco de uma tragédia local,
mas também de "uma nova ameaça para a situação sanitária mundial".
Citado pelo Ouest France, o neurocientista
brasileiro Miguel Nicolelis classifica o Brasil como "uma
bomba-relógio". Segundo ele, com cerca de 100 mil novos casos de Covid-19
por dia, a inação do governo está resultando em mutações importantes do vírus.
O jornal Les Echos classifica a gestão da
epidemia pelo presidente Jair Bolsonaro como "um desastre absoluto",
denunciado por todas as organizações médicas e científicas do mundo inteiro. O
diário lembra a posição do líder da extrema direita brasileira desde o início
da crise sanitária, classificando o coronavírus como uma
"gripezinha", ostentando seu posicionamento contra o uso de máscaras
e contra as vacinas, minimizando uma tragédia que resulta hoje em mais de 345
mil mortos, em pouco mais de um ano.
Os jornais franceses afirmam que a má gestão da crise
sanitária no Brasil é uma ameaça para o mundo inteiro. AP - Andre Penner
"Se a política de Bolsonaro é um pesadelo, a
persistência da doença no Brasil preocupa o mundo", afirma o diário,
lembrando que "a luta contra a Covid-19 deve ser feita de forma conjunta,
por todos os continentes".
Le Figaro destaca que, desde janeiro, a situação
se agrava no Brasil, quando milhares de pessoas morreram no Estado do Amazonas
devido à falta de oxigênio nos hospitais. Desde então, a falta de ação do
governo vem resultando em recordes diários de mortes. Na quinta-feira (8),
foram registrados 4.249 óbitos em um período de 24 horas.
O jornal Libération destaca a média diária
de 2.800 óbitos por Covid-19 no Brasil, "um número que cresce todos os
dias de forma desesperadora", diz. A crise está longe do fim: "em seu
relatório semanal, a Fiocruz explica que a tendência é que essa situação
perdure nas próximas semanas", conclui Libé.
RIO DE JANEIRO - Estimulado pela bravata maltratada e desequilibrada do presidente Jair Bolsonaro, a última onda de COVID do Brasil ameaça colocar o país em primeiro lugar entre os surtos de coronavírus mais letais do mundo.
Fornecido por The Daily Beast Carl De Souza / Getty
Profissionais médicos desesperados e autoridades locais que
estão lutando para neutralizar a antipatia de Bolsonaro por máscaras, bloqueios
e - até recentemente - vacinas disseram ao Daily Beast que o vírus agora está
completamente fora de controle e eles temem que o número de mortos continue a
explodir.
“A situação é desesperadora”, disse o Dr. Gerson Salvador,
que trabalha no pronto-socorro de um hospital de São Paulo ao The Daily
Beast. “E o que nos trouxe aqui é a atitude do presidente.”
Esta semana, o Brasil ultrapassou 4.000 mortes em um único
dia pela primeira vez desde o início da pandemia, há mais de um ano - e os
especialistas alertam que o pior ainda está por vir. Em todo o país,
cemitérios estão ficando sem espaço e algumas cidades abriram valas
comuns. Em São Paulo, as autoridades dizem que planejam enterrar as
vítimas em “sepulturas verticais” que parecem gavetas.
Bolsonaro - que afirmou que o COVID era apenas uma “pequena
gripe” no início da pandemia - lutou contra as medidas de isolamento,
argumentando que elas só prejudicam a economia. Sua maneira catastrófica
de lidar com a crise afetou seu índice de aprovação e o deixou politicamente
enfraquecido. Mas em um país onde milhões de trabalhadores trabalham no setor
informal - trabalhando como faxineiros, motoristas de táxi ou vendedores de
frutas - sua mensagem ainda ressoou em muitos trabalhadores frustrados.
Ainda assim, prefeitos e governadores desafiaram Bolsonaro,
tentando colocar algumas restrições em uma tentativa de diminuir as
infecções. Antes da Páscoa, cidades como o Rio de Janeiro impuseram
bloqueios parciais que fecharam bares, restaurantes e praias.
Mas essas medidas ainda são difíceis de vender para muitos
brasileiros. Diante da pressão de um eleitorado frustrado e de uma
economia em crise, as autoridades de vários estados - incluindo Ceará e Santa
Catarina - devem aliviá-los nos próximos dias.
No Rio de Janeiro, o prefeito Eduardo Paes reabriu escolas
em toda a cidade esta semana, depois de uma dura batalha judicial com rivais
que lutavam para manter o fechamento no local. Um bloqueio parcial de
empresas na cidade também está sendo suspenso na sexta-feira.
Com a falta de uma estratégia nacional e uma reabertura
prematura de muitas cidades, a catástrofe tende a se aprofundar, disse o Dr.
Paulo Pinheiro, vereador carioca do PSOL de esquerda e membro da comissão de
saúde da cidade.
“O que temos hoje é cada município e cada estado lidando com
a crise à sua maneira”, disse Pinheiro ao The Daily Beast. “Não tem como funcionar. E
a imagem é assustadora, sem nenhuma perspectiva melhor pela frente. ”
Em um hospital lotado em São Paulo, a Dra. Vanessa Dinis
atende um fluxo incessante de pacientes infectados com COVID-19. Sempre
que uma cama de terapia intensiva é liberada na sala de emergência onde ela
trabalha, ela é rapidamente preenchida por outro paciente com dificuldade para
respirar.
“É de longe a pior situação que já vivemos”, disse Dinis ao
jornal The Daily Beast durante um turno em um dos três hospitais paulistas onde
trabalha. “Estamos vendo famílias inteiras internadas em cuidados
intensivos”.
Dinis está entre os milhares de trabalhadores da saúde que
lutam na linha de frente da pandemia COVID-19 no Brasil, onde a crise saiu de
controle nas últimas semanas. O vírus já ceifou 341.000 vidas e infectou
mais de 13 milhões de brasileiros, no que está se tornando rapidamente o pior
surto do mundo.
O país agora está a caminho de ultrapassar o recorde
americano de média semanal de mortes estabelecido em janeiro (3.285), de acordo
com o Instituto de Métricas e Avaliação de Saúde da Universidade de Washington.
As infecções no Brasil explodiram parcialmente devido a uma
variante altamente infecciosa, que foi detectada pela primeira vez na cidade
amazônica de Manaus no início deste ano e, desde então, varreu o país com a
velocidade da luz, na ausência de medidas de distanciamento social.
Especialistas dizem que a variante, conhecida como P1, pode
ser capaz de driblar a imunidade, infectando até mesmo aqueles que já estavam
infectados com o vírus. Cada vez mais o perfil dos pacientes encaminhados
às pressas para o pronto-socorro também está mudando, diz Dinis, à medida que a
COVID-19 infecta os brasileiros mais jovens.
“Pais que já foram vacinados ou tiveram um caso mais leve de
COVID no ano passado”, disse ela. “Agora eles estão vendo seus filhos
hospitalizados e intubados.”
O aumento dramático de casos em todo o Brasil sobrecarregou
o sistema de saúde, levando-o ao colapso em algumas regiões. Isso deixou
os hospitais lutando por leitos de cuidados intensivos, suprimentos de oxigênio
e medicamentos essenciais. No hospital paulista onde trabalha Salvador, os
pacientes são atendidos em todos os cantos livres, inclusive consultórios e
corredores.
“Nas últimas semanas, não tivemos leitos para hospitalizar
pessoas”, disse Salvador ao The Daily Beast. “Tínhamos que colocar os
pacientes, mesmo os em estado grave, em espaços improvisados enquanto
aguardavam o leito da UTI.”
A capacidade da UTI está acima de 90 por cento em 21
capitais de todo o país, incluindo Belo Horizonte, Porto Alegre e Porto
Velho. No Distrito Federal de Brasília, os hospitais estão completamente
sem leitos de terapia intensiva. No estado do Rio de Janeiro, mais de 600
pessoas aguardam na fila para atendimento na UTI - uma lista de espera que é
três vezes a capacidade total do estado.
Em Vitória, cidade litorânea do Espírito Santo, o Dr. João
Ferraz disse que os hospitais onde trabalha estão lutando para conseguir os
medicamentos necessários para intubar os pacientes. Os leitos de cuidados
intensivos também são difíceis de encontrar no Espírito Santo, onde as taxas de
ocupação são de cerca de 93%.
“Está muito lotado, é quase impossível conseguir uma vaga”,
disse Ferraz em entrevista ao The Daily Beast antes de entrar no turno da
noite. “Às vezes, de manhã, não há camas. Então, à tarde, um paciente
recebe alta ou alguém morre. E esses espaços são preenchidos
imediatamente. ”
Nos hospitais onde Dinis trabalha, a capacidade de leitos da
UCI foi recentemente aumentada, aliviando um pouco a pressão sobre as
urgências. Mas ela diz que os hospitais de São Paulo - o estado com o
maior número de casos - agora enfrentam a falta de pessoal.
“Estamos lutando para cobrir os turnos nos hospitais”, disse
ela. “Eles estão aumentando o número de leitos, mas não aumentando o
número de profissionais de saúde”.
Médicos e enfermeiras, por sua vez, estão exaustos, disse
Ferraz. “Estamos completamente esgotados. E sem restrições mais
fortes ou uma vacina, nossas esperanças de ver uma melhora em breve estão
realmente se esvaindo. ”
No Brasil, a vacinação fica defasada em meio à escassez de
doses. O país tem lutado até agora para garantir vacinas suficientes para
imunizar sua população de 211 milhões, depois que Bolsonaro rejeitou acordos
com fabricantes de vacinas como China e Índia no ano passado. Até agora,
menos de 3% dos brasileiros receberam as duas doses.
Enquanto isso, Salvador diz que a única esperança do Brasil
de controlar a crise é finalmente impor medidas de bloqueio mais rígidas em
todo o país.
“A resposta não está no sistema de saúde - já atingimos o
limite. Não temos mais capacidade humana ”, disse ele.
“Precisamos de um bloqueio real, precisamos parar a
transmissão do vírus. Sem ele, as coisas só vão piorar no curto
prazo. E provavelmente perderemos muito mais vidas. ”
Drama nas favelas do Brasil: morrer de fome ou de covid-19
O Brasil é um dos países mais atingidos pela pandemia da
covid-19. E, se já não bastasse o caos sanitário, o país enfrenta ainda
desemprego elevado, alta nos preços dos alimentos e fome. Com a interrupção do
auxílio emergencial, muitos ficaram sem saber como alimentar suas famílias.
"Tem dias que não tem nem um pão", diz Célia
Gomes, moradora da favela de Paraisópolis, em São Paulo. "Eu acordo
agoniada. Dou um pulo da cama, a primeira coisa que eu faço é me benzer, e
agradecer a Deus que eu acordei viva."
Ante la alta demanda de entierros debido al aumento de la tasa de mortalidad por el covid-19, las autoridades brasileñas empezaron a cavar hasta 600 tumbas al día en cementerios municipales pic.twitter.com/buL7QSZxWX
O vírus já matou mais de 300.000 pessoas no Brasil, sua
propagação auxiliada por uma variante altamente contagiosa, brigas políticas e
desconfiança na ciência.
PORTO ALEGRE, Brasil - Os pacientes começaram a chegar aos
hospitais de Porto Alegre bem mais doentes e mais jovens do que antes. As
casas funerárias estavam experimentando um aumento constante nos negócios,
enquanto médicos e enfermeiras exaustos imploravam em fevereiro por um bloqueio para salvar vidas.
Mas Sebastião Melo, prefeito de Porto Alegre, argumentou que
havia um imperativo maior.
“Coloque sua vida em risco para que possamos salvar a
economia”, apelou Melo a seus eleitores no final de fevereiro.
Agora, Porto Alegre, uma cidade próspera no sul do Brasil,
está no centro de um colapso impressionante do sistema de saúde do país - uma
crise prevista.
Após mais de um ano de pandemia, as mortes no Brasil estão
no auge e variantes altamente contagiosas do coronavírus estão varrendo o país,
possibilitadas por disfunções políticas, complacência generalizada e teorias da
conspiração. O país, cujo líder, o presidente Jair Bolsonaro, minimizou a
ameaça do vírus, agora está relatando mais casos novos e mortes por dia do que
qualquer outro país do mundo.
“Nunca vimos uma falha do sistema de saúde dessa magnitude”,
disse Ana de Lemos, diretora executiva do Médicos Sem Fronteiras no Brasil. “E
não vemos uma luz no fim do túnel.”
Fabricante de caixões em Porto Alegre.
Coveiro trabalhando no cemitério Jardim da Paz, em Porto
Alegre.
Na quarta-feira, o país ultrapassou 300.000 mortes de
Covid-19, com cerca de 125 brasileiros sucumbindo à doença a cada
hora. Autoridades de saúde em hospitais públicos e privados estavam
lutando para expandir as unidades de cuidados intensivos, estocar suprimentos
cada vez menores de oxigênio e adquirir escassos sedativos para intubação que
estão sendo vendidos a um preço exponencial.
Unidades de terapia intensiva em Brasília, a capital, e 16
dos 26 estados brasileiros relatam uma terrível escassez de leitos disponíveis,
com capacidade abaixo de 10 por cento, e muitas estão experimentando contágio
crescente (quando 90 por cento desses leitos estão ocupados, a situação é
considerada terrível).
No Rio Grande do Sul, estado que inclui Porto Alegre, a
lista de espera por leitos em unidades de terapia intensiva dobrou nas últimas
duas semanas, para 240 pacientes graves.
No Hospital Restinga e Extremo Sul, um dos principais
centros médicos de Porto Alegre, o pronto-socorro virou uma enfermaria Covid
lotada, onde muitos pacientes eram atendidos em cadeiras, por falta de leito
livre. Na semana passada, os militares construíram um hospital de campanha
em frente à entrada principal, mas funcionários do hospital disseram que o espaço
adicional para leitos é de pouca utilidade para uma equipe médica que está além
de seu limite.
Pacientes com diagnóstico de Covid-19 em um hospital de
campanha montado pelos militares em frente à entrada principal do Hospital
Restinga e Extremo Sul.
Funcionários do hospital disseram que o espaço adicional
para leitos é de pouca utilidade para uma equipe médica que está além de seu
limite.
“Todo o sistema está à beira do colapso”, disse Paulo
Fernando Scolari, diretor do hospital. “As pessoas estão chegando com sintomas
mais sérios, níveis mais baixos de oxigênio e precisam desesperadamente de
tratamento”.
O colapso é um fracasso total para um país que, nas últimas
décadas, foi um
modelo para outras nações em desenvolvimento , com a reputação de
apresentar soluções ágeis e criativas para crises médicas, incluindo um aumento
nas infecções por HIV e o surto de Zika.
Melo, que fez campanha no ano passado com a promessa de
suspender todas as restrições à pandemia na cidade, disse que um bloqueio faria
com que as pessoas morressem de fome.
“Quarenta por cento de nossa economia, nossa força de
trabalho, é informal”, disse ele em uma entrevista. “São pessoas que
precisam sair e trabalhar para comer alguma coisa à noite”.
O presidente Bolsonaro, que continua promovendo drogas
ineficazes e potencialmente perigosas para tratar a doença, também disse que os
bloqueios são insustentáveis em um país onde tantas pessoas vivem na
pobreza. Embora vários estados brasileiros tenham ordenado o fechamento de
empresas nas últimas semanas, não houve nenhum bloqueio estrito.
Alguns dos partidários do presidente em Porto Alegre
protestaram contra o fechamento de empresas nos últimos dias, organizando
caravanas que param do lado de fora dos hospitais e tocam suas buzinas enquanto
as alas de Covid transbordam.
Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro durante uma
manifestação na cidade de Canela organizada por líderes empresariais locais
contra o bloqueio.
Trabalhadores da saúde em frente ao Palácio Piratini, no
centro de Porto Alegre, durante manifestação organizada por sindicatos em favor
do bloqueio.
Epidemiologistas afirmam que o Brasil poderia ter evitado
bloqueios adicionais se o governo tivesse promovido o uso de máscaras e o
distanciamento social e negociado agressivamente o acesso às vacinas em
desenvolvimento no ano passado.
Em vez disso, Bolsonaro, um aliado próximo do ex-presidente
Donald J. Trump, chamou a Covid-19 de "gripe do sarampo", muitas
vezes encorajou grandes multidões e criou uma falsa sensação de segurança entre
os apoiadores ao endossar medicamentos antimalária e antiparasitários -
contradizendo as principais autoridades de saúde que advertiram que eles eram
ineficazes.
No ano passado, o governo de Bolsonaro rejeitou a oferta da
Pfizer de dezenas de milhões de doses de sua vacina Covid-19. Mais tarde,
o presidente comemorou
contratempos nos testes clínicos da CoronaVac, a vacina chinesa da
qual o Brasil passou a depender em grande parte, e brincou que as empresas
farmacêuticas não seriam responsabilizadas se pessoas que recebessem vacinas
recém-desenvolvidas se transformassem em crocodilos.
“O governo descartou inicialmente a ameaça da pandemia,
depois a necessidade de medidas preventivas e depois vai contra a ciência ao
promover curas milagrosas”, disse Natália Pasternak, microbiologista de São
Paulo. “Isso confunde a população, o que significa que as pessoas se
sentem seguras ao sair para a rua.”
Terezinha Backes, sapateira aposentada de 63 anos, residente
em município da periferia de Porto Alegre, foi extremamente cuidadosa no último
ano, aventurando-se apenas quando necessário, disse seu sobrinho, Henrique
Machado.
Mas seu filho de 44 anos, um segurança encarregado de medir
a temperatura das pessoas que entram em um centro médico, parece ter trazido o
vírus para casa no início deste mês.
A Sra. Backes, que estava com boa saúde, foi levada a um
hospital em 13 de março depois que começou a ter problemas para
respirar. Sem camas de sobra, ela foi tratada com oxigênio e uma
intravenosa no corredor de uma ala que transbordava. Ela morreu três dias
depois.
“Minha tia não teve o direito de lutar por sua vida”, disse
Machado, 29, um farmacêutico. "Ela foi deixada em um corredor."
Henrique Machado, à esquerda, sobrinho de Terezinha Backes,
falecida por Covid-19, em uma farmácia em São Leopoldo, município fora de Porto
Alegre.
Guaraci Machado, à direita, que se opõe a fechamentos ou
fechamentos de empresas por conta da pandemia, em sua casa funerária em São
Leopoldo ao receber o caixão de um homem falecido de Covid-19.
Seu corpo estava entre as pontuações que fizeram de março o
mês mais movimentado da história em uma funerária de um amigo da família,
Guaraci Machado. Sentado em seu escritório em uma tarde recente, Machado
disse que ficou impressionado com o número de pacientes jovens da Covid-19 que
foram trazidos para suas instalações em caixões nas últimas semanas.
Mesmo assim, Machado, 64, que tirou a máscara facial no meio
de uma entrevista, disse que se opõe a bloqueios ou fechamento de
negócios. Desde o início, disse ele, ele está convencido de que o vírus
foi criado pela China para que pudesse vender suprimentos médicos em todo o
mundo e, finalmente, desenvolver uma vacina lucrativa.
Quando ele teve Covid-19 em junho do ano passado, Machado
disse que tomou o medicamento anti-malária defendido pelo presidente,
hidroxicloroquina, ao qual ele credita "me manter vivo".
O Sr. Machado será elegível nas próximas semanas para uma
vacina contra Covid-19 no Brasil . Mas ele não receberá um
mesmo se for "espancado com um pedaço de pau", disse Machado,
observando que leu recentemente na Internet que as vacinas são mais letais que
o vírus.
Médicos intubando um paciente com Covid-19.
Um trabalhador de saúde verificando um paciente na unidade
de terapia intensiva para pacientes Covid-19 no Hospital Restinga e Extremo
Sul.
Essas teorias de conspiração sobre as vacinas contra Covid-19 se espalharam amplamente nas redes sociais, inclusive no WhatsApp e no Facebook. Uma recente pesquisa de opinião pública realizada pela empresa IPEC descobriu que 46% dos entrevistados acreditavam em pelo menos uma mentira amplamente disseminada sobre vacinas.
A desconfiança em vacinas e ciência é nova no Brasil e uma característica perigosa da era Bolsonaro, disse o Dr. Miguel Nicolelis, neurologista brasileiro da Universidade Duke que liderou uma força-tarefa contra o coronavírus no nordeste do país no ano passado.
“No Brasil, quando o presidente da república fala, as pessoas ouvem”, disse Nicolelis. “O Brasil nunca teve um movimento antivacinas - nunca.”
Mas muitos partidários radicais de Bolsonaro, que mantém o apoio de cerca de 30% do eleitorado, argumentam que os instintos do presidente sobre a pandemia foram sólidos.
Geraldo Testa Monteiro, bombeiro aposentado de Porto Alegre, elogiou o presidente enquanto ele e sua família se preparavam para enterrar sua irmã, Maria de Lourdes Korpalski, 70, que morreu de Covid-19 na semana passada.
Parentes e amigos de Maria de Lourdes Korpalski, 70, falecida de Covid-19, em seu funeral em Porto Alegre.
Os principais especialistas médicos do Brasil, Estados
Unidos e Europa disseram que esses medicamentos não são eficazes para tratar
Covid-19 e alguns podem ter efeitos colaterais graves, incluindo insuficiência
renal.
“Mentiras”, disse Monteiro, 63, sobre o consenso científico
sobre o kit Covid. “Existem tantas mentiras e mitos.”
Ele disse que profissionais médicos sabotaram o plano de
Bolsonaro de controlar a pandemia, recusando-se a prescrever essas drogas de
forma mais decisiva nos estágios iniciais da doença.
“Havia uma solução: ouvir o presidente”, disse
ele. “Quando as pessoas elegem um líder, é porque confiam nele.”
A desconfiança e as negações - e as caravanas de apoiadores
do Bolsonaro buzinando fora dos hospitais para protestar contra as restrições à
pandemia - são esmagadoras para os profissionais médicos que perderam colegas
para o vírus e para o suicídio nos últimos meses, disse Claudia Franco, a
presidente das enfermeiras sindicato gaúcho.
“As pessoas estão negando”, disse Franco, que tem cuidado de
pacientes da Covid-19. “A realidade em que estamos hoje é que não temos
respiradores suficientes para todos, não temos oxigênio para todos”.
Reportagem de Ernesto Londoño de Porto Alegre. Letícia
Casado reportou de Brasília.
Capitais de pelo menos seis estados brasileiros registraram
panelaços durante e após o pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro (sem
partido) em rede nacional na noite nesta terça-feira (23). Entre os sons de
panelas é possível ouvir gritos de "genocida" e "miliciano"