Novas mensagens revelam que procuradores da autodenominada
"força-tarefa da lava jato" ocultaram conversas interceptadas
envolvendo uma testemunha de acusação do caso do tríplex do Guarujá. Os
procuradores temiam que os diálogos pudessem "encaixar na tese do Lula de
que não quis o apartamento".
"Lava jato" omitiu interceptação por receio de
favorecer defesa de Lula - Foto: Ricardo Stuckert
A conversa ocorreu em 13 de setembro de 2016, na véspera do
Ministério Público Federal apresentar a denúncia contra o ex-presidente Lula
pelo caso do tríplex. O procurador Athayde Ribeiro Costa discutiu com os demais
membros da "força-tarefa", "especialmente Deltan"
(Dallagnol, então coordenador do grupo), se seria o caso de "utilizar
esse diálogo da Mariuza, objeto de interceptação".
Mariuza Aparecida Marques era funcionária da OAS e foi
convocada pelo MPF como testemunha de acusação no processo do tríplex. A
"força-tarefa" apontou Mariuza como responsável por acompanhar as
obras no apartamento. Ela apareceu em uma interceptação telefônica ao longo das
investigações, mas os procuradores decidiram não incluir a informação na
denúncia porque isso poderia beneficiar a defesa de Lula.
"Pessoal, especialmente Deltan, temos que pensar bem se
vamos utilizar esse diálogo da Mariuza, objeto de interceptação. O diálogo pode
encaixar na tese do Lula de que não quis o apartamento. Pode ser ruim para
nós", afirmou Athayde.
Em nova petição enviada pelos advogados do ex-presidente ao
Supremo Tribunal Federal, a defesa destaca a ocultação da interceptação
telefônica de Mariuza: "Note-se bem: havia uma interceptação telefônica
contra uma funcionária da OAS que foi ocultada porque poderia subsidiar a
defesa técnica do reclamante. Quantas provas de inocência do reclamante foram
ocultadas?".
Segundo a defesa de Lula, além da supressão de prova que
poderia beneficiar o réu, há outra ilegalidade flagrante revelada pelo diálogo:
a interceptação de uma pessoa investigada foi ocultada nos autos de origem (a
interceptação não consta no rol de terminais grampeados), para que ela fosse
tratada como testemunha de acusação.
Leia a conversa completa:
13 Sep 16
• 06:24:23 Devemos conversar com o russo. E fazer um pedido bastante
consistente. E esperar a decisão de descida. .........
• 10:48:20 Athayde Pessoal, especialmente Deltan, temos que pensar bem se vamos
utilizar esse dialogo da MARIUZA, objeto da interceptação. O dialogo pode
encaixar na tese do LULA de que não quis o apartamento. Pode ser ruim para nos.
• 10:48:20 Athayde Em 17/11/2015, MARIUZA APARECIDA MARQUES, funcionária da OAS
subordinada a ROBERTO MOREIRA e a FÁBIO YONAMINE, e que comparecia semanalmente
ao Condomínio Solaris para acompanhar as obras do triplex 164-A, em diálogo
telefônico interceptado com autorização judicial1, deixou claro que as reformas
feitas no imóvel foram feitas no interesse de MARISA LETÍCIA, e demonstrou a
necessidade de ocultar essa informação: SAMARA: Putz! E a dona Mariza devolveu
a cobertura, é isso? Tava no jornal outro dia? MARIUZA: É. Ela não quis pegar a
cota dela. É isso mesmo. SAMARA: É sério? Eles devolveram? MARIUZA: Devolveram.
Porque eles tinham cota né..da..cotas da BANCOOP. E aí ela por causa dessas...
SAMARA: Não, mas se ela reformou a cobertura dela toda lá no Guarujá? MARIUZA:
Pessoa, não pode falar, pessoa, aqui nesse telefone!
• 10:49:45 Jerusa Concordo com Athayde. eu não usaria esse dialogo. ao menos
nao na denuncia
Lava Jato omitiu interceptação telefônica, diz defesa de
Lula | SBT Brasil (01/03/21)
Procuradores da Operação Lava Jato em Curitiba omitiram, em
denúncia contra Lula, uma interceptação telefônica que poderia corroborar um
argumento do ex-presidente sobre o triplex do Guarujá. Isso é o que afirma a
defesa do petista.
Uma enorme coleção de materiais nunca revelados fornece um
olhar sem precedentes sobre as operações da força-tarefa anticorrupção que
transformou a política brasileira e conquistou a atenção do mundo.
'JANUÁRIO. VOCÊ SABE ALGUMA COISA SOBRE ISSO?'
O doleiro Dario Messer mudou sua versão sobre o alegado
pagamento de propina ao procurador Januário Paludo, ex-integrante da
força-tarefa da Lava Jato no Paraná, após conseguir uma delação premiada que o
livrou temporariamente da cadeia e lhe garantiu ao menos R$ 10 milhões em bens,
segundo conta do próprio Ministério Público Federal.
A suspeita de que Paludo recebeu propina para proteger
Messer a partir de 2005, no caso Banestado, está na primeira proposta de
delação premiada do doleiro. A colaboração dele foi assinada pela Lava Jato e
homologada pela justiça – mas sem o trecho que levanta suspeitas contra um dos
principais integrantes da força-tarefa paranaense.
O caso Banestado investigou o envio de dinheiro do Brasil
para contas no exterior usando contas no hoje extinto banco estatal paranaense.
Como na Lava Jato, uma força-tarefa foi criada no MPF do Paraná para apurar e
processar envolvidos. Paludo fez parte do grupo, assim como Deltan Dallagnol.
Messer foi um dos investigados, mas nunca foi punido. Na
primeira versão de sua delação, ele disse que escapou dos investigadores graças
a propinas. Depois, com os benefícios do acordo de delação garantidos, disse
ter se enganado a respeito de Paludo.
Graças à delação, Messer manteve R$ 3,5 milhões que tinha
numa conta nas Bahamas, um apartamento avaliado em R$ 3 milhões no Rio,
desbloqueou a herança da mãe e ainda deixou a prisão. Atualmente, ele cumpre
prisão domiciliar em Copacabana, bairro nobre da capital fluminense.
Já a suspeita contra Paludo jamais foi investigada pelos
colegas dele no MPF. Para a cúpula do órgão, bastou a explicação do procurador.
Mas ela contradiz o que o próprio Paludo disse à justiça, anos antes, e em
conversas mantidas com colegas pelo Telegram, a respeito do doleiro.
A equipe da Lava Jato na Procuradoria Geral da República, a
PGR, arquivou o relato de Messer sobre os alegados pagamentos a Paludo sem
investigá-lo, por considerá-lo inconsistente. Já a segunda versão contada pelo
doleiro sobre o caso, tomada como verdade pelos procuradores, baseou uma
denúncia encaminhada pela força-tarefa da Lava Jato do Rio à justiça em
dezembro passado.
Em vez de pagador de propinas, a denúncia transformou Messer
em vítima de um esquema de extorsão criado por seu ex-advogado e seu ex-sócio,
que vendiam ao doleiro uma “proteção” que jamais existiu quando disseram pagar
propina a Paludo. O advogado é Antonio Figueiredo Basto, negociador de várias
delações com Curitiba – entre elas, a do também doleiro Alberto Youssef,
crucial para o desenrolar da Lava Jato.
Dario Messer (de boné), o ‘doleiro dos doleiros’, no dia em
que foi preso pela Polícia Federal nos Jardins, região nobre de São Paulo.
Foto: Marcelo Gonçalves/Sigmapress/Folhapress
Na mira desde os anos 1980, Messer só foi preso em 2019
Messer atualmente é conhecido como o “doleiro dos doleiros”,
graças à Lava Jato do Rio. Ele é acusado pela força-tarefa de liderar uma rede
ilegal de câmbio que movimentou mais de 1,6 bilhão de dólares entre 2011 e 2017
– R$ 8,5 bilhões, na cotação atual. Trata-se, segundo a força-tarefa, de
uma quantia inédita.
Mas a atuação dele é mapeada pelas autoridades desde 1980,
quando já era investigado pela suspeita de atuar em
esquemas de lavagem de dinheiro. Primeiro, para bicheiros ligados a escolas de
samba. Depois, no caso Banestado, que teve como personagens o então juiz Sergio
Moro, Paludo e outros procuradores da Lava Jato. Mais tarde, ele apareceu no
mensalão petista e foi citado até em documentos do Swissleaks, que revelou uma
rede de evasão fiscal existente numa agência do HSBC na Suíça em 2006 e 2007.
Messer, no entanto, jamais havia sido preso até julho de
2019. Não que as autoridades não tenham tentado. Ao menos duas vezes, a justiça
brasileira decretou sua prisão. Mas o “doleiro dos doleiros” sempre arrumou um
jeito de escapar antes que a polícia tivesse tempo de encontrá-lo.
Na cadeia – e tentando sair dela o quanto antes –,
Messer resolveu confessar crimes. Na proposta de delação, ele assumiu a
investigadores da Lava Jato que só não foi detido por ordem da operação, em
2018, porque soube com antecedência da ação policial para pegá-lo.
Também confessou ter cometido os crimes investigados no caso Banestado, pelos
quais não havia sido punido. E, num relato específico, explicou como acredita
ter se livrado de suspeitas que pairavam sobre ele desde 2005.
É justamente nesse relato que Messer conta que nada disso
foi por acaso. “Dario sempre acreditou na efetividade da compra da ‘proteção’”,
resumiram seus defensores na primeira proposta de delação. Em outras palavras,
ele afirmou ter comprado proteção do Ministério Público Federal do Paraná, e
que parte dos pagamentos eram feitos a Paludo, um dos procuradores do caso
Banestado.
Messer relatou que, de 2005 a 2013, pagou 50 mil dólares
todo mês para que fosse blindado em investigações. Disse que entregava o
dinheiro ao ex-sócio Enrico Machado e a Figueiredo Basto, na época seu advogado.
Segundo o relato redigido pela defesa de Messer, Machado e
Basto diziam que parte desse dinheiro era entregue a Paludo. Messer admitiu que
nunca esteve com o procurador, mas afirmou acreditar que contava com a ajuda
dele. E apontou dois fatos que o fizeram acreditar em tal proteção.
Em 2005, Paludo trabalhou no acordo de delação premiada do
doleiro Clark Setton, conhecido como Kiko, sócio de Messer investigado no caso
Banestado. Kiko também era defendido por Figueiredo Basto. Confessou crimes,
mas não envolveu Messer em nenhum deles. O relato seletivo, ainda assim, lhe
garantiu benefícios penais.
Já em 2011, Paludo testemunhou a pedido de Figueiredo Basto
em um processo criminal contra Messer, relacionado ao caso Banestado. O
procurador disse à justiça que investigou Messer, mas não encontrou nenhuma
prova que o ligasse às irregularidades que, anos mais tarde, o próprio doleiro
viria a confessar.
Messer já havia dito que pagava propina a Paludo. Foi em agosto de
2018, em mensagens trocadas por celular com a namorada – um ambiente mais
privativo e confortável que a cadeira de candidato a delator premiado. “Sendo
que esse Paludo é destinatário de pelo menos parte da propina paga pelos
meninos todo mês”, ele escreveu, em conversa interceptada pela Polícia Federal.
Por citar Paludo, que tem direito a foro privilegiado por
ser procurador, esse trecho do depoimento do candidato a delator foi remetido a
Brasília, para ser avaliado pela equipe da Lava Jato da PGR. E a PGR descartou
investigar um colega. O órgão entendeu que o relato de Messer não tinha provas
para que fosse incluído em seu acordo de colaboração e baseasse uma apuração.
Enquanto isso, a delação de Messer – sem a parte que
complicava Paludo – andava. Foi homologada, em agosto de 2020, por duas
varas judiciais de primeira instância do Rio. Uma delas, a sétima, a do juiz
Marcelo Bretas.
O acordo garantiu que Messer cumprirá pena máxima de 18 anos
e nove meses de prisão, não importa quantas vezes seja condenado em processos
da Lava Jato. Em troca, os procuradores afirmam que o doleiro abriu mão de
cerca de 99% de seu patrimônio, que estimam – sem explicar como chegaram
ao valor – em R$ 1 bilhão. O que significa que, se o cálculo da Lava Jato
estiver correto, Messer manteve R$ 10 milhões no bolso. Nada mau.
Foi nesse ponto que a Lava Jato do Rio chamou Messer para
depor novamente sobre a alegada taxa de proteção paga a Paludo. Aí, o doleiro
– que já tivera a delação aprovada e seguia milionário – contou uma outra
história.
Ao contrário do que havia afirmado antes, Messer dessa vez
falou não acreditar que fosse protegido. Disse mais: que acreditava ter sido enganado por Figueiredo Basto e o ex-sócio
Machado, que embolsavam, nessa nova versão, os 50 mil dólares mensais que
ele enviava para comprar autoridades.
“[Messer afirmou] Que Enrico falava em proteção junto à
Procuradoria da República e à Polícia Federal; que Enrico [Machado] falava no
nome do Dr. (sic) Januário Paludo e pessoas na Polícia Federal; que hoje tem a
percepção de que Figueiredo [Basto] e Enrico ficavam com esse dinheiro”, lê-se
no novo depoimento.
Foi essa nova versão a usada pela Lava Jato do Rio de
Janeiro para denunciar Figueiredo Basto, Enrico Machado e um outro advogado
pelos crimes de exploração de prestígio qualificada, tráfico de influência
qualificado e associação criminosa.
O novo depoimento de Messer fundamenta a tese segundo a qual
os três réus venderam um falso esquema de proteção ao doleiro. Sobre Paludo,
tudo que a Lava Jato do Rio diz é que ele teve o nome indevidamente usado na
falsa venda de proteção.
Januário Paludo, o “pai” dos grupos de Telegram da
força-tarefa da Lava Jato: um veterano da operação Banestado.
As versões conflitantes de Paludo
A decisão da PGR de arquivar o trecho da delação de Messer
que citava Paludo, no segundo semestre de 2020, não foi a primeira. Antes, em
novembro de 2019, a cúpula do Ministério Público Federal em Brasília já havia
sido provocada a investigar a alegada proteção ao doleiro.
Meses após a prisão de Messer, a Polícia Federal encontrou
no celular dele a mensagem na qual ele conversava com a namorada sobre o
“esquema com Januário Paludo e Figueiredo”.
Essa mensagem foi encaminhada à PGR, que chegou a convocar
Messer a dar explicações. Na época, ele ainda não era delator premiado. Assim,
se calou sobre o caso.
A PGR, então, pediu informações a Paludo. O procurador da
República enviou um documento ao órgão informando que era inocente e que
não fazia sentido pensar que teria protegido Messer.
Primeiro, argumentou Paludo, porque ele deixou a
força-tarefa do caso Banestado em 2005. Àquela época de 2019, as investigações
apontavam que os pagamentos da suposta proteção teriam começado em 2006
– ainda que Messer tenha dito que que começaram em 2005.
Segundo, porque as investigações contra Messer corriam no
Rio. Paludo, a partir de 2014, trabalhava na Lava Jato do Paraná. Antes, havia
atuado no Rio Grande do Sul.
Por último, o procurador argumentou que relatou indícios de
que Messer usou contas de titulares ocultos no exterior (conhecidas como contas
offshore) quando foi chamado a testemunhar a favor do doleiro pela defesa dele,
em 2011. Ou seja, Paludo nega tê-lo protegido.
Foi o bastante para a PGR, que arquivou o caso sem
aprofundar a investigação.
Acontece que, quando testemunhou para a defesa de Messer, em
2011, Paludo disse outra coisa à justiça. Na ocasião, o procurador afirmou que
não encontrou nenhuma ligação de Messer ou de membro da família dele com contas
offshore. “Até a parte onde eu fui, nós não identificamos, em princípio,
nenhuma ligação da família Messer”, disse, em documento que é público.
Paludo foi além. Afirmou que as investigações apontaram que
Clark Setton, o Kiko, aparecia como o responsável por contas investigadas. E
que a apuração não revelou nenhuma relação da família Messer com ele. “Na parte
que eu investiguei, a conclusão que eu tive, na época, é que haveria apenas
[indícios] em relação ao Clark Setton [sobre] a administração dessas contas”,
falou.
Já nos diálogos que manteve com colegas procuradores pelo
Telegram, Paludo dá mostras de estar bem informado sobre Messer e sua relação
com Setton. A outros procuradores, Paludo chega a dizer que Setton era uma
espécie de laranja, de “boi de piranha” dos Messer.
Paludo fez o comentário quando surgiram as primeiras
notícias de que Messer poderia ter sido protegido graças ao pagamento de
propina. Um dia antes, ele já falava da relação antiga entre o doleiro e
Figueiredo Basto.
Nos chats, também fica claro que Paludo é tido por colegas
de Lava Jato no Paraná como alguém bem informado sobre o que envolve Messer. Em
2017, quando o doleiro ainda não era um alvo oficial da força-tarefa do Rio de
Janeiro, um repórter procurou o então procurador Carlos Fernando dos Santos
Lima para tratar de suspeitas envolvendo o doleiro. Lima encaminhou as
mensagens e buscou informações com Paludo.
Ouviu, do colega, que a Lava Jato havia acessado uma
investigação sobre Messer que estava a cargo do procurador da República
Alexandre Nardes, do Paraná. Mas, curiosamente, a força-tarefa paranaense
resolveu mandar o caso para o Rio de Janeiro. Segundo o chat, a remessa da
investigação aos colegas fluminenses se deu em 2014, logo no início da operação
no Paraná. No Rio, uma força-tarefa da Lava Jato só seria criada em junho de
2016.
Paludo respondeu horas depois:
Membros da Lava Jato, aliás, assumiram nos diálogos privados
que nunca priorizaram investigações sobre doleiros envolvidos em casos de
corrupção apurados na operação. Procuradores do Rio chegaram a perguntar por
que eles nunca “deram bola” para isso.
Deltan Dallagnol, à época o coordenador da força-tarefa,
entrou na conversa pouco depois:
Procurado, Januário Paludo respondeu que não reconhece a
autenticidade das mensagens e não quis comentá-las. Em nota, o procurador
afirmou apenas que a força-tarefa da Lava Jato do Paraná sempre investigou
crimes relacionados à Petrobras, “estando as conexões de doleiros sendo
investigadas em outros órgãos e unidades”.
“Investigações que não tem conexão com os fatos investigados
na Lava Jato são declinadas para outras unidades do MP por decisão própria ou
judicial, como ocorreram em inúmeros casos”, complementou, quando questionado
por que enviou a investigação sobre Messer ao Rio, em 2014.
Paludo disse que não teve acesso às duas versões do doleiro
Dario Messer a respeito do pagamento da taxa de proteção e, por isso, não tem
como falar a respeito delas. Ressaltou que “se a PGR arquivou uma notícia de
fato que não tinha qualquer fundamento para abrir uma investigação, o fez por
livre convicção”.
“Investigações para serem instauradas têm que ter elementos
indiciários mínimos, não bastando a mera opinião, achismos, suspeitas ou
conjecturas. A instauração de uma ação penal para ser viável exige, além da
competência do juízo, prova da materialidade do delito e elementos suficientes
de autoria (acima de qualquer dúvida razoável), sob pena de ser temerária e
sujeitar indevidamente alguém a processo penal”, declarou.
Sobre o depoimento prestado em 2011 em processo contra
Messer, Paludo disse que “testemunhar em processos é uma obrigação de todos, o
que não quer dizer que seja contra ou a favor da defesa, pois são relatados
fatos”.
Ele não respondeu a questionamentos sobre a ligação de
Messer com Clark Setton.
Dario Messer também foi perguntado sobre as duas versões a
respeito da taxa de proteção apresentadas às autoridades. O advogado Átila
Machado, que hoje representa o doleiro, disse que o procedimento de colaboração
premiada é sigiloso. Por isso, “Dario Messer está impedido de falar sobre o
conteúdo da matéria”.
O advogado Antonio Figueiredo Basto não quis se pronunciar.
Em entrevistas concedidas a outros veículos de imprensa, ele sempre negou ter
recebido qualquer pagamento para garantir a Messer ou a outros clientes
proteção em investigações.
A força-tarefa da Lava Jato do Rio de Janeiro, que usou a
segunda versão de Messer sobre a taxa de proteção em denúncia contra Figueiredo
Basto, disse que o doleiro não alterou seu relato sobre os fatos. Segundo ela,
Messer soube do arquivamento das investigações contra Paludo na PGR e de
transações financeiras que Basto teria realizado para embolsar ele próprio a
tal taxa. Isso mudou sua percepção.
A PGR disse que a apuração preliminar sobre as suspeitas
contra Paludo e a negociação do acordo de delação premiada de Dario Messer são
sigilosos.
Novas mensagens apreendidas na operação spoofing indicam que
procuradores da "lava jato" tinham consciência de que os
americanos poderiam quebrar a Odebrecht, mas, mesmo assim, deram
continuidade às tratativas com as autoridades dos Estados Unidos para a aplicação
de penalidades, fornecendo até mesmo dados informais, a título de
"informações de inteligência".
"Lava jato" discutiu percentuais da partilha do
dinheiro extraído da Odebrecht
Os diálogos mostram que os membros da autoproclamada
força-tarefa não tinham limites em sua missão de transformar o idealismo de um
suposto combate à corrupção em dinheiro que seria depois administrado por eles
próprios.
Em uma troca de mensagens, em 17 de maio de 2016, o
procurador Deltan Dallagnol, então chefe da autointitulada força-tarefa da
"lava jato", discutiu com o colega Orlando Martello o envio de
informações à Suíça e aos Estados Unidos sobre a Odebrecht. Martello chega a
dizer que tem plena consciência de que "os americanos quebram a
empresa" e Deltan responde com uma risada. As mensagens constam em
petição da defesa do ex-presidente Lula enviada ao Supremo Tribunal Federal.
"O procurador da República Deltan Dallagnol tinha plena
ciência de que a atuação de autoridades estadunidenses contra empresas
brasileiras — notadamente por meio da aplicação do FCPA (que busca expandir sobremaneira a jurisdição norte-americana) —
poderia quebra-las. A despeito disso, cooperou para que tais penalidades fossem
aplicadas, inclusive por meio de envio informal de dados", diz o
documento.
O FCPA permite que autoridades norte-americanas
investiguem e punam fatos ocorridos em outros países. Para especialistas, ela
é instrumento de exercício de poder econômico e político dos
norte-americanos no mundo — os novos diálogos mostram a concordância dos
procuradores com esse tipo de entreguismo.
O novo material também reforça que sempre permearam as
conversas com autoridades estrangeiras os percentuais que ficariam à
disposição da "lava jato" sobre o valor das
penalidades aplicadas no exterior contra empresas brasileiras, como a
própria Odebrecht. O acordo de leniência da empreiteira, inclusive, foi
amplamente debatido entre os procuradores da "lava jato" e
autoridades suíças e norte-americanas.
As mensagens indicam que houve diversas reuniões e
trocas de documentos, inclusive por e-mail, entre os membros da força tarefa e
autoridades da Suíça e dos Estados Unidos, conforme a petição dos advogados de
Lula: "Um ponto sempre relevante é do 'asset sharing', ou seja, o
percentual da penalidade que ficaria com cada um dos envolvidos".
Em conversa em 8 de dezembro de 2016, um procurador
pede aos demais colegas o e-mail de um membro do MP suíço que estava
em uma reunião em Curitiba que discutiu justamente os percentuais de 'asset
sharing' que iriam para os EUA e para a Suíça no caso Odebrecht.
"Como pode a 'lava jato' ocultar esse material da defesa técnica do
reclamante ou dizer a esse Supremo Tribunal Federal que nada disso
ocorreu?", questiona a defesa de Lula.
Em um determinado momento, os próprios procuradores tratam a
negociação como um "acordo trilateral", envolvendo Brasil, EUA e
Suíça. As mensagens mostram "atuação dos procuradores da República da
'lava jato' nessa frente, o que foi indevidamente negado a esse Supremo
Tribunal Federal", sustenta a petição.
Todas essas informações foram apresentadas pela defesa do
ex-presidente Lula, patrocinada por Cristiano Zanin, Valeska
Martins, Maria de Lourdes Lopes e Eliakin Tatsuo,
ao ministro Ricardo Lewandowski, relator de uma reclamação sobre a investigação
de hackers que invadiram celulares de autoridades.
Acordo
O acordo de leniência que a Odebrecht assinou com o Ministério
Público Federal em dezembro de 2016 previa a criação de uma conta judicial, sob responsabilidade da 13ª
Vara Federal de Curitiba. O dinheiro ficaria à disposição do MPF, que
daria aos recursos a destinação que quisesse.
A construtora se comprometeu a pagar R$ 8,5 bilhões
como multa por seus malfeitos. O dinheiro seria dividido pelo MPF entre ele
mesmo, o Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DoJ) e a
Procuradoria-Geral da Suíça.
Em nova petição ao STF, defesa de Lula prova nesta quarta
que a cooperação ilegal da Lava Jato com FBI, Departamento de Justiça e outras
instituições dos EUA era intensa e permanente. Ela foi propositadamente
escondida do STF e da defesa do ex-presidente
Sergio Moro, Deltan Dallagnol e o símbolo do FBI (Foto:
Reprodução)
247 - Um novo pacote de mensagens da Lava Jato
foi enviado pela defesa do ex-presidente Lula numa petição ao STF nesta
quarta-feira (17) e comprova que a cooperação ilegal entre a Lava Jato, o FBI,
o Departamento de Justiça dos EUA e outros órgãos aconteceu de maneira intensa
e permanente. Ilegal, a cooperação foi escondida do STF e da defesa de Lula.
Num trecho da petição, a defesa de Lula esclarece a razão de
Moro vetar perguntas dos advogados nas audiências. O motivo é chocante: “(...)
quantas vezes a Defesa Técnica do aqui Reclamante fez perguntas em audiências
sobre essas ‘entrevistas’ e sobre a cooperação da ‘Lava Jato’ com autoridades
norte-americanas e as perguntas foram indeferidas pelo então juiz SERGIO MORO?
Aqui está o real motivo: a cooperação era ilegal e clandestina”.
O conjunto de mensagens caracteriza, segundo a defesa de
Lula, uma “cooperação selvagem, fora da lei”, dos procuradores da Lava Jato
“com a ciência e a anuência do então juiz SERGIO MORO”.
Em explicações ao STF e órgãos de controle do Ministério
Público e do Judiciário, a Lava Jato mentiu de maneira sistemática, negando a
existência de relações de ações comuns com autoridades estrangeiras, como nesta
peça, de 2016, citada pela defesa de Lula:
“Conforme já informado anteriormente, no Brasil, o acordo
de leniência com a Odebrecht S.A. foi firmado em 01/12/2016 exclusivamente com
autoridades brasileiras, inicialmente com o Ministério Público Federal, sendo
signatários membros integrantes desta força-tarefa e do grupo de trabalho junto
ao gabinete do Procurador Geral da República.
Inexiste, portanto, acordo de leniência ou ato conjunto semelhante
neste caso que tenha sido firmado ou conte com a participação de autoridades
estrangeiras, sejam estadunidenses ou de outra nacionalidade.
(...)
Não há, portanto, registros de tratativas realizadas pelo
MPF de Curitiba com autoridades e instituições estrangeiras, já que o acordo de
leniência celebrado pelo MPF não é ato decorrente ou dependente de cooperação
internacional”.
Na petição, a defesa de Lula apresenta diversos diálogos que
comprovam a cooperação ilegal. Uma troca de mensagens de 7 de abril de 2016:
“Deltan: Caros, os americanos, a nosso pedido pretérito,
estão desenvolvendo o caso da Ode.
Carol PGR: Deltan, os Advs que estão negociando o acordo
aí nos EUA são americanos ou é um escritório brasileiro?
Deltan: Americano, caso me equivoque”
Outra troca de mensagens, de 26 de setembro de 2016 fala
refere-se diretamente à colaboração clandestina com o FBI:
“Carlos Bruno: PG, houve alguma resposta do FBI no caso
do servidor (computador) com senha?
Paulo: só aquela do email”
Sobre essa troca de mensagens, a defesa de Lula observa que
o citado email foi sonegado pela operação: “Note-se bem a referência feita
nesta mensagem a informações recebidas pela Lava Jato do FBI: ‘só aquela do
e-mail’. Onde está esse e-mail encaminhado pelo FBI? Nos autos de origem,
definitivamente não está, e nem foi exibido a esta Defesa Técnica, a despeito
da expressa determinação do e. Ministro RICARDO LEWANDOWSKI”.
Outras mensagens reforçam o contato permanente da Lava
Jato com o FBI “sem que isto esteja documentado nos autos ou, ainda, sem a
observância dos canais oficiais e do procedimento previsto em lei”, afirma a
defesa de Lula. Uma mensagem de 27 de setembro de 2016 deixa patente:
“Paulo: (...) falei com a June do FBI, ela vai cobrar a
questão da cripto”.
A defesa de Lula apresenta uma sequência de trocas de
mensagens entre os procuraodres que atestam a dimensão da colaboração
clandestina: “Na mensagem abaixo, por exemplo, existe a indicação de documentos
que foram firmados entre a ‘Lava Jato de Curitiba’ e o DOJ [Departamento de
Justiça dos Estados Unidos] que jamais foram levados aos autos de origem —
mesmo após esse Supremo Tribunal Federal ter instado a ‘Lava Jato’ para essa
finalidade”.
A seguir, a mensagem, de 20 de maio de 2016:
“Paulo, conversei com o DOJ sobre esse acordo (eles ligam
toda semana querendo saber novidades)”.
O maior lobista pró-armas de Bolsonaro só não está preso
graças ao pacote que Sergio Moro chamava de anticrime.
Loester Trutis foi eleito na onda conservadora de 2018.
Antes da posse, vendia “Trump Burguer” em uma lanchonete em Mato
Grosso do Sul. Foto: Assessoria Loester Trutis
O DEPUTADO BOLSONARISTA Loester Trutis relata
ter sofrido uma emboscada em fevereiro do ano passado. Ele e seu assessor
estariam na rodovia BR-060, entre Sidrolândia e Campo Grande, em Mato Grosso do
Sul, quando o motorista de uma caminhonete emparelhou com o seu carro e disparou
uma rajada de tiros de carabina. Por milagre, nenhum dos tiros teria atingido o
deputado e seu assessor, que dirigia o carro. O deputado, que estaria
descansando no banco de trás, disse que reagiu valentemente com tiros,
colocando os criminosos para correr. Orgulhoso do seu heroísmo, escreveu no
Facebook ao lado de uma foto do seu carro alvejado: “Graças a Deus pude revidar
e aguardar a chegada da polícia. Quem achou que eu ia parar ou me calar, digo
que estamos apenas começando e sigo trabalhando”.
Trutis contou para a Polícia Federal que suspeitava que os
criminosos fossem traficantes de drogas e cigarros insatisfeitos com sua
atuação parlamentar implacável contra a bandidagem. Realmente seria um ato
heroico, digno de Hollywood, se não fosse só mais uma mentira escabrosa dita
por um político bolsonarista. Sim, Loester Trutis forjou o atentado. Pelo menos
foi isso o que a Polícia Federal e o Ministério Público Federal concluíram após
meses de investigação.
Nenhuma das informações fornecidas pelo deputado batiam com
o que foi apurado pela PF, o que fez com que os policiais desconfiassem da
história. O GPS do carro indicava localizações completamente diferentes das
relatadas por Trutis. Ele também informou o modelo e o final da placa da
caminhonete, mas as câmeras de segurança da rodovia não registraram a passagem
do veículo. Com os dados fornecidos, a polícia encontrou a única caminhonete
que batia com a descrição: era de propriedade de um fazendeiro de 71 anos,
velha, com problemas mecânicos que a tornavam inútil para uma perseguição em
alta velocidade numa rodovia. Com aquela inteligência própria dos reacionários,
Trutis deu detalhes
das armas dos atiradores: “CTT, calibre .40, […] não se tratava de um
fuzil, pois o carregador era retilíneo e não curvo”. Mas a perícia indicou que
os tiros partiram de uma Glock 9mm de um atirador que estava em pé e parado. O
modelo da arma é o mesmo de uma que o deputado gostava de exibir nas redes
sociais. O exibicionismo bélico, esse fetiche do bolsonarismo, fez os
investigadores ficarem ainda mais desconfiados.
Mas qual seria a motivação de Trutis em simular um atentado?
A PF e o MPF concluíram que ele queria faturar politicamente em cima do caso. O
MPF apontou que o deputado seguiu fazendo
postagens sobre o atentado durante muito tempo, “sempre associando os fatos a
uma disputa política no Mato Grosso do Sul e exaltando o fato de que estava
armado”. A conclusão das autoridades faz todo sentido, já que a principal pauta
de Trutis na política é justamente a flexibilização do Estatuto do
Desarmamento.
Em sua casa, foram encontradas um arsenal de armas: a
pistola Glock que ele adorava exibir na internet, um fuzil, um revólver calibre
357 e muita munição. Além de estarem em nome de laranjas, todas essas armas são
ilegais, pois são de uso restrito. Outro agravante: o deputado estava impedido
de ter armas em seu nome porque a lei exige uma ficha criminal limpa, o que
definitivamente não é o seu caso. Trutis tem antecedentes
criminais, que vão de violência doméstica a tentativa de estupro.
O machão foi preso em flagrante, mas ficou apenas um dia na
cadeia. A ministra Rosa Weber determinou a soltura imediata do parlamentar com base numa mudança
feita pelo pacote anticrime de Sergio Moro: a Lei 13.965, aprovada no Congresso
com o voto favorável de Trutis, mudou a pena para o flagrante de posse de arma
de uso restrito, que deixou de ser um crime inafiançável. Um sujeito como
Trutis pode agora desfrutar da liberdade graças às medidas de Moro e Bolsonaro.
É irônico que o pacote seja chamado de anticrime.
Uma lei do pacote anticrime de Moro livrou Trutis da prisão
por porte ilegal de armas. Foto: Reprodução/Facebook
Loester Trutis é um legítimo representante do jeito novo de
fazer política consagrado pelo bolsonarismo. Até pouco tempo antes de se
candidatar pela primeira vez em 2018 e ser eleito na onda reacionária que tomou
conta do país, Trutis era um cidadão comum, proprietário de lanchonete e
militante reacionário na internet. Atacava comunistas e xingava jornalistas, a
quem costuma
chamar de “maconheiros”. Ficou famoso nas redes sociais por vender em sua
lanchonete o Bolso
Burger, The Trump Burger e o Geisel Burger, uma homenagem aos extremistas
de direita.
Durante a eleição, apresentou-se como um cidadão de bem que
luta em defesa da família e pelo direito de andar armado. O seu jingle de campanha
era uma paródia da música tema do filme Tropa de Elite: “chegou o Tio Trutis,
osso duro de roer. Malandro e maconheiro ele vai mandar prender”. A letra da
música também exaltava a Polícia Federal, a mesma que hoje ele acusa de
manipular as investigações do seu atentado falso.
Apesar de neófito na política, o deputado é da linha de
frente da bancada da bala. “Tio Trutis”, como é conhecido, é o idealizador da
segunda bancada da bala, criada para defender a facilitação da compra, posse e
porte de armas de fogo. Inclusive, ele usou o fato de presidir a bancada
para justificar
seu arsenal de armas ilegais: “Sim, foram encontradas várias armas na minha
casa, pois sou o presidente da Frente Parlamentar Armamentista, presidente do
Instituto Brasileiro da Cultura Armamentista. Porra, vocês queriam que achassem
o que na minha casa?”.
A Frente
Parlamentar Armamentista nasceu da iniciativa de Trutis, que logo no
começo do mandato recolheu assinaturas para a sua criação. O lobby para a
indústria de armas é descarado. Trutis e outros quatro deputados do PSL,
integrantes da nova frente, foram até o Rio Grande do Sul para visitar a fábrica da Taurus, líder do mercado
nacional. A Taurus fabrica mais de 1 milhão de pistolas, fuzis,
submetralhadoras e revólveres por ano. A viagem dos deputados foi bancada pela
Associação Nacional de Indústria de Armas e Munições (Aniam), da qual a Taurus
é filiada.
Graças ao desfiguramento do Estatuto do Desarmamento,
resultado desse lobby bolsonarista, nunca circularam tantas armas no país.
Durante o governo Bolsonaro, a
importação de revólveres e pistolas é maior que nos governos Lula,
Dilma e Temer somados. Em dois anos, foram importadas mais armas do que nos 16
anos anteriores. Em 2020, houve uma alta de importação de 94% em relação ao ano
anterior, e a expectativa para 2021 é ainda maior. A explosão de registro de
novas armas no último ano aconteceu em
meio à alta no número de homicídios.
Negar a relação do aumento de homicídios com o aumento de
pessoas armadas é negar a ciência. Estudos do Mapa da Violência calculam que
o Estatuto do Desarmamento foi responsável por salvar mais de 160 mil vidas
entre 2003 e 2015. A relação direta entre o aumento do número de armas e o de
homicídios não está em debate entre os especialistas. Trata-se de um consenso
científico. O esquartejamento do estatuto, sustentado pela falsa ideia de
que cidadãos armados estão mais protegidos, favoreceu a criminalidade.
Estudos mostram que
entre 30% e 40% das armas apreendidas pela polícia com criminosos foram
compradas legalmente por pessoas não envolvidas em crimes. As milícias
agradecem. Afirmar que há mais segurança com cidadãos mais armados é mais um
negacionismo assassino — algo que a pandemia mostrou ser um traço fundamental
do bolsonarismo.
Durante a campanha para a presidência da Câmara, Arthur Lira
foi a Campo Grande para costurar apoios com a bancada sul mato-grossense. Entre
os deputados presentes estava Trutis que, apesar de parte do seu partido ter
orientado o voto em Baleia Rossi, se rebelou para
atender um “pedido do Planalto”. Na verdade, ter aderido ao bloco vencedor
pode ajudá-lo a garantir a manutenção do mandato em um provável processo no
Conselho de Ética por conta do falso atentado.
Loester Trutis personifica o bolsonarismo na sua mais pura
essência. É um negacionista sem freio, capaz de simular um atentado apenas para
conquistar dividendos políticos e eleitorais. As mamadeiras de piroca
fabricadas durante a campanha são brincadeira de criança perto do que o fetiche
bélico bolsonarista pode fabricar. A bancada da bala nunca esteve tão poderosa
e vem crescendo com base em falácias rejeitadas por todos os especialistas em
segurança pública. As mentiras do bolsonarismo seguem matando.
Durante operação que investiga suposto atentado contra o
Deputado Federal Tio Trutis, o parlamentar foi detido hoje (12) pela manhã por
posse ilegal de arma de fogo. Ele continua na Superintendência da Polícia
Federal de Campo Grande.
Comentário jocoso do procurador aparece em um dos diálogos
obtidos pela defesa do ex-presidente Lula nos arquivos da Operação Spoofing
Novos diálogos entre procuradores da Força-Tarefa da
Operação Lava Jato do Ministério Público Federal (MPF) revelados nesta
sexta-feira (12) reforçam o tratamento jocoso pelo qual os membros da Lava Jato
se referiam à ex-primeira-dama Marisa Letícia.
Na matéria, o veículo afirma que Marisa teria montado uma
horta no imóvel, que é de propriedade de Fernando Bittar, parente do
ex-presidente. Segundo a Lava Jato, o sítio seria de Lula.
Sobre a matéria, Deltan Dallagnol faz o seguinte comentário:
“Como ela já sabe fazer horta, a Dona Marisa vai poder escolher uma Colônia
Penal Agrícola para passar a velhice dela”. Dallagnol dá a entender que teria extraído
o comentário de algum lugar, mas compartilha sem o menor pudor no grupo de
procuradores.
“Sem dúvida, o sítio é do Lula, porque a roupa de mulher era
muito brega. Decoração horrorosa. Muitos tipos de aguardente. Vinhos de boa
qualidade, mas mal conservados. Achei o sítio deprimente. Local para pouso de
helicóptero confirmado à esquerda da entrada em campo de futebol, para
helicóptero pequeno”, afirmou Januário Paludo no grupo de procuradores da
força-tarefa no Telegram.
Integrantes da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba
ironizaram a morte da ex-primeira-dama Marisa Letícia e o luto do ex-presidente
da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT), conforme revelam mensagens de
chats privados no aplicativo Telegram enviados por fonte anônima ao site The
Intercept Brasil analisadas em parceria com o UOL. Os diálogos mostram que
procuradores divergiram sobre pedido de Lula para ir ao enterro do irmão
Genival Inácio da Silva, o Vavá, em janeiro passado --quando o ex-presidente já
se encontrava preso. As conversas revelam que integrantes da Lava Jato temiam
manifestações políticas em favor de Lula. O ex-presidente também foi alvo de
crítica na despedida do neto Arthur Araújo Lula da Silva, morto aos 7 anos em
março passado.
Mensagens vazadas mostram que procurador Januário Paludo foi ao sítio de Atibia e enviou textos jocosos sobre o local
Deltan Dallagnol e Januário Paludo; procuradores do
Ministério Público mantinham diálogo ilegal com ex-juiz Sérgio Moro sobre
julgamento de processos da Lava Jato - Reprodução/MPF
A força-tarefa da Lava Jato no Paraná anunciou, nesta
quarta-feira (3), que oficialmente deixou de existir. Os procuradores e integrantes da
operação passarão a atuar no Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime
Organizado (Gaeco) do Ministério Público Federal (MPF).
A mudança ocorreu após uma portaria de 7 de dezembro da
Procuradoria-Geral da República (PGR), que determinou a integração de quatro
integrantes da Lava-Jato ao Gaeco, que já contava com cinco membros. Entre os
procuradores estão Laura Tessler e Roberson Henrique Pozzobon.
Outros dez membros da Lava Jato permanecem designados para
atuação em casos específicos ou de forma eventual até 1º de outubro de 2021,
sem integrar o Gaeco e sem dedicação exclusiva ao caso, trabalhando a partir
das lotações de origem.
As últimas conversas reveladas, no último dia 1º, entre os
procuradores da Lava Jato e o ex-juiz federal Sergio Moro, após determinação do
Supremo Tribunal Federal (STF) de levantar o sigilo dos diálogos, revelam
preconceitos de classe dos integrantes da força-tarefa e ataques depreciativos contra o ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva.
O procurador Januário Paludo relatou suas impressões sobre o
local. Com piadas, os colegas, incluindo Deltan Dallagnol, pediram mais
detalhes. Jerusa Viecili, também procuradora, reagiu a Paludo também imprimindo
tom jocoso: “Kkkkkk Januario! Quero saber da adega!”.
Então, Paludo ridicularizou o ex-presidente e sua esposa,
Marisa Letícia. “Sem dúvida, o sítio é do Lula, porque a roupa de mulher era
muito brega. Decoração horrorosa. Muitos tipos de aguardente. Vinhos de boa
qualidade, mas mal conservados. Achei o sítio deprimente. Local para pouso de
helicóptero confirmado à esquerda da entrada em campo de futebol, para
helicóptero pequeno”, escreveu.
No caso do sítio de Atibaia, Lula foi condenado a 17 anos de
prisão, sob acusação de corrupção e lavagem de dinheiro relacionada a reformas
no local. O ex-presidente nega que o local seja seu. Mensagens mostram que a
Lava Jato escolheu momento para fazer acusação no caso do sítio em
Atibaia para tirar foco de escândalo Temer-Joesley e acobertar ações de colegas
procuradores.
As mensagens preconceituosas dos procuradores seguiram no
dia seguinte à operação. Januario Paludo escreveu: “Não me deixaram ficar na
adega com medo que eu pegasse um Brunello, botasse um chapéu do MST no patinho
e saísse pedalando!!!”, escreveu. Os colegas riram, e a procuradora Laura
Tessler ainda acrescentou: “O sítio é mesmo do Lula: a 1ª foto mostra uma 51
[referindo-se a uma marca de cachaça]!!! Essas fotos da adega deveriam ser
divulgadas”.
As conversas foram obtidas pelos advogados de Lula, e o
material foi apreendido na Operação
Spoofing, que teve como alvo o caso de rastreamento dos celulares de
diversas autoridades, entre elas Moro e integrantes da força-tarefa da Lava
Jato.
Boa Noite 247 - Fim da Lava Jato faz aumentar a pressão pelo
volta Lula
A Lava Jato deixou de existir no Paraná e passou a integrar
o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) por decisão
do Ministério Público Federal. A medida acontece dias depois da revelação dos
novos diálogos de Sérgio Moro com procuradores evidenciando o conluio contra
Lula.
O programa desta quarta (3) vai contar com a participação da
subprocuradora da República Deborah Duprat, ex-Procuradora Federal dos Direitos
do Cidadão; do jornalista Marcelo Auler; e do cartunista Renato Aroeira.
Numa conversa de 2015, o então juiz federal Sergio Moro se
mostrou irritado após procuradores do Ministério Público Federal recorrerem de
uma condenação. O caso envolvia o engenheiro Mário Góes, apontado como operador
de propinas em um esquema de corrupção na Petrobras; Pedro Barusco, ex-gerente
executivo da estatal; e o empresário Augusto Ribeiro de Mendonça Neto.
As mensagens se tornaram públicas nesta segunda-feira
(1º/2), depois que o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal
Federal, retirou o sigilo da reclamação que deu à defesa do
ex-presidente Lula acesso às mensagens apreendidas na chamada "operação
spoofing".
Parte das 49 páginas contendo diálogos já tinha se tornado
pública na semana passada, quando o site da revista Vejarevelou conversas em que Moro aparece orientando os
procuradores do Paraná. Trechos divulgados pelo site The Intercept
Brasil também estão no documento.
As mensagens demonstram mais uma vez que Moro orientava a
acusação em diversos processos que corriam na 13ª Vara Federal de Curitiba,
onde era o titular. AConJur manteve as abreviações e
eventuais erros de escrita nas conversas.
"Olha está um pouco dificil de entender umas coisas.
Por que o mpf recorreu das condenacoes dos colaboradores augusto, barusco
emario goes na acao penal 5012331-04? O efeito pratico é impedir a execução da
pena. E julio camargo tb. E nao da para entender no recurso se querem ou nao
alteracao das penas do acordo?", diz Moro a Deltan Dallagnol, então chefe
da autointitulada "força-tarefa da lava jato". A conversa é de 17 de
novembro de 2015.
Dallagnol tenta explicar, mas Moro retruca. "Sinceramente
não vi nenhum sentido nos recursos que já que não se pretende a alteração das
penas finais dos colaboradores. O mp está recorrendo da fundamentação, sem
qualquer efeeito prático. Basta recorrer so das penas dos nao colaboradores a
meu ver. Na minha opinião estão provocando confusão."
O MPF no Paraná respondeu à ConJur que não
irá se pronunciar sobre as mensagens.
Adiantando trâmites
Em outro momento, dessa vez em 10 de novembro de 2016, Dallagnol adianta a Moro
que irá protocolar uma denúncia contra o ex-presidente Lula e outra contra o
ex-governador Sérgio Cabral (MDB-RJ).
"Denúncia do Lula sendo protocolada em breve. Denúncia
do Cabral será protocolada amanhã", diz o procurador. Moro responde com um
emoticon de sorriso e diz: "Um bom dia, afinal". Um dia depois
da mensagem Lula foi de fato denunciado por corrupção passiva e lavagem de
dinheiro.
As conversas também registram um momento em que Moro adianta
o trâmite de um processo. "Na segunda acho que vou levantar o sigilo de
todos os depoimentos do FB. Nao vieram com sigilo, não vejo facilmente riscos a
investigação e já estao vazando mesmo. Devo segurar apenas um que é sobre
negócio da argentina e que é novo. Algum problema para vcs?", pergunta a
Dallagnol.
"FB" é Fernando Baiano, lobista apontado pelo
MPF como um dos operadores do PMDB no esquema de desvio de recursos da
Petrobras.
Intimidade com Moro
O ex-presidente Lula foi condenado pela primeira vez por Sergio Moro em 12 de
julho de 2017. Na ocasião, o juiz o sentenciou a nove anos e meio de prisão por
corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá (SP). Em
1º de julho, Deltan demonstrou que já sabia da condenação.
"Mas um ponto a ser considerado..no meu jeito de ver...
Com a troca de PGR, soltura de Loures, retorno de Aécio ao Senado, e sentença
de Moro contra Lula prestes a sair, já estão usando e vão reforçar imagem que
vcs só perseguem o PT... Vide nota oficial do partido divulgada ontem... É uma
série de situações perfeitas que caminham para que voltem a acusar vcs de
perseguição. Por isso qualquer declaração fora de hora pode gerar mais
ruído...".
Em diversas mensagens os procuradores da República afirmam
que iriam se reunir com Sergio Moro ou que o consultaram ou precisavam ouvir a
opinião do juiz sobre algum ponto.
Em 2 de junho de 2016, o procurador Roberson Pozzobon diz ao
colega Antônio Carlos Welter que, se ele não tiver outras tarefas, "a
reunião será às 11:00 com o Moro". Mais tarde, a procuradora Laura Tessler
pede a Andrey Borges de Mendonça:
"CF [Mendonça], vc poderia conversar com o Moro sobre a
decisão de suspender o processo com base na assinatura do termo de confidencialidade?
Desse jeito, todos vão querer o mesmo benefício...e com isso fica difícil
sustentar a manutenção das prisões durante a avaliação da proposta do
acordo." E requer que ele também converse com o juiz sobre o processo
envolvendo o escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca. Em seguida,
Welter informa que "já falamos com Moro".
No dia 7 de junho, ao discutirem uma questão envolvendo o
ex-presidente da Câmara dos Deputados Henrique Eduardo Alves (MDB-RN), Deltan
Dallagnol cita a opinião do juiz federal sobre o caso. "Moro diz que PF
não deve fazer mas isso pode ter limite pq ele acha que a melhor solução é
fazermos o acordo".
O procurador Orlando Martello, em outro trecho, repassa ao
grupo mensagens sobre o uso de provas contra o ex-presidente da Câmara Eduardo
Cunha (MDB-RJ). Nelas, integrantes do MPF não identificados comentam que irão
protocolar ação de improbidade administrativa contra Cunha. O processo é
baseado em documentos recebidos da Suíça. Surge uma dúvida quanto à necessidade
de compartilhamento de documentos, e eles apontam que Moro entende que a
medida não é necessária.
"Pellela, Precisa falar. É sobre o Cunha. Estamos com
uma ação de improbidade pronta para protocolar na segunda-feira. A base da ação
são os DOCs recebidos da Suíça (via stf). Não há compartilhamento para o cível.
Entendemos q não precisa compartilhamento. São documentos em q não há restrição
de uso. Tb são DOCs q não podem ser produzidos exclusivamente para fins penais,
q demandaria o compartilhamento para o cível. Este é o nosso entendimento aqui.
Conversei agora com vlad, q estava com Daniel e Danilo. Eles tb não vêm
problema, embora Danilo/Daniel pediria o compartilhamento por cautela. Pedimos
ao moro, mas ele não quer compartilhar pq ele acha q o stf deveria fazê-lo. Pediu
q pedíssemos ao stf."
Mendonça, no início de julho de 2016, disse que estava em
São Paulo para falar sobre delações premiadas e acordos de leniência, "bem
como ver as questões sobre as novas operações". "Nada muito especial,
mas cumprindo uma rotina de manter o russo [Sergio Moro] informado, bem como
atento aos humores dele."
O procurador conta que estava tentando voltar a Curitiba
"para a reunião com o russo", mas o avião retornou para a capital
paulista. "Não sei que horas vou conseguir retornar. Ou vocês tratam dos
assuntos com o russo ou avisam que a reunião foi cancelada."
Dallagnol então afirma que irá avisar o juiz e relata que ele também tem algo a
falar com os membros do MPF.
O chefe da força-tarefa da "lava
jato" pergunta a Pozzobon, em 16 de agosto de 2016, se "o pedido
do Pace do [ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil Antônio] Palocci já foi
protocolado". Isso "para que o russo possa analisar se usa ou
não".
Antes disso, Dallagnol já contava aos colegas que
"Russo vai sair fim do ano mesmo, contando que já tenhamos processado o 9
[Lula] e o Cunha. Pode reavaliar conforme venha o Renan [Calheiros,
ex-presidente do Senado] ou a depender da Ode [Brecht, empreiteira]. Acho
difícil segurar ele". Moro ainda atuou mais de dois anos na 13ª Vara
Federal de Curitiba, só deixando a magistratura ao assumir o Ministério da
Justiça e Segurança Pública do governo Jair Bolsonaro.
"Cavalo de Tróia"
Já em 26 de junho, Dallagnol, ao discutir o repasse de valores pagos em acordos
de leniência para a força-tarefa da "lava jato", sugere a Mendonça
uma forma de disfarçar a entrada dos recursos no MPF.
"Vc precisa se inteirar a respeito do que falta para
que o dinheiro possa entrar no MPF. Parece que havia uma possibilidade de dar
certo sem nada, e outra que seria encaminhar a criação de uma rubrica contábil
dentro de algo orçamentário, silenciosamente, como cavalo de tróia que
permitiria depois o crédito. Tem que articular a estratégia com a SG. Se Vc não
for resolver, precisamos de alguém que se voluntarie para dar conta disso e
fazer um report de status numa próxima reunião."
Contudo, Deltan ressalta a importância de "sondar o
Moro na próxima reunião para ver se e como ele ficaria confortável em
destinar". O chefe da força-tarefa também aponta caminhos para convencer a
Petrobras a concordar com a proposta.
"Talvez dependamos de fazer um acordo com a vítima, a
Petrobras. Vc [Mendonça] podia marcar reunião com Petro pra isso tb. A
justificativa é que sem investigação e sistemas etc nunca ela seria ressarcida.
10% é algo razoável a perder para ganhar muito mais. Conseguindo fazer a Petro
concordar, cai o argumento do Teori. O que está faltando nisso é alguém assumir
e priorizar isso. Ate a decisão do Teori, não tínhamos pressa. Agora,
precisamos priorizar isso enquanto temos alguma vantagem para negociar com Petrobras.
Mendonça diz não concordar com a abordagem. "Não vejo
como resolver isso com a vítima. Certamente iria aparecer na imprensa",
diz, ao defender uma regulamentação da destinação do dinheiro de acordos de
leniência.
Deltan Dallagnol sustenta que o problema não é
regulamentação. "Não adianta o que regulamentar, o fato é que dinheiro
lavado saiu dos cofres de vítimas e enquanto nao receberem tudo a Petrobras,
alavancada por Teori, conseguirá levar. É como se alguém roubasse minha
bicicleta e lavasse o dinheiro. Não há santo no mundo que dissesse que o
dinheiro não tinha que vir para me ressarcir a bicicleta roubada, ainda que a
lavagem tenha lesado outros bens jcos".
Não convencido, Mendonça declara que não fará uma reunião
com a Petrobras sobre o tema. E lembra que, antes de oferecer um caminho
ao juiz, os procuradores precisam chegar a uma conclusão sobre o assunto.
Em março de 2019, foi divulgado acordo assinado pela Petrobras e pelos procuradores da
"lava jato" prevendo a criação de um fundo administrado pelo MPF. A
intenção era investir no que o consórcio de Curitiba chama de "projetos de
combate à corrupção". O acordo previa que R$ 2,5 bilhões da Petrobras
seriam depositados em uma conta vinculada à 13ª Vara Federal de Curitiba e
seriam geridos por uma fundação controlada pelo MPF, embora eles aleguem que iriam apenas participar do fundo.
Outra cláusula absurda do acordo previa que a "lava
jato" se tornasse um canal para o governo dos Estados Unidos ter acesso a
informações estratégicas de negócios da Petrobras, como cláusula para que o
dinheiro não ficasse nos EUA, mas viesse para o fundo de Deltan Dallagnol. A
própria Procuradoria-Geral da República recorreu ao Supremo Tribunal Federal
pedindo que a corte declarasse a nulidade do acordo, no mesmo dia em que o
MPF anunciou a suspensão da criação do fundo. Em setembro, ficou decidido que o dinheiro que seria usado na
criação do fundo iria para a Amazônia (que sofreu com aumento de queimadas) e
para a educação. O processo no Supremo ainda corre, sob relatoria do ministro
Alexandre de Moraes.
“Filigrana jurídica”
Em 16 de março de 2016, Sergio Moro divulgou conversas telefônicas de Lula,
recém-empossado ministro da Casa Civil, com a então presidente Dilma Rousseff.
Na semana seguinte, o ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavaski – que
morreu em acidente aéreo em 2017 – afirmou que o fim do sigilo dos grampos foi ilegal e
inconstitucional. Primeiro porque foi o resultado de uma decisão de primeiro
grau a respeito de fatos envolvendo réus com prerrogativa de foro no Supremo.
Depois porque, ao divulgar o conteúdo dos grampos, Moro violou o direito
constitucional à garantia de sigilo dos envolvidos nas conversas.
No dia da divulgação dos áudios, os procuradores discutiram
se o ato de Moro era legal ou não. Afinal, o diálogo entre Lula e Dilma foi
captado após o juiz federal ter enviado comunicados às operadoras de
telecomunicações pedindo a suspensão dos grampos. O procurador Januário Paulo
classifica a medida como “filigrana”. “Quem decide o que vai para os autos e o
juiz. Se ele podia interromper também pode mandar juntar aos autos e validar”.
Andrey Mendonça discorda. “Januario, desculpe, eu nao vejo
assim. Isso esta longe de ser filigrama na minha visão. Se ele suspendeu a
interc[eptação], juridicamente nada vale dps. Eu espero q vcs estejam certos,
mas nao eh tao tranquilo assim”.
Deltan Dallagol então intervém: “Andrey No mundo jurídico
concordo com Vc, é relevante. Mas a questão jurídica é filigrana dentro do
contexto maior que é político”. “Concordo Deltan. Isso tera q ser enfrentado
muito em breve no mundo juridico. O estrago porem esta feito. E mto bem feito”,
responde Mendonça.
Dois dias depois, em 18 de março, o ministro do STF Gilmar
Mendes cassou a nomeação de Lula como chefe da Casa Civil. No
embalo da decisão, os procuradores discutem se é hora de pedir a prisão de Lula
e apresentar denúncia contra ele. Para Roberson Pozzobon, não faz diferença se
a captação da conversa foi ilegal ou não. Afinal, a própria Dilma admitiu o
diálogo.
Dallagnol sugere “retomar a tática das múltiplas frentes
para aumentar o peso da peça”. Orlando Martello opina que a prisão de Lula em
primeira instância seria “loucura”, salvo se aparecesse motivo novo.
O procurador Júlio Noronha, por sua vez, cita que alguns integrantes
do MPF entendem que não era o momento de pedir a prisão preventiva do
ex-presidente, sob risco de se criar um “mártir”. Citando conversa com membros
da “lava jato” em Brasília, Dallagnol destaca a idéia de os procuradores da
capital federal pedirem, simultaneamente aos de Curitiba, a detenção de Lula,
de forma a “ficar bonito”.
De qualquer forma, Pozzobon urge os colegas a não apressarem
a apresentação da denúncia contra Lula, “ainda mais sem combinar com o PGR
[Rodrigo Janot] e o Russo”.
Formal ou informal?
Em outro trecho, Moro indica como ocorre a cooperação internacional entre a
"lava jato" e autoridades dos Estados Unidos. "Vc viu a
decisão do evento 16 no processo 5048739-91? A diligencia merece um contato
direto com as autoridades do US. Colocar US attorneys [procuradores
norte-americanos] para trabalhar pois até agora niente [nada] rs", diz o
ex-juiz.
"Hoje falei com eles sobre as contas lá da Ode
[Odebrecht] pra ver se fazem algo rs", responde Dallagnol. O processo
citado aparece na "lava jato" como a quebra de sigilo fiscal do
engenheiro e depois delator Zwi Skornicki. A conversa ocorreu em novembro de
2015.
O Decreto 3.810/01, que internaliza o Acordo de Assistência
Judiciária em Material Penal entre os governos do Brasil e dos EUA, prevê que
que a cooperação internacional passe pelas autoridades centrais designadas
pelos dois países — no caso do Brasil, o Ministério da Justiça; no caso dos
EUA, o Departamento de Justiça (DoJ) — e que todos os documentos recebidos
possuam um comprovante de entrega.
As declarações de Moro e Dallagnol reforçam que havia
cooperação internacional com os EUA e que, portanto, os procuradores atuaram de
forma ilegal, passando por cima do Ministério da Justiça.
Medo de trocas
A declaração do então ministro da Justiça, Eugênio Aragão, de que afastaria os
policiais federais responsáveis pelas investigações da operação “lava jato” se
houvesse qualquer indício de vazamento ilegal de informações foi discutida
pelos procuradores em 19 de março de 2016. Para tentar evitar a medida,
Dallagnol sugere agir judicialmente.
"Caros, o MJ vai mudar a equipe da PF, mais cedo ou
mais tarde. Sugiro minutarmos uma medida judicial para manter a equipe. Podemos
distribuir para o Moro, dentro do poder geral de cautela, e na manga fica a
possibilidade de oferecê-la na área cível também. Quem pode minutar isso
ASAP?".
Na conversa, Júlio Noronha, citando "aquela história do
telefone do CONJUR" compartilha nota do colunista Lauro
Jardim, do jornal O Globo, afirmando que o telefone da empresa de
eventos de Lula estava em nome de Roberto Teixeira, seu advogado.
A ConJurrevelou que Sergio Moro não quebrou o sigilo
telefônico apenas de Roberto Teixeira, mas também do
telefone central da sede do escritório dele, o Teixeira, Martinse
Advogados, que fica em São Paulo. Com isso, conversas de todos os 25
advogados da banca com pelo menos 300 clientes foram grampeadas, além de
telefonemas de empregados e estagiários da banca.
A inviolabilidade da comunicação entre advogado e cliente
está prevista no artigo 7º do Estatuto da Advocacia (Lei
8.906/1994). Segundo a norma, é um direito do advogado “a inviolabilidade
de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de
trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática,
desde que relativas ao exercício da advocacia”.
Em ofício ao STF, Moro afirmou que só soube do grampo no escritório após
notícia daConJur. Após ser repreendido pelo ministro Teori Zavascki, o então juiz
prometeu destruir os áudios. Só que isso não foi feito na época, disse a sócia da banca Valeska Teixeira Zanin Martins.
“Fomos surpreendidos por uma decisão em que Moro
disponibilizou todos os mais de 400 áudios nossos que foram gravados. Chegando
lá, havia um ‘organograma da defesa’, desenhando a estratégia dos advogados do
Lula. Ele foi baseado em conversas dos integrantes do escritório com outros
advogados, como o Nilo Batista. Não há nenhum precedente de uma atitude tão
violenta, tão antidemocrática como essa em países democráticos”, contou a defensora de Lula, lembrando que as gravações só foram destruídas há pouco.
Rcl 43.007
*Texto alterado às 18h50 e às 20h39 do dia 1/2/2021 para
acréscimo de informações.